sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Top 10 – ANOS 50


1. Um Corpo que Cai, de Alfred Hitchcock
2. Crepúsculo dos Deuses, de Billy Wilder
3. Janela Indiscreta, de Alfred Hitchcock
4. Intriga Internacional, de Alfred Hitchcock
5. Os Incompreendidos, de François Truffaut
6. Quanto Mais Quente Melhor, de Billy Wilder
7. Cantando na Chuva, de Gene Kelly & Stanley Donen
8. Morangos Silvestres, de Ingmar Bergman
9. Sindicato de Ladrões, de Elia Kazan
10. Luzes da Ribalta, de Charlie Chaplin

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Crítica: "DEMOLIÇÃO" (2015) - ★★


Depois de dois trabalhos tão interessantes e, de certa maneira, bem finalizados, o canadense Jean-Marc Vallée retorna com um filme menor, provavelmente o seu pior até agora. Que filme mais cansativo, confuso e sem sentido, viu? Uma decepção total. O filme não vale a pena nem pelo elenco. Apesar das figuraças Jake Gyllenhaal e Naomi Watts estrelarem o filme, o melhor dentre eles é Chris Cooper, para se dizer o mínimo.

O filme em si, fora isso, não dá quaisquer motivos para ser louvado ou lembrado. É fácil de esquecer. A experiência de vê-lo pode ser resumida em duas palavras: caótico e exótico. Demolição aborda a história de um cara que perdeu a esposa num acidente de carro, mas que nunca a amou de verdade, e por isso age de forma indiferente a esse acontecimento. As pessoas ao seu redor percebem essa indiferença, mas a interpretam como luto. Eventualmente, ele conhece uma mãe solteira (Naomi Watts) e seu filho (Judah Lewis), com quem faz amizade. Enquanto isso, seu sogro (Chris Cooper) passa por uma fase terrível de luto.

Sabe o que eu acho? Demolição teria funcionado perfeitamente como uma comédia negra, sabe? A história de um cara que reage indiferentemente à morte da mulher daria uma boa de uma comédia negra, ou um filme do tipo, até porque essa premissa tem ousadia de sobra, bem como as possibilidades que a seguem. E não que Demolição não tenha seu humor.

Tem duas sequências, só para citar as que eu lembrei, que são extraordinárias ao meu ver (é claro, separadas do resto do filme), que é a cena do médico, e a cena final. O filme traz diversas perspectivas curiosíssimas de se ver, mas que são incapazes de sustentar a mensagem que o mesmo quer nos transmitir – e que, ao final, não fica muito bem esclarecida –.

O filme explora as situações com um olhar distante e abafado, de forma a ser impossível identificar a síntese dos personagens e a dimensão do roteiro. Eu acho que até mesmo Livre, filme anterior de Vallée (e que muita gente detestou, pelo que eu me lembro), foi um filme melhor, digamos. Demolição é um trabalho fraquíssimo, com poucos pontos positivos. 

Demolição (Demolition)
dir. Jean-Marc Vallée - 

domingo, 25 de setembro de 2016

Crítica: "DE PALMA" (2015) - ★★★★


Muito interessante esse documentário sobre o cineasta americano Brian De Palma. Muito interessante mesmo. É raro a gente encontrar um material assim de qualidade sobre um diretor revendo a sua filmografia e comentando sobre a experiência de fazê-las e detalhando o trabalho em si. E, no caso da filmografia do De Palma, serve tanto pra gente se lembrar e celebrar alguns dos maiores sucessos da carreira dele e também para denotar a opinião própria dele quanto a esses filmes. No meu caso, há um ponto extra: como não vi nem a metade de seus filmes, essa "revisão" serviu também de introdução à sua filmografia inicial e alguns filmes não assistidos, como Carrie – A Estranha ou O Pagamento Final.

Em um certo momento do documentário, De Palma diz que como um “aluno” do Hitchcock, foi um dos poucos a conseguir fielmente emular o padrão hitchcockiano e seguir a fórmula dos filmes do mestre do suspense. Há quem diga que isso seja um tanto egocêntrico da parte do De Palma. Mas, pra mim, a questão é justamente o contrário dessa hipótese. É bastante honesto ele dizer isso, visto que o Hitchcock foi o verdadeiro e invicto mestre, e tantos outros tentaram copia-lo ou imita-lo, mas acabaram desrespeitando a filmografia e o legado do Hitch. O mesmo já não pode se dizer do De Palma, que, aluno fiel do mestre, acabou se tornando um também, à sua própria maneira.

O documentário abre com o Brian discutindo a intenção de Hitchcock ao fazer Um Corpo que Cai (confesso que desconhecia tal premissa, e achei curiosíssimo) que era simular o trabalho de um diretor durante um filme. Genial. E essa não é a única vez em que Hitchcock é referenciado. Muitos dos grandes trabalhos do De Palma indicam uma certa influência hitchcockiana, pra não dizer quase todos os suspenses tem uma certa marca hitchcockiana. 

Mas também tem um filme que o De Palma fez, no comecinho da carreira, que ele alega ter sido influenciado pela Nouvelle Vague, que foi Quem Anda Cantando Nossas Mulheres, quando ele e o Robert De Niro, protagonista do filme, ainda eram praticamente desconhecidos. Creio que o Baumbach, um dos idealizadores do documentário, ficou bastante entusiasmado com essa específica parte dele comentando sobre Godard e Truffaut.

Outra coisa bem curiosa é como o De Palma comenta a maioria de seus filmes visando o espírito comercial deles. Aliás, achei bastante esquisito ele comentar sobre Um Tiro na Noite, cujo eu considero seu melhor filme, com um certo ar de insatisfação, visto que o filme foi um fracasso nas bilheterias, porém é o trabalho mais potente e visionário dele.

Engraçado ele comentando sobre os bastidores de Os Intocáveis, outro filmaço, e mencionado aquela famosa sequência da escada (a melhor do filme todo) que é uma referência a uma cena em particular do clássico do cinema mudo O Encouraçado Potemkin, de Eiseinstein. Sean Connery, que interpreta Malone no filme, não gostou da cena em que metralhado, segundo o De Palma. O ator ficou bastante incomodado. Enquanto comenta, o De Palma ri, dizendo que acha irônico ele ter sido o James Bond em tantos filmes, mas se irritar ao ser baleado. E, de fato, o James Bond só foi baleado 2 vezes em toda a saga, que conta com uns 50 filmes, eu creio.

