sábado, 26 de outubro de 2019

OLHOS QUE CONDENAM (2019)


Intenso, revoltante, instigante, esta é "Olhos Que Condenam", a grata produção da Netflix que é uma das melhores coisas que alguém vai poder encontrar no catálogo esse ano.

É a confirmação definitiva de Ava DuVernay como diretora de grandes trunfos, tanto com um cinema ativista, que se dedica a todo instante a narrar as injustiças que o sistema comete contra o povo negro, e imprimindo na tela toda a revolta e os sentimentos de raiva e indignação que permeiam a condição do afro-americano na sociedade dos EUA: a hierarquia racista e xenófoba de uma nação com um passado escravocrata e um presente "branco", quanto na mise-en-scène, que a cineasta soube trabalhar seu material com tamanha habilidade e precisão.

É de certa forma uma sequência ao 13ª EMENDA, que falava sobre o encarceramento da população negra, e como o sistema penitenciário guarda a infeliz herança da escravidão (e da segregação), manifestada em outros moldes nos dias de hoje: a marginalização, a criminalidade, a negação às oportunidades e a prisão. Talvez seja muito simples apenas pontuar isso, mas é algo muito mais complexo, que está enraizado na construção da nação americana.

"Olhos que Condenam" me deixou vidrado... acho que há muito tempo eu não via uma minissérie que me deixasse tão atento assim. E ao mesmo tempo me vi ali junto com os personagens, acompanhando o drama da condenação injusta. A injustiça é sem tamanho e a indignação é recorrente, também há uma necessidade de mostrar o que acontece no interior com esses rapazes, expostos à injustiça e forçados e lidar com o encarceiramento tão novos, como isso se torna um divisor de águas na inocência de adolescentes despreocupados que se tornam criminosos convictos e ganham a atenção da mídia graças a um processo fraudulento, apressado e forjado pela polícia.

O tom de denúncia é latente, e há plena consciência do quanto é forte do que a minissérie se trata, e da importância que ela tem, seja ao trazer para a tela uma história que traz cinco rapazes que são, eles próprios, as provas vivas da injustiça, do racismo e das falhas de um sistema desumano e despreocupado com a real justiça, tanto quanto para configurar uma forte crítica ao governo de Trump, que inclusive é mencionado como tendo proposto à época que os cinco garotos fossem sentenciados à pena de morte por um crime que não cometeram.

Make America White Again? A "América branca" foi construída debaixo do genocídio de indígenas, da escravidão de negros e da violência de conflitos sangrentos. Pra mim essa minissérie também é, essencialmente, um retrato de como a América é colorida por essa violência, na sua história e na cultura do racismo e do preconceito. A violência está fortemente presente porque a opressão das autoridades é a principal marca do sistema ianque. DuVernay traz para este trabalho a tristeza e a indignação, e de alguma maneira o descontentamento com a vileza de um governo que parece assentir com as injustiças que acontecem no país. Há uma urgência, e "Olhos que Condenam" incorpora bem o sentimento do qual a população negra está impregnada: justiça.

Com um elenco admirável, um grupo de atores que estão excelentes e merecedores de reconhecimento, "Olhos que Condenam" merece destaque. E Ava DuVernay merece ser celebrada como uma das melhores cineastas em atividade hoje nos EUA. Essa minissérie é imperdível.

Olhos que Condenam
When They See Us
dir. Ava DuVernay
★★★½