terça-feira, 30 de junho de 2015

Crítica: "O TEOREMA ZERO" (2013) - ★★★


Estava com uma cópia em vídeo de O Teorema Zero desde o ano passado, em outubro, creio. Ontem à noite, descobri o empoeirado filme enquanto arrumava uns "bagulhos", e fiquei curioso. Decidi vê-lo. Acabei de entrar de férias, por isso, tento ao máximo aproveitar o tempo de um mês e um dia que me foram concedidos de descanso para ver alguns bons filmes. Fui dormir ontem bem tarde vendo este longa de Terry Gilliam, cujo longa O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus me agradou demais. No fundo, mesmo o estilo de Gilliam parecer terrivelmente confuso e inteiramente complexo, tenho facilidade para apreciar os filmes dirigidos por ele. 

O Teorema Zero não me agradou tanto, porém não me deixou cansado em momento algum. Uma da madrugada e lá eu estava, vidrado assistindo ao longa. Caso fosse um lixo, não tenho dúvidas de que uma hora ou outra a soneca bateria. E o bom é que não bateu. Sinal de que, talvez, é um filme poderoso, mas que não escapa de alguns pequenos momentos de incompreensão que podem sim irritar o espectador. O Teorema Zero narra as aventuras de um hacker computacional chamado Qohen Leth, nome que usualmente é confundido com Quinn por seu parceiro de trabalho. Qohen é antissocial, introvertido e extremamente peculiar. Após pedir licença médica de seu trabalho por questões pessoais, ele é encaminhado para consultas psicológicas com uma médica virtual, e, trabalhando de casa, ele é responsabilizado por cuidar e desvendar o Teorema Zero, uma fórmula aparentemente indecifrável que intercepta o sentido da existência. Enquanto isso, Qohen espera atentamente por um telefonema misterioso que poderá lhe dar o real sentido de sua vida, cujo ele recebeu apenas uma vez e acabou descartando.

O Teorema Zero lembra em alguns aspectos a maior obra de Gilliam, Brazil - O Filme, que era virtuosamente brilhante. No entanto, falta muita coisa em O Teorema Zero para que o longa possa ser qualificado tão bom quanto a maior obra de Terry. O Teorema Zero é um filme mais confuso, perigoso, inquieto, e talvez um pouco exagerado. A fotografia de Nicola Pecorini, em tons arrebatadores e berrantes cheios de cores que fazem os olhos arderem, talvez possa ter expressado bem a intenção do filme de exibir o quanto a tecnologia está conectada à nossa vida, só que ainda sim não escapou do exagero. Os cenários foram reproduzidos com beleza e técnica incrível para um filme independente, mesmo assim, também no final ficou ficou um tanto quanto exagerado.

O roteiro de Pat Rushin até que é bom, mesmo que seja lá confuso por envolver tanta matemática e tantas outras emoções num só lugar. Gostei da invenção "Teorema Zero", que é resolvido explicando que a vida e o universo não possuem algum sentido, e que terminam sem nenhuma explicação, apenas resultando num vazio imenso, que meio que combina com a minha visão filosófica do sentido da vida, cuja é que a mesma termina sem nenhum significado aparente, numa eterna escuridão preenchida por um vazio insustentável, ou seja: não há céu, não há inferno, não há salvação, não há vida pós-morte, não há absolutamente nada. A vida termina por si inexplicável.

Gostei muito das atuações deste estranho e incrivelmente inusual filme. Christoph Waltz, no papel atípico de Qohen Leth, mostra-se bem trabalhado e articulado com seu personagem careca. Matt Damon é totalmente irreconhecível no papel do Gerente (algo que certamente prova o talento de camaleão do velho Matt). Tilda Swinton, quem eu esperava ver mais aqui, apereceu em pouquíssimas cenas como a psicóloga virtual de Leth Shrink-ROM. Mélanie Thierry, de quem eu nunca tinha ouvido falar, aparece com brilho nos olhos e um rostinho belo no papel de uma prostituta virtual chamada Bainsley, quem Leth conhece numa festa. Creio que Thierry ainda poderá nos mostrar algo maior do que este personagem feito em O Teorema Zero. Desperdiçar o talento da moça seria um erro fatal.

No fim, podemos tomar deste filme-labirinto duas distintas interpretações: a primeira e a de que o filme trata-se de uma metáfora cheia de simbolismos que resulta na conclusão de que a sociedade atual é guiada pelo virtualismo compulsivamente, e que a nossa vida está sendo privada aos poucos pela imensidão e ao mesmo tempo isolação da tecnologia; e a segunda é a de que, ao mesmo tempo em que serve de crítica futurista para a evolução e a popularidade desenfreada da tecnologia, também pode ser visto como uma crítica religiosa escondida, já que Leth, que mora em uma igreja abandonada, vive acreditando que um dia terá um telefonema que poderá lhe dar o sentido da vida, no entanto, no final, ele descobre que tal telefone foi invenção de seu Gerente para levá-lo à bordo do indecifrável Teorema Zero (ou seja, o telefonema significa a religião, e que seus membros passam uma boa parte de suas vidas acreditando em suas salvações e as respostas para as suas dúvidas na religião, mas no fim da vida, acabam por morrer sem saber que tal religião não existia - o que é algo bem ateu da parte do roteiro, mas enfim, é uma hipótese lógica). Como o personagem de Christoph vive falando tudo na 1ª pessoa do singular (nós), talvez ele queira significar que, com as declarações feitas naquela pessoa, ele significasse mesmo um tanto de gente: membros da religião. Existe uma terceira, que eu mesmo já antecipei, que baseia-se na qual o filme serve ambiguamente como crítica religiosa e crítica social para a privação humana através da rede virtual (a internet).

O Teorema Zero (The Zero Theorem)
dir. Terry Gilliam - 

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Crítica: "MAD MAX" (1979) - ★★★★★


Como negar a euforia e a extensa qualidade de Mad Max? Como dizer não à sequências de ação tão bem-feitas e esplendidamente produzidas com um esforço astronômico? Dizer apenas que Mad Max é um clássico não basta. Tem que enfatizar que, na época de sua realização, foi uma obra extremamente revolucionária em todos os sentidos, tendo sim estado à frente do seu tempo não só na história mas também na extraordinária concepção. E ainda por cima foi feito com inacreditáveis 400 mil dólares australianos (isso contando com o cachê-extra do diretor George Miller)! 

Talvez hoje, Mad Max não seja tão fantástico assim no que se diz respeito à efeitos de ação e tudo mais, já que nossa visão ultimamente foi preenchida por sequências bem mais calorosas e triunfais no sentido adrenalina do que as vistas aqui (um bom exemplo a ser usado é o novo e espetacular longa da franquia, Mad Max - Estrada da Fúria). Mas é preciso pensar naquela época e nas condições nas quais a história foi filmada, o que automaticamente faz com que Mad Max seja uma das obras mais incríveis do gênero e com certeza uma das maiores também já lançadas.

Se observados os detalhes, é possível notar algumas falhas na filmagem do longa, devido aos baixíssimos custos no qual a obra foi submetida. No entanto, tais baixos custos, de um preço inimaginavelmente menor para a ampla experiência oferecida pelas cenas de explosões e batidas de carro do longa, foram extremamente bem utilizados com muita economia por Miller, pelo visto. Não é à toa que parece que cinquenta milhões de dólares foram colocados dentro de cada cena. Pra você ver o tamanho da genialidade e da criatividade do pessoal que constituiu a produção deste inevitável clássico, incluindo (e encabeçando a lista, lógico) George Miller, diretor e roteirista em seu longa de estreia, que, no futuro, viria a dirigir películas maiores como O Óleo de Lorenzo, As Bruxas de Eastwick, Happy Feet, além da importante colaboração no roteiro e na produção de Babe - O Porquinho Atrapalhado, e também da direção e do roteiro dos outros três filmes da franquia, que, com o passar do tempo, se aprimoraram nos quesitos de produção e orçamento.

A história por muitos é conhecida: em um futuro próximo, a população é colocada em risco com a falta de segurança causada por arruaceiros da estrada que roubam, estupram e cometem outros tipos de crime. Um policial, Max, tem sua patrulha destruída e sua família assassinada e, em busca de vingança contra todos àqueles próximos, ele planeja um ataque que corromperá a criminalidade e destruirá o mal que tanto o causou desconforto e perturbação. 

O ainda desconhecido Mel Gibson atua neste e nos outros dois longas sucessores da franquia na pele de Max, o policial vingativo e psicoticamente agressivo. Dizem que o próprio Gibson, aos 23 anos naquela época, apenas foi selecionado pelo agente do elenco por que tinha se envolvido em uma briga de bar antes do teste e os hematomas em seu rosto acabaram por surpreender o agente do elenco, que decidiu escalá-lo.

A sensação mais comum enquanto eu assistia este furioso longa era constantemente pânico. Talvez nostalgia também, mais causada pela icônica e inquietante trilha sonora do australiano Brian May, cujas notas excepcionais e embaralhadas me fizeram sutilmente recordar de algumas outras trilhas antigas, não do mesmo gênero, mas incrivelmente semelhantes devido ao uso instrumental e tudo mais. Acredito que pânico por que a injustiça também era muito grande. Este primeiro filme da franquia ainda não tinha dimensionado ao todo a distopia que nos acometeria tão intensamente quanto os outros filmes seguintes (em essencial o quarto, de tirar o fôlego), mas é algo muito comparável ao que acontece à nós hoje em dia. A paz não se encontra presente. Sempre estamos desconcertados com a violência e a atipicidade, por vezes até bizarra, dos crimes cometidos ao nosso redor. Pânico mesmo. Total. E o pior é que essa sede por vingança, característica de Max, já é algo do instinto, mas que, com o rápido passar do tempo, vai se tornando cada vez mais usual e comum para nós, a ponto de ter como objetivo não só a agressão e a opressão, mas também a satisfação e o equilíbrio, de forma totalmente reversa e instável.

