terça-feira, 3 de março de 2015

Crítica: "MAIS UM ANO" (2010) - ★★★★★


O que acontece em torno de 365 dias? O que muda e o que continua? O que surge e o que se vai? Basicamente, um dos últimos filmes de Leigh, sucedido atualmente por Mr. Turner, analisa a vida de um casal em torno de todo um ano. Isso inclui suas relações familiares, amigas e próximas. O conflito dos acontecimentos, as descobertas, as inovações. Não há moral em Mais um Ano. Vale lembrar que é um filme de observação, envolvendo lentas passagens do cotidiano. Resumindo, Mais um Ano repete o estilo de seu anterior, Simplesmente Feliz, só que de uma forma bem mais reflexiva e bem menos rebelde. 

Em vez de Poppy, temos o casal Tom e Gerry. Tom é um conceituado geólogo e Gerry uma metódica psicóloga. Um pouco contrário da extrovertida e alegre protagonista da comédia de 2008, o casal leva uma vida melancólica, estável, tranquila, que acompanha o diário das pessoas do convívio, entre elas, o filho e sua namorada num relacionamento perfeito, uma desesperada e divorciada secretária na meia-idade a busca de um "novo amor"; um velho bêbado inconveniente que não suporta as lembranças de um tortuoso passado; um viúvo culpado pela morte da esposa e a teimosia do filho único. De portas abertas para o que dar e vier, sr. e sra. Hepple, num período de quatro estações, se oferecem a orientar essas pobres almas, cujas vidas entram num embate calculadamente eufórico.

Tratando do elenco formidável que participa do filme, é necessário destacar a performance de Lesley Manville, uma velha conhecida dos filmes de Leigh, da minha parte mais precisamente por Agora ou Nunca, Topsy-Turvy e Segredos e Mentiras. A atuação em foco é profunda, sobretudo as qualidades que a atriz exige para o papel. Não entendo como o elenco de Mike Leigh consegue ser desse jeito: amargo, mas ao mesmo tempo, exigente. Imelda Staunton, Sally Hawkins, Timothy Spall, Brenda Blethyn, Jim Broadbent, Dorothy Atkinson, Ruth Sheen, Peter Wight... Todos conseguem seguir esse padrão caracterial dos filmes do britânico, o que recentemente a cada filme de sua autoria me surpreende intensamente. Broadbent e Sheen, plausíveis como o casal Hepple. Apesar de Imelda Staunton roubar a cena nos minutos iniciais da película, quem ficou com destaque foi mesmo Manville, desta vez. Desoladora e rígida, mas sem perder o controle nem exagerar. Enquanto sua personagem vê-se perdida na ilusão de uma vida maravilhosa, a atriz consiste em abraçar o anti-sentimentalismo, o que é um desafio pleno. 

A direção de Leigh é suprema, tão como o roteiro assinado por ele. O elenco, já dito, numa das mais marcantes participações na carreira cinematográfica dele. Não é surpresa que essa obra tenha se transformado tão preciosamente num dos retratos mais belos feitos por Mike Leigh. Tanta repercussão por parte da distribuição do filme no Brasil, que só chegou aos cinemas, pelo menos em São Paulo ano passado, e olhe lá (sessões selecionadas), agora é bem compreensível. Enquanto isso, Mr. Turner continua sem data pra estrear. 

Quando nisso é impossível discordar de um filme que procura recordar através do concreto. O objetivo é mover o espectador com episódios comuns da vida, propícios a qualquer um, passados por quatro estações anuais. Mais um Ano é uma história convencional e surpreendentemente universal, que quase impossível não impacta o público. Um filme que celebra a sutileza e os encantos do universo que nos rodeia. 

Mais um Ano (Another Year)
dir. Mike Leigh - ★★★★

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