Sissy Spacek, antes de ser a Carrie no famoso filme homônimo, talvez o mais famoso do De Palma, foi assistente de figurino em um filme anterior dele, O Fantasma do Paraíso. Já o filme que De Palma considera seu melhor é O Pagamento Final. Tenho o dvd, mas nunca vi. Confesso que o interesse em conferi-lo cresceu após esse comentário.

É um pouco triste ver como o diretor olha com pesar à filmografia mais recente, que não tem sido muito bem aceita pela crítica em geral. E peculiar o fato de nenhum filme dele ser produção americana autêntica desde Missão: Marte, fracasso crítico e de bilheteria. Até mesmo Dália Negra, que se passa em Los Angeles, teve a maioria das cenas rodadas na Bulgária e na Itália, e foi financiado por uma produtora estrangeira. Embora tenham sido alvejadas pelos críticos, essas obras recentes do De Palma, como Femme Fatale, Dália Negra, Guerra sem Cortes e Passion estão entre os maiores filmes dele. Esses críticos sem alma sempre acabam com tudo!

Parece que ele não está mais filmando Lights Out, também rodado no exterior, que estava previsto para ser lançado ano que vem. Agora parece que o De Palma está focando em outro projeto, The Truth and Other Lies, adaptação de um livro. É esperar pra ver.

Enquanto seu próximo filme não vem, o documentário De Palma é uma pedida obrigatória para fãs do diretor e cinéfilos. Talvez o único ponto negativo de De Palma é a distância e a falta de intimismo. Mesmo assim, é um trabalho fascinante e que deve ser visto. 

De Palma
dir. Noah Baumbach, Jake Paltrow - 

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Crítica: "WAKING LIFE" (2001) - ★★★★★


Meu interesse pela filmografia de Richard Linklater surgiu logo após que vi Antes do Pôr-do-Sol, em 2014 (que, aliás, foi o primeiro filme dele que eu vi). Depois de Boyhood, veio a confirmação daquilo que eu já protestava ser uma certeza: Richard Linklater é um grande diretor. Um dos maiores dos nossos tempos, para ser mais exato. Seus filmes transbordam importância, criatividade, genuinidade e grandeza. Não foi nada diferente com este Waking Life, que é certamente um seus melhores trabalhos.

O interessante é que se trata de uma animação filtrada, com aspectos que lembram o formato live-action, como a câmera trêmula, a expressão das personagens, os movimentos, a sincronia. Provavelmente a única coisa realmente estranha nessa animação é que os cenários e as pessoas ficam balançando, tremendo, chacoalhando, sem um motivo aparente, independente de emoção, tom de voz ou coisas determinantes do gênero. Será que o diretor propôs essa experiência a fim de tentar minimamente expressar ou indicar a agitação do ser, a inconstância do espírito humano, da fragilidade emocional? É bem interessante perceber essa técnica e o efeito dela no espectador. As interpretações, é claro, variam de pessoa para a pessoa.

Uma das minhas partes favoritas de Waking Life é justamente uma sequência “spin-off” estrelada pelo casal Jesse e Celine. Eles estão num quarto de hotel, eu creio, e dialogam e refletem sobre a natureza surreal dos sonhos, lembrando até mesmo algumas das mais inspiradas conversações da dupla nos filmes da trilogia “Antes”. Tem uma cena, inclusive, que uma parte do filme Antes do Amanhecer é exibida num cinema.

Waking Life é um filme sobre realidades e ilusões. Sonhos e desesperanças. A vida e o mundo ao redor. As pessoas. Os sentimentos. As situações. Nas mais diversas sequências do filme, há um teor de profundo existencialismo pairando sobre as conversas entre os personagens, referências filosóficas, citações, e etc..

Waking Life explora a metafísica dos sonhos, a linguagem do subconsciente onírico, chegando a apresentar perspectivas bastante interessantes sobre o que acontece nos nossos sonhos e as mais distintas conexões com o nosso dia-a-dia, com as nossas emoções e impressões sobre o que acontece diante de nós.

É o sonho uma explicação para a realidade? Sonho e realidade são as mesmas coisas? Nós realmente estamos vivendo aquilo que pensamos, que defendemos ser a mais pura e indestrutível verdade? O que é sonhar e viver? A gente sabe sonhar? A gente sabe, então, viver? Waking Life é um filme que tende a amadurecer conosco com o passar do tempo. Na verdade, não há uma explicação certa sobre o que acontece no filme, ou a sequência de cenas exóticas. A interpretação individual, nesse caso, é a resposta, porque o efeito dos diálogos, dos pensamentos emitidos no filme tem um impacto diferente em cada um que vê. E isso é o que torna Waking Life uma maravilha de filme existencial. Linklater é um cara genial. Waking Life é um filme inesquecível. Acordar para a vida. Sonhar para a vida. Viver os sonhos, os sonhos que consomem nossa destrutibilidade. Dream is destiny.

Waking Life
dir. Richard Linklater - 

2 ANOS DE LUMIÈRE & CIA.

 

Nem parece, mas hoje completam-se 2 anos desde que eu abri esse blog. O tempo passa rápido. Sei que é um clichê, mas não há como negar a veracidade dessa sentença. Ultimamente ando postando pouco, comparado aos anos anteriores, quando eu tinha tempo de sobra para escrever diariamente sobre filmes e com uma frequência abismadora. Hoje em dia, a justa ausência de tempo e o cansaço reduziram a minha atividade aqui no blog. Mas estou tentando colocar tudo em dia, digo logo. Acho que pra quem já acompanha o blog há algum tempo não é novidade que eu sou completamente fascinado por esse espaço. Sei que não escrevo tão bem como outros críticos e cinéfilos da web (aliás, eu mesmo acho que minha escrita é irregular, tenho que melhorar em muita coisa), mas tento fazer o possível, e peço perdão se alguns textos soam incoesos ou repetitivos. A euforia ao escrever é tanta que eu mal consigo me conter e ainda mais evitar certos erros gritantes como esses. 

Nada seria possível sem vocês, leitores. Eu agradeço enormemente à vocês pelas visitas, pela atenção, pelo carinho e pela consideração com este que eu gentilmente apelidei de "meu cantinho especial" para comentar sobre filmes e a sétima arte em geral. O blog faz 2 anos e a sensação é a de que ele foi criado ontem. O primeiro post, inclusive, a gente nunca esquece. Olho para dois anos atrás com satisfação e carinho, ainda que apto das minhas falhas. A iniciativa de criar esse pequeno portal cinéfilo foi uma coisa surpreendentemente espontânea. Meu desejo é de que ele continua no ar por mais e mais anos... E, mais uma vez, obrigado à vocês, meus caros leitores! Até a próxima.