Não sei como Mad Max surpreende mais: pelas suas cenas impactantes recheadas com explosões e imagens aterrorizadoras de um mundo destruído pelo caos, pela visão previsível da dimensão da violência no futuro, ou pela excelência épica de sua história inovadora e obscura. Só mesmo posso dizer que Mad Max é uma obra sensacionalmente importante, impetuosa e potencialmente cativante.

Mad Max
dir. George Miller - 

domingo, 28 de junho de 2015

Crítica: "MANDERLAY" (2005) - ★★★★


Quem vê Manderlay logo acha que Lars Von Trier é fascista, sem mesmo antes refletir sobre o que foi colocado em pauta pelo diretor nesse drama acirrado. Segmento de Dogville, Manderlay, projeto que encerrou prematuramente a trilogia de Von Trier "E.U.A. - Terra das Oportunidades", que havia iniciado com o já mencionado longa de 2003, é um dos filmes mais provocadores, desconfortáveis e perturbadores desse polêmico cineasta dinamarquês, chegando a ter me deixado bem mais desconfortável do que seu comentado filme Anticristo, embora também seja uma de suas obras mais inteligentes, maturas e profundamente sensíveis. O caso é que tal desconforto é bem proporcional da parte de Lars Von Trier, algo que já é notório desde Dogville, mas que aqui se apresenta com mais força, talvez intensidade, justo por ter colocado em discussão um assunto tão marcante, importante e polêmico como o racismo de uma maneira tão ousada da parte do diretor.

Depois dos eventos ocorridos em Dogville, Grace (interpretada aqui talentosamente por Bryce Dallas Howard) e seu pai, aqui feito por Willem Dafoe, vão parar numa fazenda no meio do nada no Alabama, chamada Manderlay, cuja ainda funciona o regime escravista, depois de quase setenta anos do fim do mesmo. Com a morte da mestra da fazenda, interpretada por Lauren Bacall, Grace e sua humanidade quase surreal decide agir e impor liberdade aos negros ali mantidos. Após algum tempo, Grace decide passar um tempo em Manderlay, e, em sua estadia, acaba se acostumando servindo e trabalhando na fazenda, enquanto tenta solucionar os muitos problemas que surgem lá, da forma na qual os leva à uma desgastante decadência moral.

Já não é tão desconhecido a característica principal do estilo notório cinematográfico de Lars Von Trier, que busca explorar de forma dolorosa e dramática o sofrimento feminino. Aqui, não é diferente. Algo que até deixa o desenvolvimento da narração mais profunda, pesada. E esse sentimento constante de culpa e angústia gerados pela história e pela posição com a qual a personagem principal Grace é imposta ao longo da jornada até que nos deixa de certo modo um tanto quanto fascinados, assustados e desconfortáveis, como disse. 

Mas o que me deixa mais estabilizado e emocionado em relação à Manderlay é a precisão e a delicadeza com a qual Von Trier, de quem sou um grande fã, cuida dos detalhes narrativos e dos elementos, além da condução tocante do roteiro. Quem diz que Manderlay é teatro filmado engana-se, parcialmente. É bem notável que, assim como Dogville, Manderlay possui um set único, no qual os cenários estão divididos, separados por linhas brancas e, desta vez, grades, como é o caso dos portões da assombrada fazenda Manderlay, onde paira a imensa obscuridade da fraqueza e da insensibilidade humana. Mesmo que tudo indique que Manderlay é basicamente um teatro filmado, pode-se notar que a edição (propositalmente) picotada de Molly Marlene Stensgard separa desfuncionalmente os takes e as cenas justamente na função de deixar bem avisado: "isto não é um teatro!", embora exista, como eu disse "parcialmente", uma certa acomodação teatral nesses dois singulares filmes, e na maioria das obras de Lars, se visto de perto.

A experiência de ver Manderlay, que no fim até me agradou, me deixou muito pensativo quanto à questão do racismo e da escravidão. Mesmo que as intenções de Von Trier neste longa tenham à seu modo certo propósito "comunista" (risos), não deixa de ser um deleite ver a visão deste dinamarquês que "tem medo de tudo na vida, exceto filmar" sobre um dos assuntos que mais tem gerado tabu nos últimos tempos, além de ser um dos mais frequentes, já que tocamos no tema. Contrariando o propósito de que a América é a "terra dos sonhos" através de um conto que analisa a influência escravista atual na socialização e na convivência de brancos e negros na atualidade. Em Dogville, a mensagem explicitada por Lars era a da expansividade da violência no território, algo que aqui tem certa participação, mas em menor síntese. Vale também explicar que Manderlay é um filme cujos fortes centram-se em seu poderoso elenco (não temos Kidman nem Caan aqui fazendo os papéis de Grace e seu pai, mas sim os igualmente dadivosos Bryce Dallas e Willem Dafoe, acompanhados de Danny Glover, Jean Marc-Barr, Isaach de Bankolé, Mona Hammond, John Hurt (o narrador), entre outros, tal como a gloriosa Lauren Bacall) e no roteiro excêntrico e sempre brilhante de Lars, que, a todo projeto, nos promete e cumpre em intuitos de oferecer à comunidade cinematográfica obras de qualidade, como Manderlay, que completa dez anos. 

Manderlay
dir. Lars Von Trier - ★★★★

sábado, 27 de junho de 2015

Crítica: "DIVERTIDA MENTE" (2015) - ★★★★★


De uns dias pra cá desde a quinta-feira retrasada, 18 de junho, estreia deste longa imperdível, vi muita gente acusando injustamente a animação de "ruim" justamente pela falta de adequação da história para as crianças. Algo que me deixou muito desapontado, já que esse longa é uma das animações mais incríveis que eu já vi em toda a minha vida. E acredito que não estou sendo exagerado não, pois muita gente, ao contrário dos ignorantes que seguem a tradição que nunca existiu de que desenhos são só para crianças, vem achando Divertida Mente uma obra sensacionalmente singular, assim como eu a achei no fim da projeção. Por isso, deixo aqui um claro aviso: apesar das cores, dos personagens fofos e chamativos e de toda a atração que poderá comover a criançada bem antes delas assistirem o filme indicar, primeiramente, que este é um longa infantil, tal predição é totalmente errônea. Quem terá a chance de desfrutar mais da fabulosa experiência apresentada por essa animação serão os adultos, e também o pessoal da juventude, devido à alguns fatores que causam demasiada influência, cujos serão vistos daqui a pouquinho aqui.

A última vez que, sinceramente, uma animação da produtora Pixar me surpreendeu de verdade foi lá em 2009: Up - Altas Aventuras, dirigida pelo mesmo deste longa, o genial Pete Docter, que, além de ter mostrado grande talento e jeito pra coisa na animação vencedora do Oscar já citada, também tinha encantado meio-mundo no sucessivo Monstros S.A., longa que o lançou no mundo cinematográfico. Toy Story 3 me emocionou bastante e me deixou muito comovido, embora eu tenha tido mais apreciação por Up, que também chegou a me emocionar muito mais do que o terceiro filme da reconhecida franquia Toy Story. Mais uma vez, como lá em 2009, o talentoso Pete nos apresenta um trabalho de glória e imperdível, cujo apenas nos cabe agradecer e aplaudir incansavelmente.

Divertida Mente é capaz de nos deixar colossalmente sensíveis e pensativos. A trama exibe a jornada de uma menina de onze anos, chamada Riley, caminhando rapidamente rumo à adolescência enquanto se muda com a família para São Francisco. A mudança começa a ter profundo efeito na garota, que logo mostra-se insatisfeita com a transformação e passa a agir de maneira desnatural (como toda criança, obviamente, agiria), ignorando os pais, os amigos e tudo à sua frente. Enquanto isso, na cabeça da menina, suas personalidades, Alegria e Tristeza, que comandam as emoções da garota direto de sua mente ao lado da Nojinho, da Raiva e do Medo, acabam se perdendo devido à uma enorme confusão que as leva para um outro local da mente de Riley, nas ilhas e nas memórias. Enquanto tentam sair de lá, Riley passa por maus bocados no mundo real, e, em sua mente, o controle é assumido por um trio um tanto descontrolado e "difícil": a insistente Nojinho, o preocupado Medo e o inquieto Raiva.

Melhor trabalho da Pixar em anos, talvez bem desde Toy Story 3, Divertida Mente é um show delicioso que combina com excelência beleza e maturidade. Digo maturidade no sentido de que a história aqui nos contada, mesmo apresentando detalhes parcialmente infantis, nos trouxe uma mensagem bem mais forte, poderosa e importante por trás da apresentação. Talvez essa seja a primeira grande obra da Pixar que nos traga algo inovador na questão da reflexão e da mensagem. Anteriormente, os filmes da produtora bilionária da Disney traziam consigo histórias belíssimas, com mensagens que, na boa maioria das vezes, nos traziam algo valioso - isso, sempre - só que agora, em Divertida Mente, a mensagem vem propositalmente recheada com um conteúdo mais sério que, logicamente, crianças mais pequenas e inexperientes não terão a chance de se conectar, mas certamente os adolescentes e os adultos poderão. 

