Estava com uma cópia em vídeo de O Teorema Zero desde o ano passado, em outubro, creio. Ontem à noite, descobri o empoeirado filme enquanto arrumava uns "bagulhos", e fiquei curioso. Decidi vê-lo. Acabei de entrar de férias, por isso, tento ao máximo aproveitar o tempo de um mês e um dia que me foram concedidos de descanso para ver alguns bons filmes. Fui dormir ontem bem tarde vendo este longa de Terry Gilliam, cujo longa O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus me agradou demais. No fundo, mesmo o estilo de Gilliam parecer terrivelmente confuso e inteiramente complexo, tenho facilidade para apreciar os filmes dirigidos por ele.
O Teorema Zero não me agradou tanto, porém não me deixou cansado em momento algum. Uma da madrugada e lá eu estava, vidrado assistindo ao longa. Caso fosse um lixo, não tenho dúvidas de que uma hora ou outra a soneca bateria. E o bom é que não bateu. Sinal de que, talvez, é um filme poderoso, mas que não escapa de alguns pequenos momentos de incompreensão que podem sim irritar o espectador. O Teorema Zero narra as aventuras de um hacker computacional chamado Qohen Leth, nome que usualmente é confundido com Quinn por seu parceiro de trabalho. Qohen é antissocial, introvertido e extremamente peculiar. Após pedir licença médica de seu trabalho por questões pessoais, ele é encaminhado para consultas psicológicas com uma médica virtual, e, trabalhando de casa, ele é responsabilizado por cuidar e desvendar o Teorema Zero, uma fórmula aparentemente indecifrável que intercepta o sentido da existência. Enquanto isso, Qohen espera atentamente por um telefonema misterioso que poderá lhe dar o real sentido de sua vida, cujo ele recebeu apenas uma vez e acabou descartando.
O Teorema Zero lembra em alguns aspectos a maior obra de Gilliam, Brazil - O Filme, que era virtuosamente brilhante. No entanto, falta muita coisa em O Teorema Zero para que o longa possa ser qualificado tão bom quanto a maior obra de Terry. O Teorema Zero é um filme mais confuso, perigoso, inquieto, e talvez um pouco exagerado. A fotografia de Nicola Pecorini, em tons arrebatadores e berrantes cheios de cores que fazem os olhos arderem, talvez possa ter expressado bem a intenção do filme de exibir o quanto a tecnologia está conectada à nossa vida, só que ainda sim não escapou do exagero. Os cenários foram reproduzidos com beleza e técnica incrível para um filme independente, mesmo assim, também no final ficou ficou um tanto quanto exagerado.
O roteiro de Pat Rushin até que é bom, mesmo que seja lá confuso por envolver tanta matemática e tantas outras emoções num só lugar. Gostei da invenção "Teorema Zero", que é resolvido explicando que a vida e o universo não possuem algum sentido, e que terminam sem nenhuma explicação, apenas resultando num vazio imenso, que meio que combina com a minha visão filosófica do sentido da vida, cuja é que a mesma termina sem nenhum significado aparente, numa eterna escuridão preenchida por um vazio insustentável, ou seja: não há céu, não há inferno, não há salvação, não há vida pós-morte, não há absolutamente nada. A vida termina por si inexplicável.
Gostei muito das atuações deste estranho e incrivelmente inusual filme. Christoph Waltz, no papel atípico de Qohen Leth, mostra-se bem trabalhado e articulado com seu personagem careca. Matt Damon é totalmente irreconhecível no papel do Gerente (algo que certamente prova o talento de camaleão do velho Matt). Tilda Swinton, quem eu esperava ver mais aqui, apereceu em pouquíssimas cenas como a psicóloga virtual de Leth Shrink-ROM. Mélanie Thierry, de quem eu nunca tinha ouvido falar, aparece com brilho nos olhos e um rostinho belo no papel de uma prostituta virtual chamada Bainsley, quem Leth conhece numa festa. Creio que Thierry ainda poderá nos mostrar algo maior do que este personagem feito em O Teorema Zero. Desperdiçar o talento da moça seria um erro fatal.
No fim, podemos tomar deste filme-labirinto duas distintas interpretações: a primeira e a de que o filme trata-se de uma metáfora cheia de simbolismos que resulta na conclusão de que a sociedade atual é guiada pelo virtualismo compulsivamente, e que a nossa vida está sendo privada aos poucos pela imensidão e ao mesmo tempo isolação da tecnologia; e a segunda é a de que, ao mesmo tempo em que serve de crítica futurista para a evolução e a popularidade desenfreada da tecnologia, também pode ser visto como uma crítica religiosa escondida, já que Leth, que mora em uma igreja abandonada, vive acreditando que um dia terá um telefonema que poderá lhe dar o sentido da vida, no entanto, no final, ele descobre que tal telefone foi invenção de seu Gerente para levá-lo à bordo do indecifrável Teorema Zero (ou seja, o telefonema significa a religião, e que seus membros passam uma boa parte de suas vidas acreditando em suas salvações e as respostas para as suas dúvidas na religião, mas no fim da vida, acabam por morrer sem saber que tal religião não existia - o que é algo bem ateu da parte do roteiro, mas enfim, é uma hipótese lógica). Como o personagem de Christoph vive falando tudo na 1ª pessoa do singular (nós), talvez ele queira significar que, com as declarações feitas naquela pessoa, ele significasse mesmo um tanto de gente: membros da religião. Existe uma terceira, que eu mesmo já antecipei, que baseia-se na qual o filme serve ambiguamente como crítica religiosa e crítica social para a privação humana através da rede virtual (a internet).
O Teorema Zero (The Zero Theorem)
dir. Terry Gilliam - ★★★