P.S.: Os bolos acima eu peguei no Google Imagens. Achei vários bem criativos, mas gostei demais desses três. Fiquei indeciso sobre qual eu deveria escolher, aí postei logo esses juntos. O segundo é o meu predileto, diga-se de passagem (acho que é artificial, mas será de bom grado se alguém se dispor a preparar um desses pra mim heheheh).

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Crítica: "O PLANO DE MAGGIE" (2015) - ★★★



Amanhã o blog faz dois anos. Como o tempo passa rápido... Parece que foi ontem. Amanhã também começa a primavera – e com essa nova estação vem a expecativa do frio sumir de vez – e o ano vai chegando ao fim. O mês mal começou e já estamos no dia 21. Daqui a pouco vai ser outubro, daí novembro, dezembro, e 2017. O tempo é uma coisa louca.

Enfim, vi o novo filme da diretora independente Rebecca Miller, O Plano de Maggie, que foi tanto adorado quanto odiado pelos críticos, e que já tinha chamado a minha atenção há um tempo. É o primeiro filme dirigido pela Rebecca que eu vejo, embora ela tenha em sua filmografia outros títulos mais famosos e reconhecidos, como A Vida Íntima de Pippa Lee, O Tempo de Cada Um e O Mundo de Jack e Rose. Ela dirigiu todos os seus roteiros, à exceção de um: A Prova, dirigido por John Madden. O mais irônico é que eu conheci ela como a esposa do Daniel Day-Lewis. Só mais tarde foi que eu soube que ela também era diretora e roteirista.

O Plano de Maggie é seu quinto longa-metragem. Pode-se dizer que é facilmente confundível com um filme do Woody Allen, devido à ambientação, fotografia, narrativa com traços quase inconfundíveis e completamente assemelháveis ao estilo autoral do mestre, personagens riquíssimas e com personalidade forte e inconstante atravessando crises amorosas. Não me surpreenderia caso logo abaixo o crédito de direção ou roteiro estivesse o nome do Woody.

Em O Plano de Maggie, a talentosa Greta Gerwig (a nova queridinha do cinema indie americano) interpreta a Maggie do título, uma mulher decidida e simpática na casa dos 30 que deseja ter uma criança, mas que não quer envolvimento em nenhum relacionamento. Ela acaba conhecendo John Harding (Ethan Hawke), um escritor de sucesso que acaba se apaixonando por ela. Não demora muito (literalmente) e ele e Maggie se casam, e ela dá à luz a uma menina. Enquanto isso, Maggie tenta manter uma amizade consistente com a ex-esposa de John, a também escritora Georgette (Julianne Moore).

Um defeito (se é que se pode dizer que é um defeito) do filme é que o mesmo tem um andamento super rápido. Os personagens da história são introduzidos, e aos vinte minutos de filme uma transição agressiva altera os rumos da trama inicial e a premissa entregue é desconstruida e reformulada em um passo extensivamente longo. Não é difícil de acompanhar esse ritmo acelerado e quase irresponsável da narrativa, mas a resolução se dá de forma tão descompromissada e rasa que, enfim, não dá pra simplesmente “não notar” ou “deixar passar” esse pulo. O Plano de Maggie peca em profundidade. Mas, como eu disse, esse tal “defeito” é bastante subjetivo. Eu achei que foi muito bruto, largado, mas tem gente que reclama mesmo que às vezes o filme fica chato com ditos “diálogos desnecessários”, “encheção de lingüiça” ou “repetição/re-enfatização”.

Outra coisa curiosa, mas que não chega a ser necessariamente uma coisa prejudicial, é que o filme começa sem um “início” e termina sem um “fim”, dando a entender que o mesmo é praticamente um “meio”. No entanto, a propósito, no literal o começo e o final do filme ficam claros, percebíveis, indentificáveis, mas fogem do padrão da narrativa que a trama assume, da exigência de um começo promissor e de um final conclusivo. A surpresa é que o filme termina de uma forma bem simples, mas que não pode ser considerado um encerramento propriamente dito, ainda que a gente tenha uma leve impressão do que está por vir, ou ainda da previsibilidade da troca de olhares entre os personagens. Seria uma marca dos filmes da Rebecca? Achei interessante. É meio arriscado e irregular, mas soa exótico. Talvez possa até mesmo ser considerada uma espécie de desafio à narrativa lógica, “certinha”, quem sabe?

O ponto forte do filme é, indiscutivelmente, seu elenco. Greta Gerwig está fabulosa no papel de Maggie. A atriz, cuja presença já por si só costuma me agradar bastante, cada vez mais revela ser uma das intérpretes mais exímias, talentosas e empenhadas dos últimos anos. Ethan Hawke também está numa performance celebrável, como um escritor que está sempre trabalhando, obcecado com seu livro. Julianne Moore, quem muitos sites recentemente estão apontando ser uma das prediletas a Melhor Atriz Coadjuvante no Oscar 2017, está inegavelmente excelente, como é de esperar de uma atuação vindo de uma atriz tão exemplar como ela, mas nem de longe esta fica entre as melhores performances dela, ou muito menos faz-se notável o suficiente para concorrer a um Oscar.

Rebecca Miller é certamente uma diretora promissora e talentosa, mas que ainda tem um longo caminho pela frente. Eu gostei de O Plano de Maggie. É bem resolvido, bem escrito, bem atuado, mas não passa muito disso. De qualquer forma, é engraçado em certos momentos. Uma comédia romântica reverente.

O Plano de Maggie (Maggie's Plan)
dir. Rebecca Miller - 

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Crítica: "DENTE CANINO" (2009) - ★★★★



Até compreendo que o filme tem umas bizarrices malucas e absolutamente esquisitas, mas não entendo porque tanta gente diz ter odiado Dente Canino. Certo, é um filme estranho. Mas ruim? Ruim não. Eu acho que é um filme interessantíssimo, que talvez soe um pouco abstrativo ou até mesmo sem gosto, mas que vai amadurecendo na nossa mente à medida em que a gente vai pensando nele.