Universidade Monstros, o último filme deles, lançado em 2013, abordava algo que também não estava dirigido ao público infantil. Valente, que eu gostei, mas que não é certamente o melhor projeto da produtora, tinha em sua estrutura algo de infantil, mesmo que tivesse trago consigo uma aptidão épica e musical que oferecia certo interesse nas crianças. Carros 2, a sequência ultrajante de Carros, poderia ter sido melhor feita e produzida. No entanto, difícil é discordar do fato invencível de que Divertida Mente é um dos filmes mais criativos já lançados pela Pixar. Simplesmente assim. A qualidade do roteiro escrito por Pete Docter, Meg LeFauve e Josh Cooley é inteiramente perfeito, o melhor já apresentado desde, confesso, o brilhante WALL-E, que ganhou minha aprovação principalmente por ter mostrado um conteúdo original e esteticamente maravilhoso e imaginativo, que me cativou e emocionou até o fim, algo que poderia ter tido mais recursos em Up, que apresentou um roteiro bem excêntrico, mas que apelou para o sentimentalismo, ainda que extraordinariamente com triunfo.

E, confesso que Divertida Mente é um filme que usualmente, durante a narração e o desenvolvimento da história, lembra a primeira concepção de A Viagem de Chihiro, brilhante obra-prima do japonês Hayao Miyazaki e meu filme de animação favorito. Docter listou a animação de 2001 como seu filme predileto. Não estou totalmente correto, apesar de fortemente acreditar que a jornada de Chihiro, que inicialmente estava toda zangada e triste por ter se mudado de seu aconchegante lar e sua escola para uma cidadezinha escondida no meio do nada, inspirou aqui a história de Riley criada por Docter em companhia do iniciante Ronnie Del Carmen, que se mudou de Minnesota para São Francisco por questões de trabalho de seu pai, tendo sido forçada a abandonar seus colegas e um time de hóquei, seu esporte predileto, algo que causa à Riley profunda irritação, a ponto da garota deixar de gostar do esporte por algum tempo em sua estadia na cidade californiana. No entanto, outro importante ponto do filme é deixar esclarecido que essa mudança tem profunda relação com a transformação de Riley de uma garotinha em uma adolescente, a partir de quando a Alegria (lá vem spoiler, se quiser pulá-lo é só ir para o próximo parágrafo) abandona em sua jornada de volta à "torre de comando" o amigo imaginário da Riley, quem ela, nessa fase de "amadurecimento", esqueceu. 

E não é tão difícil se identificar com a Riley. Divertida Mente me fez refletir sobre minhas atitudes e seus efeitos em minha natureza, além das vezes em que eu mesmo me encontrei à beira do desastre em minhas tresloucadas crises de identidade e ondas de negatividade, apesar de que eu mesmo não seja nem um pouco semelhante à personagem em questão, já que minha personalidade encontra-se num nível bem mais problemático do que a da garotinha (risos). E é por isso que o filme nos causa demasiada nostalgia e identificação: não é preciso ser totalmente parecido com a Riley, em questões tanto fisica e mentalmente, para se assemelhar com ela. A situação de mudança/transformação atravessada pela menina se encaixa perfeitamente com momentos usuais de nossa vida nos quais tivemos nossa identidade colocada em prova. 

Um dos principais medos desde quando foi anunciado o projeto era de que ele fosse muito "exagerado", "insensato", "imperceptível" e até mesmo "irreal", adjetivos e características que de jeito algum possam se adequar em alguma parte desta linda película, à exceção do último, porém no bom sentido, é lógico. Dotado de uma sensibilidade exímia, intensa inteligência e uma calorosa mensagem que nos deixa ao mesmo tempo deprimidos, nostálgicos e emocionados (risos), Divertida Mente é um longa que por si só é belamente inspirador e maravilhoso em todos os ângulos. Candidato ao top 5 dos melhores filmes já feitos pela Pixar, cujas obras sempre me causam encantamento e deleite, o filme é deliciosamente divertido e recomendável, além de ter conquistado uma extrema beleza técnica, que não nos é estranha vindas de uma equipe da Pixar (isso inclui a trilha sonora desnorteante do vencedor do Oscar Michael Giacchino, aqui mais uma vez imbatível).

Divertida Mente (Inside Out)
dir. Pete Docter - 

sexta-feira, 26 de junho de 2015

Crítica: "O EXÓTICO HOTEL MARIGOLD 2" (2015) - ★★★


Há uma coisa que me deixa muito aborrecido neste segundo filme, que me acompanha desde o primeiro. Desde o começo, senti a imensa falta de um elenco de proporções intencionalmente gigantes. Sei que bons atores passaram por ele, é um fato inerrável: Maggie Smith, Judi Dench, (o excelente) Dev Patel, Tom Wilkinson (estrela o primeiro), Richard Gere (estrela o segundo), Bill Nighy, Penelope Wilton, Richard Pickup... O elenco, mesmo que cheio dessas estrelas, está incompleto. E esse é um filme, ou melhor, era um filme, franquia, enfim, que podia dar um show no quesito elenco colocando nele atores feras da terceira idade. E deu sim, só que não foi por completo. Se eu fosse John Madden, no elenco, além desse grupo de atores idosos brilhantes, colocaria Meryl Streep, Dianne Wiest, Whoopi Goldberg, Jack Nicholson, Kevin Kline, Sean Connery, Michael Caine... Isso só pra citar exemplos. Eu criaria personagens, mais tramas do que as já presentes, pois este é um filme que por si só narrando tramas é uma obra maravilhosa, e não deixa o público aborrecido, afinal, são duas horas, dá pra fazer muita coisa. Mas faltou. Faltou abusar nesse elenco. Nada contra este aqui, só que acredito que se poderia ter ido mais longe com ele, ter colocado mais gente.

Quanto à este, como disse, nada a reclamar. Antigos e ainda sim bons atores, como sempre, dotados de uma competência extraordinária. A prova mais eficiente de que o talento, mesmo com o inevitável passar do tempo, não enferruja. A maioria desse brilhante grupo, britânico. Judi, Maggie (ela em Downton Abbey é simplesmente sensacional), Dev (que já tinha mostrado ao mundo sua exímia qualidade artística na grande obra Quem Quer Ser um Milionário?), que não é britânico mas, enfim, entrou muito bem no embalo, Bill, Penelope e todos os outros. A grande surpresa do longa foi a aparição de Richard Gere, no papel de Guy Chambers. Uma surpresa entre aspas, já que a atuação do ator foi bem meia-boca. Mas foi divertido ver o velho Gere, que ainda sim era o mais em forma dentre os idosos do elenco, fazendo esse personagem. 

O Exótico Hotel Marigold 2 é um filme bom, sensato, cheio de bons momentos e inteiramente criativo e engraçado, que não o distancia tanto do primeiro longa, o sucessivo O Exótico Hotel Marigold, lançado em 2012, em relação à qualidade. Ambos são filmes maravilhosos. E, ainda sim que incompleto, afirmo, o elenco é o melhor deste longa. A ideia de filmar o encontro de lendas da interpretação num filme que os reúne em um hotel que aparenta ser um asilo mas que, com alguns acontecimentos, se revela atipicamente contrário à tal semelhança. Muito bom. No entanto, não sei se devo perdoar John Madden, que já assumiu a direção de fracassos horrendos. Acredito que, se questionado sobre seu melhor filme, já diria: Sua Majestade, Mrs. Brown, que deu a primeira indicação ao Oscar de uma de nossas mais preciosas damas: Judi Dench. Caso fosse interrogado: "Você se esqueceu de Shakespeare Apaixonado?", responderia: "Olha, meu amigo. Acho que seria bem melhor terem dado o Oscar de Melhor Filme a Mrs. Brown do que a Shakespeare Apaixonado. Gostei muito de Mrs. Brown. Quanto ao longa vencedor do maior prêmio do cinema, não sei se posso dizer o mesmo. Só sei que não detestei, mas também nem gostei tanto assim". Não achei muita graça de Shakespeare Apaixonado. Tem boas performances, um roteiro engajado, mas no fim é tão ingenuamente fraco. 

O Exótico Hotel Marigold 2 lembra muito Quem Quer Ser um Milionário?, em certos pontos: tem Dev Patel, é narrado na Índia, e é um longa absolutamente feel-good. Mas, confesso que apreciar filmes feel-good não é de jeito algum a minha praça. Só mesmo esses dois longas e alguns outros cujos até posso contar. Se são por demais otimistas, deixam de contar a história e tornam-se ridiculamente chatos. Se são muito emotivos, tendem a enjoar e deixar o espectador enojado de tanta palhaçada. A receita de um bom feel-good é rara e, ainda sim, nos causa um grande conforto. Fico satisfeito em ver essa sequência muito bem-feita daquele belíssimo feel-good de 2012 e que, aqui, repete a mesma fórmula excelentemente. Exoticamente otimista, brilhantemente encenado e outrora delicioso.