De uma forma geral, é um suspense excelente. A tensão é inevitável, o choque é desconcertante. O terceiro longa-metragem do cineasta grego Yorgos Lanthimos (quem eu conheci com a surpreendente obra-prima The Lobster, que pra mim continua sendo seu melhor filme) é um exercício cinematográfico cativante, que prende a nossa atenção, e surpreende por ser chocante, maquiavélico e torturador ao mesmo tempo.

Aos poucos, o filme ganha proporções de um filme de terror, com direito a uma série de sequências estranhas realmente amedrontadoras. O elenco é soberbo. As performances são incríveis, inacreditáveis de tão realistas e triunfais. É o filme mais impactante e angustiante de Lanthimos, que a cada filme vai deixando uma ótima impressão da dimensão, da força estética e do poder fílmico de seus trabalhos. Dente Canino é um filme que, no mínimo, merece ser visto. E, provavelmente, revisto. Interessante observar, mais uma vez, as pequenas e maiores obsessões desse diretor brilhante de estilo feroz e memorável, como os finais vagos.

O próximo filme desse grego excepcional, The Killing of a Sacred Deer, rodado em inglês, tem no elenco Nicole Kidman e Colin Farell (que esteve em The Lobster). Esse promete. É esperar pra ver. O lançamento está marcado para ano que vem, nos Estados Unidos, pelo menos. 

Dente Canino (Κυνόδοντας/Kynodontas) 
dir. Yorgos Lanthimos - 

Crítica: "DENTE CANINO" (2009) - ★★★★



Até compreendo que o filme tem umas bizarrices malucas e absolutamente esquisitas, mas não entendo porque tanta gente diz ter odiado Dente Canino. Certo, é um filme estranho. Mas ruim? Ruim não. Eu acho que é um filme interessantíssimo, que talvez soe um pouco abstrativo ou até mesmo sem gosto, mas que vai amadurecendo na nossa mente à medida em que a gente vai pensando nele.

De uma forma geral, é um suspense excelente. A tensão é inevitável, o choque é desconcertante. O terceiro longa-metragem do cineasta grego Yorgos Lanthimos (quem eu conheci com a surpreendente obra-prima The Lobster, que pra mim continua sendo seu melhor filme) é um exercício cinematográfico cativante, que prende a nossa atenção, e surpreende por ser chocante, maquiavélico e torturador ao mesmo tempo.

Aos poucos, o filme ganha proporções de uma produção de terror, com direito a uma série de sequências estranhíssimas realmente amedrontadoras, reforçando a tensão e o pânico. O elenco está soberbo. As performances são incríveis, inacreditáveis de tão realistas e triunfais. É o filme mais impactante e angustiante de Lanthimos, que cada vez mais vai deixando uma ótima impressão da dimensão, da força estética e do poder fílmico de seus trabalhos. Dente Canino é um filme que, no mínimo, merece ser visto. E, provavelmente, revisto. Interessante observar, mais uma vez, as pequenas e maiores obsessões desse diretor brilhante de estilo feroz e memorável, como os finais vagos, como aquele de The Lobster. Tão anti-conclusivo (no bom sentido). 

O próximo filme desse grego excepcional, The Killing of a Sacred Deer, rodado em inglês, tem no elenco Nicole Kidman e Colin Farell (que esteve em The Lobster). Esse promete. É esperar pra ver. O lançamento está marcado para ano que vem, nos Estados Unidos, pelo menos. 

Dente Canino (Κυνόδοντας/Kynodontas) 
dir. Yorgos Lanthimos - 

TOP 10 – 2016 (so far)


Até agora o ano cinematográfico está sendo maravilhoso. E, com tantos filmes bons assim que já pintaram nos cinemas, ainda tem mais outras estreias importantes pra frente. Até agora, só entrou coisa boa.

TOP 10 – CIRCUITO






































1. Carol, de Todd Haynes
2. A Assassina, de Hou Hsiao-Hsien
3. Spotlight, de Tom McCarthy
4. Certo Agora, Errado Antes, de Hong Sang-soo
5. Visita ou Memórias e Confissões, de Manoel de Oliveira
6. Café Society, de Woody Allen
7. A Academia das Musas, de José Luis Guerin
8. Os Oito Odiados, de Quentin Tarantino
9. Julieta, de Pedro Almodóvar
10. O Filho de Saul, de Laszlo Némes

TOP 10 – LANÇAMENTOS 2016






































1. Café Society, de Woody Allen
2. Julieta, de Pedro Almodóvar
3. Demônio de Neon, de Nicolas Winding Refn
4. Amor & Amizade, de Whit Stilman
5. Ave, César!, de Joel & Ethan Coen
6. Mãe só há uma, de Anna Muylaert
7. Wiener-Dog, de Todd Solondz
8. Águas Rasas, de Jaume Collet-Serra
9. Rua Cloverfield, 10, de Dan Trachtenberg
10. Fogo no Mar, de Gianfranco Rosi

EMMY 2016 – OS VENCEDORES


Ontem foi a noite do tão esperado Emmy 2016. Como é bastante comum acontecer comigo, não vi quase nenhuma das séries indicadas/vencedores. E, mesmo assim, dentre as que vi, não conferi a temporada ou episódio pela qual foram indicadas. Fazer o quê? Fui anotando várias séries ao decorrer da premiação numa folha e vou tentar assistir elas. O bom é que muitas já estão na Netflix, e outras são produções originais da rede de streaming, facilitando mais ainda a minha busca. Agora alguns outros seriados eu vou ter que achar na internet. Bem, como eu já acordei meio sem tempo, aí vão, em rápidos comentários, alguns flashes e vitórias notáveis da noite de ontem.


 – A minissérie The People v. O.J. Simpson: American Crime Story levou 5 Emmys. Uma das vitórias de maior destaque da noite foi a da atriz Sarah Paulson, que havia sido indicada 6 vezes mas nunca tinha levado o prêmio. Parabéns, Sarah! Uma atriz exemplar e que merece todo o reconhecimento.

 – Na categoria de Melhor Série Dramática, não houve surpresa com Game of Thrones, vencedor da categoria do ano passado. A série também ganhou outros prêmios, como Direção e Roteiro em Série Dramática.

 – Para a alegria dos fãs, Rami Malek ganhou seu primeiro Emmy pela aclamada série Mr. Robot. O ator estava bastante cogitado para o Emmy, embora muitos não acreditassem que ele venceria. Parabéns, Rami!

 – A atriz Tatiana Maslany ganhou na categoria Melhor Atriz em Série Dramática por Orphan Black, uma vitória que foi celebrada avidamente pelos fãs e internautas durante a premiação de ontem, derrotando a favorita Viola Davis (How To Get Away With Murder).

 – Julia Louis-Dreyfus, de Veep, ganhou seu 5º Emmy consecutivo pela sua performance como Selina Meyer. Nenhuma atriz fez isso antes na categoria de Melhor Atriz - Série de Comédia. É seu 6º Emmy, o que faz dela a recordista da categoria, com mais prêmios da história da premiação. Um momento triste foi quando ela mencionou o pai dela, que faleceu nessa última sexta, falando do quanto ele apreciava o trabalho dela. Que dó...

 – Jeffrey Tambor ganhou Melhor Ator - Série de Comédia por Transparent. Até hoje não vi essa série ainda, acreditam? Foi legal ele mencionando a injustiça da indústria televisiva e o preconceito com os transsexuais. Ele fez um pedido, inclusive, para que os produtores dessem mais visibilidade ao talento trans. Muito bonito. A diretora do seriado, Jill Soloway, venceu na categoria de Direção - Série de Comédia.

 – Kate McKinnon ganhou na categoria de Atriz Coadjuvante - Série de Comédia por Saturday Night Live. Outra vitória bastante falada foi a do ator Louie Anderson, da série Baskets, onde ele interpreta uma mulher. 

 – Maggie Smith ganhou o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante - Série Dramática. Achei estúpida aquela piada do Jimmy Fallon com o fato dela nunca vir receber os Emmys que ganha. Isso, aliás, foi no começo da premiação. Quando ela conquistou o prêmio, ele apareceu do nada do palco e arrancou a estatueta dos apresentadores, soltando uma piada grotesca e estúpida. Não gostei nada. Até o público reagiu de maneira meio desconcertada. Talvez tenha sido o pior momento da noite. De qualquer forma, parabenizo a Maggie, uma atriz no mínimo excepcional, brilhante, talentosíssima, na série Downton Abbey.

 – A reação do Chris Rock perdendo o Emmy de Direção em Programa de Variedades foi hilária. Acho que ele não conseguiu "conter a emoção". Soltou um "what the fuck?" engraçadíssimo. Mas, também, desperdiçaram o prêmio dando para Grease: Live. Deveriam ter dado para a Beyoncé. 

 – Master of None, série do comediante Aziz Ansari, venceu o prêmio de Melhor Roteiro - Série de Comédia. Estou interessado em ver. Faz tempo que está na minha lista na Netflix, e nunca assisti.

Bem, até o próximo Emmy, e muitas séries pra vocês! 

sábado, 17 de setembro de 2016

Crítica: "MÃE SÓ HÁ UMA" (2016) - ★★★★


Achei que gostaria mais de Mãe só há uma. Talvez eu tenha exagerado ao pensar que veria algo do mesmo porte de Que Horas Ela Volta?, o sucesso de bilheteria e crítica de Anna Muylaert, um filme tão bom e marcante que acabou encabeçando a minha lista dos melhores filmes de 2015. E não que Mãe só há uma seja um filme menor ou ruim. Muito pelo contrário. É mais uma prova do talento e da competência de Anna Muylaert, certamente uma das figuras mais promissoras e influentes do cinema nacional contemporâneo. 

Mãe só há uma, assim como Que Horas Ela Volta?, trata de questões envolvendo a maternidade, como o próprio título talvez possa sugerir ou dar uma noção. É um filme um pouco mais provocador e intimista do que Que Horas Ela Volta? na abordagem de temáticas como sexualidade, preconceito sexual, família e conflitos da juventude.

Naomi Nero – cuja performance pode ser descrita como impecável – interpreta um jovem pansexual chamado Pierre que descobre que foi roubado na maternidade. A dita mãe do rapaz é presa e ele é separado de sua “irmã”, quem ele também descobre ser filha ilegítima da mulher. Nisso, ele vai morar com os pais verdadeiros, e não demora muito para que um clima de tensão e instabilidade entre eles se instale. A dificuldade em se adaptar à nova família e a respeitar os sentimentos dos pais verdadeiros e ao mesmo tempo a indignação pela prisão de quem pra ele é a sua verdadeira mãe sobrecarrega Pierre, que cada vez mais se sente confuso com toda essa situação. 

Ao mesmo tempo, a sensação que fica para o espectador é de que não tem pra onde correr. Os personagens não tem escapatória. Resta o conformismo? Ou a luta pela então “justiça” de ambos os lados? O filme foca nesse "combate" de perspectivas – a família verdadeira que buscou a justiça (recuperar o filho) por tantos anos e finalmente conseguiu, e a outra mãe injustamente presa (para Pierre, que ficou sob sua cautela e carinho materno, e é quem ele reconhece como mãe) – de maneira ao espectador não estar apto a desrespeitar ou punir esses pontos. Ninguém pode culpar Pierre por ter se aficionado à mãe ilegítima e nem à família real por ter cultivado a esperança de um dia reencontrá-lo, mas que não imaginava que esse reencontro traria tantos problemas. Aliás, a trama é inspirada no famoso “caso Pedrinho”, de um garoto que foi realmente sequestrado na maternidade, e que foi reencontrado pelos pais biológicos anos depois. 

A brincadeira envolvendo o título do filme e a representação das personagens maternas (Dani Nefussi interpreta as duas mães do filme, Aracy e Glória) expõe a ironia e a distinção de perspectivas dissecada ao longo de Mãe só há uma

Ao mesmo tempo em que é um debate em torno das temáticas abordadas, Mãe só há uma também pode ser considerado um filme que explora de perto seu personagem principal, neste caso Pierre/Felipe, e as indagações e aflorações da idade (neste contraponto, a revelação envolvendo sua suposta mãe vira uma representação da “juventude das descobertas”), a sexualidade, a revolta, os pensamentos, os sentimentos.

Ainda que Que Horas Ela Volta? tenha alguns momentos cômicos, o filme em si é predominantemente dramático. E se eram poucos os tais momentos de humor ou descontração, em Mãe só há uma são tão poucos, ou praticamente ausentes, que acaba sendo um drama. Mas não um dramalhão. Muylaert mais uma vez revela maturidade e compromisso ao assumir um trabalho dramático. Ainda não vi Durval Discos nem É Proibido Fumar, comédias anteriores da diretora, mas são trabalhos que foram bastante elogiados e parecem ser bastante interessantes de se ver. 