O Exótico Hotel Marigold 2 (The Second Best Exotic Marigold Hotel)
dir. John Madden - 

quarta-feira, 24 de junho de 2015

Crítica: "UM POMBO POUSOU NUM GALHO REFLETINDO SOBRE A EXISTÊNCIA" (2014) - ★★★★


Exibido no Festival de Veneza do ano passado, onde conquistou o Leão de Ouro direto das mãos do compositor francês Alexandre Desplat (presidente do júri da edição passada), Um Pombo Pousou Num Galho Refletindo Sobre a Existência despertou minha curiosidade e meu interesse desde que foi anunciada sua vitória no festival italiano. Ainda não vi Vocês, os Vivos, a obra mais famosa do cineasta sueco Roy Andersson, que, na década de 70, dirigiu vários curtas e longas que não chegaram a ter estreia internacional. Só no início dessa década, após ter exibido um trabalho em Cannes, foi que Roy despertou atenção e comoção.

Encerrando a trilogia que começou com esse trabalho lançado em Cannes, em 2000, Um Pombo Pousou num Galho... é um filme incrivelmente memorável. É, com certeza, demasiadamente bizarro, mas não chega a incomodar ou causar exaustão. É um filme, à seu modo, delicadamente divertido e cômico. Nem todos, logicamente, gostarão desse filme: já fica um alerta. Não é uma comédia que o fará se debulhar em lágrimas geradas por inconscientes ataques de risos. É um humor leve, ainda que desconcertante e bem entonado, digamos. Na maioria das vezes, o humor das situações é tão incompreensível que só por conta dessa falta de conexão entre o entendimento e o acontecimento, algumas risadas já são liberadas.  

Não sei se, ao certo, o filme possui uma história, digo, concreta. Ora parece uma série de esquetes humorísticas organizadas por Roy num plano surreal, ora nos parece um filme que apenas narra segmentos irreais do cotidiano humano e da rotina cansativa que nos aprisiona incessantemente. Talvez, tais explicações sejam ambiguamente corretas sobre ele. Bem, tentarei explicar sobre algumas situações apresentadas dentro do longa que mais me parecem, de fato, legíveis. Dois homens trabalham num atípico "ramo do entretenimento": vendem máscaras, dentes de vampiros e sacos de risadas (creio que a parte do entretenimento foi uma crítica da parte de Andersson) com função de "divertir" as pessoas, no entanto, acabam tendo problemas de relacionamento entre eles visto que eles estão procurando um homem que os deve uma porrada de dinheiro, além de alguns distúrbios emocionais que afeta a um dos vendedores e o outro, que, ao não olhar para os lado enquanto atravessava a rua, foi atropelado por um carro.

Outro segmento, um dos inicias, narra "três encontros com a morte" (algo que, primeiramente, nos dá a noção de que será um filme de esquetes, o que, na verdade, é e não é ao mesmo tempo): um homem tem uma parada cardíaca enquanto abria uma taça de vinho; uma senhora que, no leito de morte, agarra uma bolsa cheia de diamantes e dinheiro e os filhos tentam tomar dela (certamente é o segmento mais engraçado) e o outro é em um navio, creio, onde um homem cai morto e, tendo pagado um lanche no restaurante do bordo, cabe à vendedora oferecer gratuitamente aos passageiros a refeição do morto.

Pode parecer tudo muito sem sentido, mas, nessa ausência de sentido, há toda uma complexidade. A repetição de bordões, a fotografia nitidamente bege, os cenários fixos e quase sempre imóveis (para não dizer sempre), o roteiro desorientado nos quesitos linearidade e, o já comentado, sentido. Nada impede Um Pombo Pousou Num Galho... de ser uma obra bem impactante e sensacional, e por outro lado, totalmente absurda e inusitadamente engraçada, embora melancólica certas vezes. O roteiro, de várias formas, tenta relacionar um passado distante a um presente cada vez mais, de fato, presente e atual, misturando temas e capítulos épicos como se tivesse algo a significar por trás de tanta apresentação de elementos. Talvez, essa utilização de elementos surreais e autônomos que nos causam tão impressivamente interesse, desconforto e estranheza seja apenas uma técnica a fim de aproximar o público da própria insensibilidade e estranheza presentes pesarosamente em nosso dia-a-dia. Se o longa é filosófico? Por que não? Como o próprio título nos introduz, e como eu  acredito que não deixa de ser em nenhum ponto mentira, é a tal da reflexão que gira em torno das surreais ações dos personagens.

Um Pombo Pousou num Galho... já vai sair dos cinemas brasileiros, infelizmente, pois, tendo entrado em cartaz no dia 14 do mês passado, já se despede das sessões após ter completado um limitado tempo de exibição de um mês, como se não bastasse o filme já ter sido selecionado para determinadas cidades nacionais. Não percam, àqueles que apreciam filmes de caráter cultural e que aparentam bizarrices de um diário mais ainda bizarro. Inexplicavelmente sensível e tensamente brilhante, Um Pombo Pouso num Galho... merece ser visto, aplaudido e reconhecido. Título alternativo: "Cenas da nossa peculiar realidade em um plano um pouquinho mais exagerado do que o normal, sem deixar de ser absolutamente verdadeiro e caracteristicamente cômico".

Um Pombo Pousou Num Galho Refletindo Sobre a Existência
(En duva satt på en gren och funderade på tillvaron)
dir. Roy Andersson - 

terça-feira, 23 de junho de 2015

Adeus, JAMES HORNER (1953 - 2015)


Se foi ontem, 22 de junho, uma das maiores lendas da música cinematográfica: James Horner. Isso mesmo, o autor de um dos clássicos mais inquestionáveis já feitos, Titanic, cuja tocante trilha sonora é ainda melhor. E não foi só de Titanic cuja trilha sonora Horner marcou uma clássica participação. Outros longas, tais como Avatar, Casa de Areia e Névoa, Coração Valente e Apollo 13 tiveram a igual grande sorte de ter Horner conduzindo suas trilhas. Horner faleceu ontem na queda de um avião em Santa Barbara County, na Califórnia. Seu último trabalho foi o longa O Espetacular Homem-Aranha. Nosso blog agradece à James Horner pelo mágico mundo que suas composições trouxeram, e as inúmeras maravilhas de seu belíssimo talento musical. O cinema chora. Adeus, sr. Horner.

TOP 10 - JAMES HORNER

1. Titanic, de James Cameron
2. O Novo Mundo, de Terrence Malick
3. Coração Valente, de Mel Gibson
4. Uma Mente Brilhante, de Ron Howard
5. Apollo 13 - Do Desastre ao Triunfo, de Ron Howard
6. O Fiel Camareiro, de Peter Yates
7. Avatar, de James Cameron
8. Iris, de Richard Eyre
9. Tróia, de Wolfgang Petersen
10. Casa de Areia e Névoa, de Vadim Perelman

Crítica: "A INCRÍVEL HISTÓRIA DE ADALINE" (2015) - ★★★


Não achei que ia gostar assim de A Incrível História de Adaline. Primeiramente, já pelo trailer e pela sinopse, não fiquei de cara convencido de que era mesmo um bom filme. E o filme é bom. Bem melhor do que eu imaginava, pelo menos. A Incrível História de Adaline é mesmo, além da incrível história cujo título nacional já escancara, uma película incrível, maravilhosa, majestosa. Apesar de ser terrivelmente meloso em determinados e poucos momentos, o longa proporciona romance e drama perfeitamente combinados e equilibrados.

Lee Toland Krieger mostrou em 2012 uma comédia de traços leves, ainda que profundos e extremamente românticos em seu maior filme, Celeste e Jesse Para Sempre. Aqui, ele mostra algo bem mais sério e enfocado do que o longa anterior, apesar de apresentar a mesma porção de romantismo acentuado, de uma maneira bem mais idolatrada e apaixonada. A história narra a peculiar jornada de Adaline, uma jovem moça que, no fim da década de 20, aos 29 anos, sofreu um acidente de carro que mudou sua vida: após perder a vida por pouquíssimo tempo, ela, ao ser atingida por um relâmpago, volta imediatamente ao estado normal, só que com uma coisa a mais: por conta de uma reação, Adaline acaba por descobrir sua imortalidade, e que pelo resto dos seus dias, terá 29 anos. O filme retorna para a atualidade, narrando a vida secreta de Adaline e suas outras personalidades.

É bem interessante esse olhar do filme sobre a vida de Adaline e os acontecimentos ao redor dela desde seu nascimento na virada do ano. Mas falta algo. Acredito que poderia se ter explorado mais. Faltou aventurar o roteiro. Faltou preencher a vida de Adaline com elementos, por exemplo, de seu passado. Realmente, como diz o personagem de Michiel Huisman, nós não conhecemos nada a partir de Adaline a não ser seu segredo bombástico. É algo desapontador nesse longa, uma das muitas poucas coisas.

E eu não imaginei que gostaria tanto do final já óbvio de Adaline. Ficou ótimo. E a surpresa mesmo de ver este longa recai acima de Blake Lively, na primeira grande performance de sua carreira, que já mostrou fracassos suficientes para tirá-la de cotação como A Vida Íntima de Pippa Lee, Selvagens, Atração Perigosa e Quatro Amigas e um Jeans Viajante e sua sequência. No entanto, parece que Lively encontrou finalmente algo de razoável para fazer de seu talento exuberante. E, não sei se foi por causa deste filme, mas a bela Blake até já foi confirmada no próximo longa de Woody Allen, que será lançado ano que vem, onde fará papel de Kat.