Há muita gente dizendo que com Mãe só há uma Muylaert tentou repetir e recaptar o sucesso de Que Horas Ela Volta?. Mas, na verdade, mesmo com a semelhança temática (a maternidade como foco) e genérica, ambos os filmes possuem muitas diferenças, algumas das quais já apontei em trechos acima. Que mania que esse pessoal tem de implicar com as repetições parciais, viu?

Até agora, Mãe só há uma está empatado com Boi Neon como o melhor filme nacional do ano. Lembrando que eu não vi outras estreias mais cogitadas e aclamadas, como Aquarius, A Frente Fria que a Chuva Traz ou Nise – O Coração da Loucura. Anna Muylaert é uma cineasta espetacular, e Mãe só há uma é mais um exemplar nato da força e da importância de seu cinema. De fato, o cinema nacional está numa excelente fase. 

Mãe só há uma
dir. Anna Muylaert - 

Crítica: "CAFÉ SOCIETY" (2016) - ★★★★½


Woody Allen está de volta, com um filme que pode ser muito bem considerado um seus trabalhos mais charmosos, elegantes, requintados e apaixonantes. Café Society possui um charme próprio, que conspira a seu favor. A beleza narrativa e visual dessa crônica amorosa ultrapassa e minimiza quaisquer falhas do filme em si, que na verdade são mínimas, imperceptíveis, ininfluenciáveis à qualidade e versatilidade deste. 

Café Society é o 46º longa-metragem de Woody (sem contar com Contos de Nova York). O longa foi selecionado para abrir o 69º Festival de Cannes em maio desse ano. É o terceiro filme do diretor a realizar esse feito. Os anteriores foram Meia Noite em Paris em 2011 e Dirigindo no Escuro em 2002. O filme Contos de Nova York, que tem um segmento dirigido pelo cineasta, também abriu o festival em 1989. 

Se alguns o celebram como o melhor filme do Woody em anos (o que é um pouco controverso, já que muitos afirmam isso levando em conta a “má fama” de projetos recentes anteriores do diretor, que foram tão mal-recebidos pela crítica/imprensa, o que acabou sujando a reputação desta que está sendo pintada como a “pior fase” do cineasta – algo que pra mim não faz o menor sentido – mas de qualquer forma a afirmação de jeito algum é errônea, não deixa de ser justa, levando em conta que este é realmente um marco da filmografia dele, um destaque, digamos), o público e os fãs ficarão surpresos em constatar uma fotografia magistral, completamente incomparável a outros títulos, e que pode ser tida como a grande preciosidade deste novo filme de Allen. No entanto, não é a única. 

Kristen Stewart, fabulosa e estonteante, brilha em uma de suas personagens mais belas, a jovem Vonnie, secretária e amante de um poderoso agente de Hollywood, Phil (Steve Carell). Ela é por quem se apaixona o sobrinho novaiorquino deste agente, Bobby (Jesse Eisenberg), que se muda para Hollywood na esperança de trabalhar com o tio no ramo cinematográfico. Vonnie fica divida entre Phil, seu grande amor, e Bobby, por quem também tem sentimentos, ainda que duvidosos. O triângulo amoroso toma rumos quase que inesperados, quanto a gente vê que o agente está realmente apaixonado pela mocinha, contrariando a expectativa de que aquele romance seria algo passageiro, e que Vonnie provavelmente seria iludida por Phil.  

O elenco também traz Blake Lively, no segundo ato, na pele de Veronica. Ela está fantástica, especialmente naquela cena belíssima onde o Bobby a leva para um barzinho de jazz de madrugada, um momento de luxo e prazer que deixa o espectador nas nuvens. Corey Stoll (o Ernest Hemingway de Meia Noite em Paris) interpreta um gangster barra-dura, irmão de Bobby, e dono da boate onde este passa a trabalhar na 2ª metade do filme. Parker Posey, que esteve no anterior, Homem Irracional, interpreta uma socialite renomada.

Café Society ostenta beleza, sofisticação e riqueza técnica. Woody Allen é o narrador desta vibrante e triunfal história de amor, que nos cativa e emociona, encanta e maravilha, a todo instante. Woody mais uma vez desfrui da magia, da formosura e da sublimidade dos anos 30 como plano de fundo desse conto apaixonado e embelezado, que esbanja primor e transborda grandiosidade. É um filme enfeitiçante, gostoso de se acompanhar e que não sai da nossa cabeça. 

O visual paradisíaco do filme (a fotografia saturada, em tons nítidos, esfumados) faz referência ao cinema daquela época; aliás, não só dessa maneira Woody faz questão de relembrar e recriar os tão maravilhosos e espetaculares anos 30 e o cinema desse tempo, mas também lançando várias e diversas referências à filmes, estrelas, estúdios, e etc., projetando todo um iconismo cinematográfico em torno do longa, com um olhar de admiração e respeito ao cinema e à cultura fílmica dos anos 30.

O mais interessante é que, mesmo com uma filmografia tão diversa, com filmes tão autênticos e completos, Allen consegue se reinventar em seu 47º longa-metragem e trazer um filme tão excepcional e original como Café Society, que no quesito qualidade está um passo à frente. O filme surge com uma premissa sutil e descomplexada que se aprofunda como uma meditação válida sobre a vida, a ilusão, o amor, o tempo e as virtudes nostálgicas. 

Woody arquiteta sua trama de maneira apaixonada e ao mesmo tempo conformista, sem necessariamente ser pessimista-cético. Cada vez mais, o diretor parece certo de enxergar na beleza, no amor e no humor um sentido para a vida, vida essa que ele tanto protestava ser sem sentido, incompreensível e irreal. E no fundo, a vida é tudo isso e mais. Mas não vale a pena viver pelo amor, ou pela beleza? Qual seria a “lição de moral” de Café Society, que termina de uma forma um tanto melancólica e vaga, mas com um toque embriagado de suntuosidade?

O certo é que mesmo o amor mais profundo e verdadeiro pode ser um grande mistério. Ninguém escolhe amar – ou ser amado, ainda mais. O coração age por si mesmo. Ele está pouco se fodendo para o que a nossa cabeça quer ou está pensando. Os nossos sentimentos estão à solta. Afinal, um rostinho bonito pode ser bastante atrativo (assim como também pode enganar), mas o caráter e a personalidade contam mais. Tratando-se de um filme tão visualmente impecável (o diretor de fotografia é Vittorio Storaro, o mesmo de clássicos como Apocalypse Now e O Último Imperador), me pergunto se Woody teria proposto essa coincidência de forma a sugerir ironia? De uma forma ou de outra, Café Society é um filme brilhante. Um dos mais bonitos e delicados que eu vi esse ano. Woody Allen faz 80 anos e o presente vai para o espectador: uma obra formal, magnífica, inteligente, poética, estilosa e cheia de glamour. Impossível resistir. Lindo do começo ao fim. 

Café Society
dir. Woody Allen - ★½

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Crítica: "A OUTRA" (1988) - ★★★★


Eis um dos filmes mais bergmanianos de Woody Allen, e também um de seus menos conhecidos trabalhos. A Outra é um filme excelente, que só alguém do escalão do Woody poderia realizar. Uma grande pena que tenha sido tão subestimado, já que é uma peça essencialmente importante da filmografia dele, por muitos motivos.

Num raro exercício dramático ininterrupto, ausente de piadas ou humor (o que até torna o filme um pouco mais “distante” do estilo ao qual estamos acostumados de seus filmes), Woody traz Gena Rowlands no papel de uma mulher que fica obcecada com uma paciente grávida (interpretada belamente por Mia Farrow) de um terapeuta que faz consultas em um apartamento ao lado do dela. 

A trama gira em torno da personagem de Gena, Marion, focando nas suas angústias, seus desejos, seus pensamentos e seu cotidiano – a construção e a exploração da personagem, sua personalidade e ideias intensificam e enriquecem a atmosfera bergmaniana do filme.  A narrativa, em especial, traz à nossa memória alguns trabalhos que demonstram algumas particulares semelhanças do Bergman, como Morangos Silvestres, Persona e até mesmo Face a Face.

O mais curioso deste filme de Woody Allen é a paciência, a delicadeza com a qual se costura a história, a profundidade dos personagens, a lentidão avassaladora, a atenção aos pequenos detalhes. A Outra é, sobretudo, um minucioso e intrigante estudo de personagem, e ao mesmo tempo filosófico e preciso, lento e rigoroso.

Vale comparar com outros filmes geniais do Woody, como o anterior Setembro (filme com o qual compartilha diversas semelhanças, seja no retrato rígido e frio dos personagens com tendência depressiva, digamos, ou na linha narrativa, que em ambos os filmes apresenta um forte resquício teatral em abordagem), Interiores (outro exercício dramático potente), Crimes e Pecados (revisto recentemente) e Maridos e Esposas.

Gena, Mia, Gene Hackman, Ian Holm entre outros estão espetaculares, em performances dignas e estelares, um elenco de fato excepcional. Interessante notar como A Outra é um filme, por vezes, melancólico, vazio, contemplativo, que parece emergir como um grito do fundo da alma. Não exatamente sombrio, mas obscuro, tenso, reflexivo em sua proposta. É um filme maravilhoso, atípico do Woody, e com uma grande influência do estilo fílmico de Bergman. Simplesmente ótimo. 

A Outra (Another Woman)
dir. Woody Allen - 

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Avante, Aquarius!



É, amigos... O inesperado (ou talvez nem tanto assim, de um ponto de vista mais pessimista/realista) aconteceu. Hoje, 12 de setembro, a comissão da Secretaria do Audiovisual revelou na Cinemateca Brasileira o filme selecionado para concorrer a uma das cinco vagas a Melhor Filme Estrangeiro no Oscar 2017. Para a nossa surpresa, o escolhido foi Pequeno Segredo, dirigido por David Schurmann, contrariando o que as expectativas indicavam -- que o filme Aquarius, do diretor Kleber Mendonça Filho (o mesmo do brilhante O Som ao Redor), seria o escolhido (um feito que para muitos já era tido como certeiro, uma vez da obviedade à concorrência). O longa, estrelado por Sonia Braga, estreou no Festival de Cannes em maio desse ano, onde foi elogiado pela crítica internacional & imprensa e aplaudido pelo público. O filme chegou aos cinemas nacionais dia 1 desse mês, e teve uma recepção bastante generosa e positiva. 

Não demorou muito para que os internautas exprimissem revolta e desapoio à escolha da comissão, que muitos afirmam ter sido "injusta" e "caluniosa". Eu ainda não vi Aquarius nem Pequeno Segredo, mas é mais que óbvio, falando de recepção, oportunidade e aclamação, que o mais preferível à indicação fosse Aquarius -- a nossa grande chance ao Oscar em anos, desperdiçada por puro orgulho e alvoroço político. E há uma razão bastante clara para isso ter acontecido. Em maio, durante a première de Aquarius em Cannes, a equipe e o elenco do filme protestaram com mensagens antes da sessão de gala do filme contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff, e expondo cruamente o caos político em que se encontra o nosso país nos últimos tempos. Devido a esse acontecimento, o filme foi atacado e virou alvo de várias críticas vindas de simpatizantes do golpe/impeachment e que se opunham à continuidade do governo da presidente eleita D-E-M-O-C-R-A-T-I-C-A-M-E-N-T-E e que não deveria ter sido de jeito algum retirada de seu mandato sob uma acusação ilegítima e incomprovada (qual é, CRIME DE RESPONSABILIDADE?).

De algumas semanas pra cá, a polêmica em torno de Aquarius ganhou proporções gigantescas. O diretor do filme Boi Neon, um dos favoritos ao Oscar, pediu para que o filme não fosse candidatado no intuito de dar a Aquarius uma visibilidade mais ampla. Mais recentemente, Anna Muylaert, a diretora de Mãe só há uma, outro favorito ao Oscar (seu filme anterior, Que Horas Ela Volta?, foi escolhido pela comissão do ano passado para concorrer a uma vaga), também fez o mesmo. E, ainda sim, Aquarius não foi o escolhido. Assim como a Dilma, Aquarius sofreu um golpe -- mais uma vítima do revanchismo político. 

A injustiça paira sob o céu do Brasil. O relevante, inclusive, nem chega a ser sobre ser indicado ou ganhar prêmio e tal, mas sim a questão da representatividade do cinema nacional e da democracia em si e da justiça para com o simbologismo cultural do Brasil, bem como o direito civil de protestar (não foram os protestos da equipe que levaram a toda essa balbúrdia?). O cinema, dessa vez, foi o palco dessa sacanagem ridícula. É uma palhaçada. Não há outra melhor definição para o que está acontecendo no Brasil atualmente. É uma grande de uma PALHAÇADA.