Pensei - outra coisa que me desapontou - que o longa retrataria mais afundo o espírito épico da jornada de Adaline, no estilo de realmente retratar mais profundamente as questões que Adaline atravessou quando ainda desenvolvia dúvidas sobre seu não-envelhecimento e sua reparável juventude. Essa questão, lá no fundo, serve como uma boa moral àquelas narcisistas mulheres e meninas da atualidade que sempre buscam ficar tão belas a todo instante no ponto da velhice não estar acessível à seus rostos. Rugas tornam-se seus piores inimigos. A ponto de que? Conquistar homens? Conquistar elogios, enquanto dentro delas mesmas apenas existe um pesaroso vazio? Pra que ser boa por fora e podre por dentro? Às vezes não nos damos conta desses quesitos, mas é até um pouco fundamental refletir sobre eles. Acredito sim que, se as mulheres de hoje em dia aceitassem seus destinos e aprendessem a conviver independentes das opiniões alheias sobre sua aparência exterior, o mundo seria bem melhor em alguns princípios. Beleza é beleza, mas e o conhecimento, que chega a ser mil vezes mais importante do que um rostinho lindo? Devemos, não só mulheres, mas homens também, aprender com Adeline, cuja vida foi devastada para sempre com tal reviravolta. Muitos, talvez, ficariam felizes, até certo ponto. Não falando de beleza, mas sim de longevidade. Seria muito bom se isso acontecesse à mim, a imortalidade. Mas é o ciclo da vida, que de jeito maneira pode ser interrompido. Até mesmo o filme aborda isso.

A Incrível História de Adaline (The Age of Adaline)
dir. Lee Toland Krieger - 

domingo, 21 de junho de 2015

Crítica: "JURASSIC WORLD - O MUNDO DOS DINOSSAUROS" (2015) - ★★★


Desde que Jurassic World - O Mundo dos Dinossauros foi anunciado, e que nele assumiria a direção um jovem diretor chamado Colin Trevorrow, houve muita especulação e polêmica no mundo da sétima arte. Muitos achavam que o filme não seria fiel à clássica versão original de 1993 (o que, em partes, é verdade), e muitos outros acreditavam que o filme seria um total fracasso devido à inexperiência do diretor cujo nome não me era conhecido até o exato momento. Trevorrow dirigiu seu primeiro longa em 2012, Sem Segurança Nenhuma, que estreou em Sundance mas ficou bem por lá. Vê-lo sendo escolhido por Spielberg, que inicialmente tinha desistido de dirigir a produção, para assumir tamanha responsabilidade pode ser um tanto quanto assustador. No entanto, acredito que, com este "inexperiente cineasta", a escolha não poderia ter sido melhor, pois o resultado deste longa é absolutamente incrível.

Jurassic World é uma obra inteiramente surpreendente. Superou todas as minhas negativas expectativas em relação à ele. E o inesperado aconteceu. Nunca pensei - sério! - que diria isso, mas que trabalho fenomenal esse aqui. Encabeça a minha lista dos filmes mais surpreendentes já vistos até o momento, no sentido de que a minha pessoa mantinha sentimentos negativos quanto ao mesmo longa antes de vê-lo. 

Os efeitos visuais não são tão exagerados. Os cenários são muito bem reproduzidos. A fotografia é sutilmente controlada. A qualidade técnica desta obra é indubitavelmente surreal e maravilhosa. Não tem como não gostar de Jurassic World. Nem mesmo, creio, aqueles mais restritos. Muito difícil é resistir à esta obra. 

O que antes era o Jurassic Park agora tornou-se um tecnológico e gigantesco Jurassic World. Um mundo de dinossauros, literalmente. O espaço da ilha foi reaberto ao público e totalmente redimensionado. No entanto, as atrações não estão mais causando surpresa ou emoção aos espectadores, o que faz com que a administração do lugar tome proporções avançadas e de um risco desolador, que, à eles, é totalmente invisível. No intuito de preparar uma nova atração, é criado um novo animal, um dinossauro geneticamente transformado, que passa por fases de teste. No entanto, um desastre acontece. A fera indomada ganha poderes sobrenaturais com a mistura dos genes e uma incalculável inteligência sobre-humana. Entre os poderes desta fera, está o da camuflagem, que faz com que um incidente impertinente ocorra: a fera foge de seu cativeiro, e um estado de alerta faz com que todas as atrações do parque parem de funcionar e um pânico tenebroso se instale. 

O roteiro, que leva a autoria de Colin, Rick Jaffa, Amanda Silver e Derek Connolly, apesar de ser bem-feito, delicadamente inusual, técnico e eficiente, perde-se em certos pontos a fim de deixar o espectador com "nós na cabeça". Há quem se emocione e quem se desaponte com as estruturas apresentadas por esse roteiro tão incomum, ainda mais, quem diria, para um filme deste porte, que geralmente tomam como base sua qualidade técnica em efeitos visuais a fim de conquistar facilmente o público. 

Mas aqui não. Spielberg, como produtor executivo, mesmo não estando no comando, supervisionou muito bem Trevorrow e o guiou bem rigidamente, creio, no fim de evitar tais erros. Mesmo estando tão ausente, a brilhante genialidade de Spielberg reina no espírito estrutivo desta película. E esta é uma das provas mais concretas existentes sobre a competência de Steven. Jurassic World, tanto quanto Jurassic Park - arrisco - é essencialmente mágico e intenso. Muitos momentos lembram Jurassic Park (justamente como as referências, como a cena aonde os meninos, após terem sido quase atacados pela fera, encontram o antigo jipe da abertura do longa de 1993). 

Em tons bem cinza, verde e branco propostos pela fotografia, já perceptíveis no poster, constrói-se um segmento memorável de uma grande obra que transcendeu gerações e deixou muita gente impactada. Nesse quesito, pode-se dizer que Jurassic World - O Mundo dos Dinossauros é excelente. E vale lembrar o quão esse quesito ameaçava o fracasso deste longa, e agora torna-se sua característica mais vibrante. E parece mesmo que esse notável sucesso de Jurassic World foi tão cedo recompensado. Com os 150 milhões de dólares investidos, já na primeira semana gerou 525 milhões de dólares, o maior número de bilheteria já registrado na primeira semana de abertura de um filme em toda a história do cinema! E o filme, nos últimos oito dias desde seu lançamento já é o terceiro filme de maior bilheteria deste ano, está no rumo a um bilhão de dólares de bilheteria, perdendo, neste ano, apenas para Velozes e Furiosos 7 e Vingadores: A Era de Ultron

Jurassic World - O Mundo dos Dinossauros (Jurassic World)
dir. Colin Trevorrow - 

sábado, 20 de junho de 2015

Crítica: "MOULIN ROUGE: AMOR EM VERMELHO" (2001) - ★★★★


Esplêndido! Em comemoração dos 48 anos de uma de minhas atrizes prediletas, a fabulosíssima Nicole Kidman, revejo em alta escala a grande obra do australiano Baz Luhrmann Moulin Rouge: Amor em Vermelho. E percebo, mais uma infalível vez, que não estou errado quanto à minha opinião sobre ele. É certo que este longa possui seus exageros, seus tropeços e bem como erros infames, tal como os luxuosos e coloridos planos nos quais a história foi concebida, mas é impossível não reconhecer o maravilhoso feito dessa indubitavelmente sensacional película.

Moulin Rouge narra a história de um poeta inglês que vai até Paris a contragosto de sua família no fim de entrar para a chamada revolução  boêmia. Nisso, seu destino se cruza com o da suntuosa e linda Satine, cortesã do Moulin Rouge, um cabaré visitadíssimo e aclamado, centro da boêmia e da prostituição. Rapidamente, o escritor fica perdidamente apaixonado pela exuberante e sensual cortesã, que, inicialmente, o "confunde" com o rico duque que irá patrocinar a fundação de um teatro no Moulin Rouge, propositalmente, já que os colegas boêmios de Christian o forçaram a proclamar a Satine uma poesia. E, entre confusões, Satine corresponde livremente à esse amor, e fica perplexamente divida entre seu amado Christian e o insensato duque, que poderá lhe oferecer a tão desejada realização do seu velho sonho de ser uma estrela. 

É interessante, ora desapontador ver como o filme lida com certas questões ao longo do filme. Por uma via, o retrato do romance entre Satine e Christian é totalmente superficial, uma vez que a película limita a história de amor deles através da identidade do musical e da brilhante luxuosidade da produção, o que é certamente belíssimo nos toques autênticos e riquíssimos da fotografia espetacular do australiano Donald M. McAlpine, indicada ao Oscar em 2002, mas que certamente de um lado foi totalmente abusiva e desnecessária em partes, justo quando a história fica parcialmente azeda por conta do excesso de luxo, que nem sempre é tão bom assim. Faltou mostrar mais dentro de tanto excesso. A dúvida de Satine entre o amor de Christian e a boa vida do duque é outro assunto que fica pairando no ar, indefinido, e é algo que poderia calhar muito ao longa. Fora esse problema da superficialidade, pode-se afirmar sem medo que Moulin Rouge é estonteante.

As provocantes coreografias, as canções românticas eletrizantes, os cenários estupendos, os figurinos berrantes e visualmente deslumbrantes. A magia gerada por Moulin Rouge é tão inflável e forte quanto o poderoso absinto, bebida idolatrada pelos membros da boêmia daquela época. É quase impossível não sentir uma especial atração por todo esse clima exótico e, literalmente, vermelho. O elenco é talentoso por si só. Isso destacando a querida Nicole Kidman, a quem dedico totalmente este post e a quem eu de coração agradeço pela inspiração gerada nessa trágica (ops, spoiler!) história. A performance dela é, simplesmente, encantadora! Enquanto é sensualmente feroz e incrivelmente bela ao modo selvagem e boêmio, sua personagem possui uma alma acalentadora e um espírito de esperança e bondade. Um dos melhores papéis já feitos por essa dama elegante e assustadoramente excelente.

Jim Broadbent, Ewan McGregor, Richard Roxburgh, John Leguizamo... Seus números musicais são absolutamente inesquecíveis e absolutamente virtuosos. É necessário elogiar a tamanha dedicação desses atores em suas respectivas interpretações em Moulin Rouge. Faço questão! E, na minha concepção de um musical, além de ter boas canções, boa caracterização e excelente roteiro, ele também deve ter um elenco essencialmente perfeito. E, nas condições do elenco que se encontra em Moulin Rouge, digo: "melhor, impossível!". 

E, no melhor filme de Baz Luhrmann, volto a citar o problema mais frequente desse incorrigível diretor que insiste em cometer o mesmo erro em cada filme no qual assina a direção, e que aqui, também o comete, num efeito bem menos destruidor do que nos outros longas: o luxo demasiadamente excessivo. Chega a ser bizarro ver o quanto os filmes do australiano Luhrmann são todos cheios de detalhes estranhamente luxuosos e desconfortáveis, por sua vez. Não gostei muito de Austrália por conta disso, e muito menos seu último, O Grande Gatsby, que me decepcionou terrivelmente (no caso deste longa, acredito que o luxo apenas foi influenciado pela falta de dedicação, imensa artificialidade e intensiva chatice). 

E, é claro, além de ser um ótimo filme, Moulin Rouge é um romance épico desnorteante. Simplesmente maravilhoso. E belíssimo. O amor de Satine e Christian encantou e encantará mais o espectador. O romance deste longa é imortal. Melhor ainda é essa qualidade de Moulin Rouge em funcionar ambiguamente tanto como musical quanto como um romance, e em certas partes como uma comédia. Vale lembrar que Moulin Rouge também é por si só uma história de amor, superação, vida, sucesso, desejo e relevante astúcia. Não só é brilhante como também é lindíssimo. Moulin Rouge é sensacional, afinal, the greatest thing you'll ever learn, is just to love and be loved in return!

Moulin Rouge: Amor em Vermelho (Moulin Rouge!)
dir. Baz Luhrmann - 

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Crítica: "ENQUANTO SOMOS JOVENS" (2014) - ★★★


Comédia dramática excelentemente atuada e brilhantemente conduzida por um talentoso cineasta, Noah Baumbach, Enquanto Somos Jovens apresenta ao público o melhor e o pior do envelhecimento contando a engraçada e peculiar história de um casal de meia-idade que acaba por simpatizar com um casal de jovens recém-casados. Autor de películas exímias, citando suas duas melhores, entre elas A Lula e a Baleia e o recente Frances Ha, Baumbach mostra que seu forte é o roteiro e nos apresenta um trabalho cheio de altos e baixos, sem deixar de ser pra lá de divertido e incrivelmente delicioso.

Protagonizado por um (raramente) talentoso Ben Stiller e uma excepcional Naomi Watts, ambos fazendo um casal caminhando à beira de uma desastrosa crise por conta da questão da maternidade, o longa consegue fisgar da história um misto atenuante de tensão e ao mesmo tempo romance, que adoça e salpica o clima insensível gerado pelos problemas que acometem o documentarista Josh Schrebnick, e sua esposa Cornelia Schrebnick, filha de um famoso diretor de documentários, Leslie Breitbart. Josh, que vem filmando um novo documentário sem obter muito sucesso, torna-se próximo amigo de um dos seus "alunos", o documentarista amador Jamie Massey, feito por Adam Driver (ando querendo ver o novo filme do ator, Corações Famintos, exibido em Veneza ano passado, onde ele ganhou o Volpi Cup de Melhor Ator, além disso o cara também já foi escalado para o próximo longa do Scorsese, Silence). Jamie convida Schrebnick para co-dirigir seu novo documentário, e ele inicialmente aceita sem saber no quê está se envolvendo e quais são os planos do jovem diretor.

Há quem diga que Enquanto Somos Jovens, no fundo, ressalte um tanto quanto repetitivo e clichê. Mas eu não vejo o longa assim. Vejo que o retrato da velhice que ele faz, mesmo que já nos é tão conhecido, é só uma nova perspectiva. Às vezes, cansa o espectador. Às vezes não. Acho frescura da parte do pessoal que diz que filmes que repetem fórmulas ou temas frequentemente relatados dentro do cima são filmes diretamente ruins. Que coisa. Mania de ficar sempre querendo filmes com novas visões e novas propostas sempre, tudo ao mesmo tempo. E olha que essas coisas demoram. Afinal, o que será do futuro de nosso prestigiado cinema sem novas ideias? Desse jeito, o cinema rapidamente acabará, concordam? Acho até mesmo original da parte de Baumbach reutilizar uma antiga fórmula, só que dentro de uma história diferente. Tá bom, pode ser que o filme, à essa altura, seja demasiadamente repetitivo. Só que quase nunca, percebam, estamos querendo a massa, e sim o recheio. O recheio de Enquanto Somos Jovens é diferente, mesmo que sua massa já nos seja um gosto conhecido.

Estou feliz por ver Ben Stiller em uma produção que realmente valha algo. Nem fui ver um de seus últimos longas, Uma Noite no Museu 3: O Segredo da Tumba com receio de ver a mesma porcaria que vi em Uma Noite no Museu 2 (essa trilogia foi uma das principais agentes 'a favor' da minha desapreciação por trilogias, franquias e tudo o mais). Realmente, nunca cheguei a achar Ben Stiller engraçado. Sério. Todo mundo ri dele. Menos eu. É igualzinho ao Sandler. Fazendo drama, acredito que Ben se sai bem melhor do que em comédias (pra falar verdade, acho bem mais clichê Ben fazendo aqueles papéis toscos de 'bom' que a todo momento o vejo fazendo, só pra citar exemplos: o ridículo Entrando numa Fria, Antes Só Do que Mal Casado, Quero Ficar Com Polly, entre outros lixos que só me fazem ter mais ódio por sua pessoa). Adam Sandler eu até perdoo (raramente, digo) por que tem alguns filmes que ele se safa e até consegue me fazer rir em determinados trabalhos, ou consegue dar uma virada no jogo e mostrar sua alma humana atrás de toda sua palhaçada comichã, como no último fracasso dele Trocando os Pés.

Naomi Watts é uma de minhas atrizes prediletas. Nem tenho o que dizer quanto à sua mais-que-especial participação nesse longa como protagonista. Venho amando a bela Watts, sinceramente, desde que ela atuou em Cidade dos Sonhos. Desde esse filme, faço questão de ver e apreciar sua beleza e seu talento em cada filme que participa, e acredito sim que a britânica ainda em breve conseguirá abocanhar o mais que merecido Oscar. Não que eu queira dizer que esse Oscar deveria ser dado à ela por sua performance neste longa (de jeito algum!). Digo que, no futuro. Ano que vem. 2017, 2018. Ainda temos muitas edições do prêmio pela frente e queira que ela vença em uma delas (é mais que necessário).

E, é isso aí. Enquanto Somos Jovens pode ser visto ambiguamente como um romance sobre os infames detalhes e as peculiaridades da meia-idade e a aproximação da indesejada velhice ou como um drama sobre um homem que não consegue lidar ou se espelhar na juventude de um rapaz e a perseguição dele por suas ambições, que já não está mais à altura de Josh, e talvez isso cause nele um sentimento incessante de revolta e tristeza. Ou, também como uma comédia, sobre a transição da vida adulta para a vida anciã de um casal e os meios que preenchem o espaço situado nesse intervalo de tempo (a meia-idade), nesse caso, a relação de Josh e Cornelia com Jamie e Darby.

Enquanto Somos Jovens (While We're Young)
dir. Noah Baumbach - 

quarta-feira, 17 de junho de 2015

Crítica: "FRANK" (2014) - ★★


Achei Frank um filme esquisitão. E isso é o melhor dele. O pior vem depois. Confesso que fiquei bastante animado com o show de bizarrices apresentado pela tresloucada banda The Soronprfbs: um protagonista que veste uma cabeça falsa por todo o tempo, sem retirá-la por um segundo, nem mesmo para as necessidades especiais; uma mulher psicopata; um francês que não consegue se comunicar com ninguém da banda por conta de sua língua diferente; um homem (produtor) que tem fetiches sexuais por manequins... E, por fim, um jovem tecladista substituto que tenta se adaptar às estranhas acomodações oferecidas pela banda. 

Até aí, o filme é bem interessante. Só que é tudo muito rápido, e confuso, ainda por cima. Fica difícil compreender os objetivos da película e as suas intenções com tanta desnecessária bagunça. Além disso, os elementos fogem frequentemente de nossa vista. Enfim, só sei que não gostei muito de Frank. É um filme que me deixou inusitadamente desconfortável (no pior sentido da frase) e impaciente. Acho que é justamente por esse motivo que vi Frank: só tem noventa minutos. Um minuto a mais - juro - e uma estrelinha das duas que dei desapareceria. O filme é muito chato, e repetitivo. E, acrescento: clichê!

Michael Fassbender está surpreendentemente maravilhoso no problemático papel da estrela da banda: o doente e estranho Frank. Mas é limitado. Até que o personagem começa a cansar, e nos deixar fadigados. Dá vontade de sair da sala de cinema sem mais nem menos e pedir o dinheiro de volta. Sério. Eu realmente não gostei de Frank. Não me agradou. Não me satisfez. Por algum motivo, Frank me pareceu demasiadamente demasiado e interminavelmente irritante.

A história é incrível, mas o filme é um fracasso. Não conseguiu abranger as essenciais necessidades criadas pela trama. O roteiro, em partes, é brilhantemente inteligente, e, vira e mexe, dá boas sacadas, mas falha na intenção de reproduzir um conteúdo que possa realmente sobreviver o tempo e ainda sim nos deixar com um gosto de "querendo mais", e não o gosto de "que saco, acaba logo!". Tempo desperdiçado. Não tem como deixar mais resumida a minha fúria pelo longa. Tempo irreversivelmente desperdiçado. Isso tudo em partes.

E olha que eu adoro filme independente. Tomem cuidado: já me acusaram muitas vezes de ser defensor de suas causas (risos). Aprecio muito a qualidade e o brilho dos filmes deste gênero, e quase nunca desgosto de algum filme cuja produção foi realizada através do uso de uma quantia de dinheiro consideravelmente baixa para sua realização ou coisas do tipo. Faz parte da minha absoluta cinefilia. E, eu me decepcionei, pois eu tinha tudo ao meu alcance em Frank: um filme independente, aclamado internacionalmente, mostrado em Sundance (a Cannes dos filmes indie), e com uma história que tinha tudo pra me deixar mais que saciado. Tudo foi em vão. Não demorou nem meia hora, já corri para o relógio ver o tempo. 

E olha que o elenco tem nomes bravíssimos, cheios de obras-primas em seus currículos. Estou falando, é lógico, do talentosíssimo Michael Fassbender e da cobiçada Maggie Gyllenhaal, aqui fazendo um papel bem "nutritivo" de psico-artista (algo que merece crédito num longa tão desapontador). 

O diretor Lenny Abrahamson, um "fera" do cinema irlandês, de quem eu, até essa péssima decepção, nunca tinha ouvido falar, merece um elogio. O cara se dedicou a fim de fazer com que o bizarro clima resplandecido pela trama ficasse no ar até os últimos segundos, e nisso, me orgulho de dizer que ele foi sensacional. O roteiro, apesar de falhas e erros assombrosos, destaca-se pelas já citadas boas sacadas além da construção belíssima da história e, na influência desse "clima bizarro".

Frank
dir. Lenny Abrahamson - 

terça-feira, 16 de junho de 2015

Crítica: "007 - QUANTUM OF SOLACE" (2008) - ★★★


Cada dia que passa, ficamos mais próximos do lançamento de 007 Contra Spectre. E, este ano, estou realizando a "promessa" de ver os três últimos filmes estrelados por Daniel Craig na franquia. Em março, revi 007 - Operação Skyfall. Futuramente, reverei 007 - Casino Royale, que tanto influenciou a trama deste filme, Quantum of Solace. Para quebrar o suspense e a fúria causadas pelo título não-traduzido, Quantum of Solace, aqui facilito suas vidas: o título, se viesse a ser traduzido para o português, funcionaria mais ou menos como 007 - Quântica do Consolo, o que, no final das contas, faz um baita sentido.

E, até que o filme não é tão ruim quanto eu pensei que seria. Lógico, não é como 007 - Casino Royale, mas, sob nenhum aspecto, chega a ser um filme desapontador, digamos. Recomendo: no caso de algum de vocês quererem ver este filme, vejam primeiramente 007 - Casino Royale, justamente para não deixar de compreender este além de evitar um astronômico spoiler do final de Casino Royale. Nesta missão, Bond é monitorado para seguir os passos de uma corporação criminosa, algo que o leva a vários pontos de sua última tenebrosa missão, e o faz mais ainda revoltado e cheio de vingança. 

007 - Quantum of Solace poderia ter melhorado muito. Não sei se é só impressão minha ou se Marc Foster exagerou e errou feio na receita. Talvez, por conta da inexperiência com filmes de ação, este projeto não tenha se saído tão ótimo. Seria aceitável. Só que, ainda por cima, Foster decidiu esconder sua inexperiência debaixo do tapete e usou a mal-feita edição do filme para encobrir todo o caos de seu "não-talento" com filmes de ação nas cenas de grande porte, incluindo a abertura meia-boca, que, se percebermos bem de perto, é totalmente dependente da edição, novamente, mal-feita.

Marc Foster é um sujeito cuja "ficha" possui muitos trabalhos "prós" e muitos trabalhos "contra". Recentemente, vi aquele que considero "seu melhor filme": Mais Estranho que a Ficção. E isso por que até hoje não tive a oportunidade de ver um de seus longas mais aclamados, A Última Ceia, que deu o Oscar a Halle Berry. Vi Em Busca da Terra do Nunca mas fiquei tremendamente dividido. Enquanto, em partes, o achei muito interessante e bem construído, por outro lado fiquei decepcionado com a falta de seriedade e compromisso da equipe que o fez. O Caçador de Pipas, melhor não dizer nada. Quanto à 007 - Quantum of Solace, digo muito alto: "nada mal!".

Daniel Craig está tão bom aqui quanto esteve no bombástico e altamente talentoso 007 - Cassino Royale. O melhor do ator é que ele se encaixa brilhantemente em James Bond. É incrível. Sei que pode ser cedo demais para afirmar, mas é preciso qualificá-lo à altura das grandes performances dos lendários Roger Moore e Sean Connery como Bond. Craig é espetacular. Acho que nem mesmo o último James Bond, Pierce Brosnan, foi tão competente como esse aqui. Parece mesmo que Daniel se entregou de corpo e alma - parece não, é! - à Bond no fim de transformá-lo em seu personagem mais reconhecido.

Elogios à parte, volto a debater Foster com a falsidade com a qual ele comprometeu as criativas cenas de ação desse longa. Posso estar errado, mas é muito artificial. E estúpido, aposto. Não dá pra sentir gosto, adrenalina, em cenas tão ausentes de alma e poder. A fúria do personagem Bond quase nunca se é percebida, ao não ser especialmente no complexo final. O roteiro de Paul Haggis chantageia emoções por um punhado de tiro, porrada e bomba, o que, aqui, não pegou bem. A tensão acentuada da trama é desculpa pelos dramas internos ocasionados pelos diversos problemas que acometem o olfato (des)apurado do filme. Além disso, quase não vi as bond girls. A belíssima Olga Kurylenko entra no início, sai de campo no meio, e retorna (invisivelmente) no final. E nem rola uns "amassos" (sim, estou excedendo beijos). Só com a tal Mrs. Fields (Gemma Arteton), assistente britânica do MI6 e que trabalha na embaixada boliviana, que se deita com Bond durante a estadia dele em La Paz, só que é tão rápido, mesmo que uma boa referência à 007 Contra Goldfinger esteja metida nesse meio. Nem parece que é (e, pra mim, coisa que não pode faltar em filme de 007 é bond girl, senão perde a graça, "risos"). 

007 - Quantum of Solace (Quantum of Solace)
dir. Marc Forster - 

domingo, 14 de junho de 2015

ORANGE IS THE NEW BLACK / 3ª Temporada


Finalmente! Depois de muita ansiedade, a 3ª temporada de Orange is the New Black foi disponibilizada na última sexta-feira pelo canal pago Netflix. E, como eu esperava, o resultado foi tremendamente positivo, como os obtidos anteriormente com a primeira e a segunda temporada. Só que não esperem demais, se forem comparar este temporada com as duas primeiras. Essa é mais suave. Não verão muitos aspectos da primeira e da segunda aqui. Essa terceira temporada fala muito sobre a fé, a família, além de explorar mais afundo as relações entre as prisioneiras, nos sentidos afetivos e emocionais. Talvez seja bem estranho ver esse temporada sucedendo a segunda, a mais violenta já registrada na série, devido aos eventos causados pela detenta Vee, o personagem-central daquela temporada.

Aqui, as tramas estão focadas em outros pontos. Acho que é mais como uma forma de diminuir a tensão provocada pelos eventos já citados ocorridos na 2ª. O bom e, com certeza, o mais interessante a ser visto nessa 3ª temporada é a evolução de identidade dessas personagens. É bom ver que o clima na prisão se alastra, desta vez, para o barco dos funcionários, deixando o barco das detentas mais leve, de fato. Devido às constantes crises no setor, e problemas que levam à prisão de Litchfield à alguns ajustes que acabam favorecendo conflitos econômicos, alguns deles não tão prejudiciais às prisioneiras, mas principalmente aos funcionários.

(Lá vem spoiler) O anúncio (alarme-falso) do fechamento de Litchfield pode causar um pouco de desconforto ao espectador, mas é passageiro, mesmo que as coisas na administração de lá ganhe proporções mais preocupativas. É possível dizer que esta temporada talvez também esteja priorizando o papel e a função deles lá. Muitos tornam-se infelizes com a situação. Outros, extramente preocupados. Enquanto alguns procuram ajudar, outros apenas tendem a complicar, como a chegada de um diretor barra-pesada que causa inusitadas dores de cabeça em Joe Caputo.

Mas, como eu disse, há algo de especial nessa nova temporada: a fé. Li um artigo, não lembro aonde, que dizia que essa nova fase da série exibiria a presença da religião, da fé em geral e da crença em Litchfield, principalmente nas prisioneiras. E é algo onipresente, sim. A 3ª temporada, essencialmente durante os famosos flashbacks da vida pré-prisão das detentas, examina, no estilo de cada uma, o papel da fé. Não a importância, não é esse o objetivo. Mas apenas a fé. Ou então o quanto a fé afetou a jornada daquelas mulheres. O quanto aquilo transformou suas vidas dentro e fora da prisão, ou até mesmo na atualidade. Por que, afinal, a fé é algo que geralmente encontra conexão na prisão. Já vi, por se dizer experiencialmente bem de perto, casos do tipo. A religião é uma fortaleza para algumas devotas que encontram-se por trás das grades e, a maioria delas, busca a salvação por meio de cultos, rezas, promessas e tudo o mais possível.

Piper engrandece sua popularidade nessa temporada. No meio da temporada, uma reviravolta no setor alimentício causa um terrível problema para todos. Com isso, Piper cria um novo plano: esvazia o estoque de macarrões instantâneos da "lojinha", com o fim de lucrar com uma troca, criada por ela: o tempero do "miojo" é capaz de disfarçar o ruim gosto das novas refeições oferecidas pela prisão. Com isso, ela pretende lucrar nesse ramo pedindo as calcinhas das detentas, como modo de fornecer à elas os milagrosos temperos. Com as calcinhas, Piper decide fazer um esquema com seu irmão de levá-las para fora da prisão, através do novo guarda, para que ele possa vendê-las pela internet à tarados (quem viu a 2ª temporada vai lembrar que, no primeiro episódio dela, Piper, em Chicago para o julgamento, tratou um esquema com um detento, e com isso, deu a sua calcinha à ele em troca de um favor). E, no fim das contas, o negócio de Piper lucra imbativelmente. 

Essa 3ª temporada, além de conter essas e muitas outras mais mudanças significativas, também explora a vida de outras mais detentas nos flashbacks. As chamadas secundárias. Muitas delas, principalmente algumas das que surgiram na 1ª temporada (ex. Alex, Suzanne, Taystee, Poussey, Daya, Gloria, Tiffany, Nicky, Lorna, Cindy), agora nesta terceira temporada são protagonistas. No entanto, a série oferece justiça às novas, e algumas antigas, secundárias que não tiveram a chance de integrar o grupo acima.

E, como a própria Alex diz num dos episódios, é tanta confusão que mal quase você tem a oportunidade de ver as outras detentas, já que Piper fica confusa e surpresa por ver a quantidade de detentas à sua frente que há pouco tempo a era desconhecida. Algumas dessas secundárias estão na série desde os primeiros episódios (ex. Sophia, Flaca, Big Boo, Norma, Leanne, Yoga Jones), e que ganharam certo apoio na segunda, mas nessa terceira atuam não mais como recorrentes, mas sim como efetivas (o que é verdade). E é bom ver essa evolução, digo, de caracterização da série. O elenco, que já era grande, ganha reforços e fica bem melhor (na minha percepção).

O drama tem pouco espaço nessa temporada. Mesmo que alguns traços, como a triste mudança da "querida" detenta Nicky para a segurança máxima e a gravidez conflituada de Daya, que há tempos nos vem deixando com rugas na testa, reforcem o cunho dramático da temporada, a comédia mostra-se mais forte, algo que era visto nas duas primeiras temporadas, mas talvez com bem menos amplitude, tanto que eu anteriormente via Orange is the New Black mais como um drama do que como uma própria comédia. Vale ressaltar esses detalhes. Vi muita gente disfarçando desgosto pela série dizendo que era um "pseudo-drama" (nem sei de que lugar essa expressão emergiu). Enfim, só sei que estou muito feliz com a chegada dessa terceira temporada. E, mal posso esperar pela quarta, que promete vir com tudo em 2016. 

3ª TEMPORADA: 
MELHOR EPISÓDIO: Fear and Others Smells (E8) - 
MENÇÕES HONROSAS: Mother's Day (E1) - / Don't Make Me Come Back There (E12) - 

sábado, 13 de junho de 2015

Crítica: "SAMBA" (2014) - ★★★★



O talentoso francês Omar Sy, que em 2011 interpretou Driss no grande sucesso Intocáveis, dirigido por Eric Toledano e Olivier Nakache, retorna a fazer uma atuação incrivelmente maravilhosa nessa comédia dramática excelente, que marca mais uma parceria entre a dupla cineasta e este talento virtuoso. Samba é uma obra deliciosa. Simplesmente deliciosa em todos os imagináveis ângulos. 

Consigo traz a história desoladora e marcante de um imigrante ilegal senegalês chamado Samba Cissé que realiza pequenas tarefas quando surge a oportunidade. Vivendo com o tio Lamouna, que possui visto, Samba acaba sendo preso devido a um imprevisto em função de sua legalidade como imigrante no país, o que faz com que ele vá parar diante de Alice, uma agente do governo depressiva que trabalha numa ONG. Alice simpatiza com Samba e quer que ele consiga seu visto, apesar dos inúmeros conflitos que acabam por transtornar a jornada de ambos. Após sair da prisão, eles iniciam um relacionamento amigável, marcado por situações de risco e muitas emboscadas.

A imigração é um assunto que vem ultimamente sendo primorosamente retratado no cinema. Dheepan, dirigido por Jacques Audiard, que venceu a Palma de Ouro em Cannes esse ano, retrata o mesmo tema de Samba: a imigração. Não sei ainda Dheepan, mas Samba realiza um feito extraordinário e sucessivamente bem-realizado sobre o tema, equilibradamente. Meio drama, meio comédia, não demora muito para que Samba inicie a despertar no espectador as emoções mais afloradas em virtude de sua intensa trama. 

É um filme que choca, provoca. Mais do que uma simples comédia, ou um profundo drama... é um retrato, absurdamente real da vida de não só Samba, mas de um gigante grupo de pessoas que atravessa exatamente a mesma situação que ele. Um bom exemplo é um colega próximo de Samba, um argelino que usa uma identidade falsa, Wilson, para trabalho, e com essa identidade a nacionalidade de brasileiro, que o força a se comportar como um e até mesmo falar como um. 

Apesar da seriedade do retrato, Toledano e Nakache esculpem na tela algo bem mais otimista do que a própria realidade em si, algo que pode deixar o espectador em certos momentos chateado. Mas Samba, confesso, em certos momentos me lembra intensamente de Ferrugem e Osso, também de Audiard. O filme não retrata a imigração, nem nada do que se possa igualar a Samba, mas eu senti, brevemente, uma conexão entre eles. Talvez tenha sido algo emotivo. Samba, sobretudo mostrando a relação amorosa de Alice e Samba, me lembra fielmente de Apenas uma Vez, do fabuloso romance não-assumido do músico e da florista. 

Samba, no fundo, soa bem mais como comédia do que drama, pensando bem. A tragédia é presente, só que ainda sim permanece no fundo, esteticamente constante mas encoberta pelo humor da situação e do jeito como a história transparece. Não acredito que Samba seja um filme superficial por conta disso. Muito pelo contrário. O filme é nesse ponto genial, justo por saber equilibrar de maneira tão excêntrica e cordialmente inteligente a comédia, o drama e o romance presentes dentro da história de Samba.

Não acho a história superficial, só que com certeza ela poderia ter ido bem além de onde ela terminou. Digo, a história poderia ter cavado mais fundo. Arriscar mais possibilidades, ou atenuar o conflito, sinceramente seria bem preciso. Não acuso o filme de superficialidade, mas que era possível ter ido além, era. Omar Sy, que estava brilhante ao lado de François Cluzet na infalível tragicomédia Intocáveis, o maior filme dirigido até o momento por Olivier e Eric, aqui faz um personagem, talvez, mais sério do que o realizado no longa que o deu um César em 2012. Bem que ele poderia receber outro esse ano por sua interpretação como Samba, que, acredito ser tão boa quanto a que ele deu anteriormente em Intocáveis.

A bela Charlotte Gainsbourg é uma atípica surpresa deste longa. Até que seu melancólico papel carrega consigo pontos engraçadíssimos ao longo de tanta confusão e tensão que tanto embalam e sacodem o percurso da história. Inevitável dizer que a francesa está incrível como Alice (merece atenção especial no final meticulosamente enigmático e divertidamente irônico). Protetora e maior "fã" do imigrante Samba, ela demonstra caridade, paixão e admiração por ele, a quase todo momento do filme desde o início, protagonizando ao lado dele cenas intensas e bem confortáveis. 

Um milagre Samba ter chegado aqui no Brasil. Há pouco tempo, nem havia previsão de estreia. O longa atualmente está sendo exibido no conceituado Festival Varilux de Cinema Francês, do qual tive a grande chance de participar neste ano. A estreia nacional do filme pela Califórnia Filmes está datada para o dia 9 de julho. Ver Samba não teve preço. Aliás, teve sim. É um filme que totalmente faz jus ao preço do ingresso, que, por essa sessão, merecidamente deveria valer bem mais. Samba é um filme por demais precioso. Recheado com uma agradável humanidade, além de cenas espirituosas e dramáticas, Samba é um longa naturalmente primoroso, tanto por seu dedicado elenco, tanto pela forte história, quanto por sua qualidade inestimável.

Samba
dir. Eric Toledano & Olivier Nakache -