Agora, as chances do filme de Mendonça Filho receber sequer 1 indicação ao Oscar diminuem a zero. Será muito, muito difícil mesmo o filme ser indicado. Alguns cogitaram a indicação de Sonia Braga a Melhor Atriz (como eu mesmo descrevi no Twitter uma improvável "última esperança"). Penso comigo se talvez a Academia não se solidarize com toda essa polêmica em torno do filme aqui no Brasil e faça alguma justiça indicando o filme em alguma coisa. Mesmo se a gente for levar em conta essa ideia, a probabilidade ainda é muito pequena. 

Nos resta a conformidade? Nem pensar. O povo deve se opor, mostrar que é mais forte e mais poderoso que esse bando de corruptos e salafrários que governam a nação, que mais e mais vai se corrompendo, a democracia se apagando e a justiça esvaecendo, em meio aos protestos, às esperanças perdidas e ao embargo da verdade e do justo. Avante, Aquarius!


Então, a lista dos filmes selecionados para o Oscar ficou assim (so far):

Afeganistão: Parting (dir. Navid Mahmoudi)
Argélia: The Well (dir. Lotfi Bouchouchi)
Armênia: Earthquake (dir. Sarik Andreasyan)
Austrália: Tanna (dir. Martin Butler, Bentley Dean)
Áustria: Stefan Zweig - Farewell to Europe (dir. Maria Schrader)
Bélgica: The Ardennes (dir. Robin Pront)
Bósnia e Herzegovina: Death in Sarajevo (dir. Danis Tanović) *
Brasil: Pequeno Segredo (dir. David Schurmann)
Bulgária: Losers (dir. Ivaylo Hristov)
Croácia: On the Other Side (dir. Zrinko Ogresta)
Cuba: The Companion (dir. Pavel Giroud)
República Dominicana: Flor de Azúcar (dir. Fernando Baez Mella)
Egito: Clash (dir. Mohamed Diab)
Finlândia: The Happiest Day in the Life of Olli Mäki (dir. Juho Kuosmanen) *
Georgia: House of Others (dir. Rusudan Glurjidze)
Alemanha: Toni Erdmann (dir. Maren Ade) *
Hungria: Kills on Wheels (dir. Attila Till)
Iraque: El clasico (dir. Halkawt Mustafa)
Japão: Haha to Kuraseba (dir. Yoji Yamada)
Líbano: Very Big Shot (dir. Mir-Jean Bou Chaaya)
Luxemburgo: Voices from Chernobyl (dir. Pol Cruchten)
Marrocos: A Mile in my Shoes (dir. Said Khallaf)
Nepal: The Black Hen (dir. Min Bahadur Bham)
Holanda: Tonio (dir. Paula van der Oest)
Noruega: The King's Choice (dir. Erik Poppe)
Romênia: Sieranevada (dir. Cristi Puiu) *
Arábia Saudita: Barakah Meets Barakah (dir. Mahmoud Sabbagh)
Sérvia: Train Driver's Diary (Milos Radovic)
Coreia de Sul: The Age of Shadows (dir. Kim Jee-woon) *
Espanha: Julieta (dir. Pedro Almodóvar) *
Suécia: A Man Called Owe (dir. Hannes Holm)
Suíça: My Life as a Courgette (dir. Claude Barras)
Tunísia: The Life of Aleppo (dir. Ridha Behi)
Ucrânia: Ukrainian Sheriffs (dir. Roman Bondarchuk)
Venezuela: De Longe Te Observo (Desde Allà) (dir. Lorenzo Vigas) *

* candidatos de peso

Crítica: "FLORENCE – QUEM É ESSA MULHER?" (2016) - ★★★


O novo filme de Stephen Frears, Florence – Quem É Essa Mulher?, é relativamente parecido com outros trabalhos da filmografia do cineasta inglês: filmes com estruturas simplistas, tramas rasas – embora satisfatórias – e potencial narrativo. Não há nada em Florence que o público já não tenha visto em outros filmes semelhantes de Frears quanto à abordagem e riqueza técnica, tais como Sra. Henderson Apresenta, Chéri, Philomena, A Rainha dentre outros títulos. Ah, e é claro, a presença de uma grande atriz no papel principal. No caso de Florence, temos a lenda Meryl Streep, pela primeira vez trabalhando com Stephen Frears, numa atuação mais que memorável.

No filme, Meryl interpreta Florence Foster Jenkins (sim, a mulher do título), uma figura bastante famosa e popular da alta sociedade de Nova York e proprietária de diversos clubes de música – o grande amor de Florence. Seu marido, um ator inglês falido, é interpretado por Hugh Grant, que andou meio sumido das telonas, cujo desempenho aqui é excepcional, uma das melhores performances da carreira dele. Ele é quem cuida de Florence e a dá atenção a ela a todo instante, sendo ela, de saúde fragilizada, praticamente dependente dos cuidados e carinhos do homem, embora ele mantenha relações com uma outra mulher, mais jovem que Florence. 

Inspirada por uma ópera que a deixou bastante comovida, Florence decide treinar para começar a cantar – embora tecnicamente ela cante muito, muito mal. Incentivada pelo marido e pelas amigas, ela se entrega de corpo e alma ao seu sonho e se empenha em se transformar numa cantora de sucesso, embora muitas pessoas tirem sarro de sua voz. O pianista contratado por ela, Cosmé (Simon Helberg, ator da série The Big Bang Theory, numa atuação magistral) inicialmente acha graça da voz dela e da sua aspiração e força de vontade, mas, assim que se familiariza com os dramas dela e passa a conhecer a sua personalidade de perto, ele então percebe que esteve errado ao julgá-la. 

O filme prossegue num misto de comédia e drama, com momentos de emoção e de humor aflorados, enquanto acompanhamos o sonho e a jornada rumo à tão esperada “fama” de Florence, suas batalhas e desafios. O filme é, na sua grande parte, recheado de momentos engraçados, sequências histéricas e cenas descontroladas. A certo ponto, até parece que os atores estão improvisando, tamanha a descontração e espontaneidade com a qual os personagens se dialogam. E não é a primeira vez que um filme de Frears me passa essa sensação. Em Sra. Henderson Apresenta, que tem uma trama bastante semelhante à de Florence, também há essa impressão de que os diálogos são improvisados, saltados, naturais, desartificializando o roteiro, o que até chega a reforçar o clima teatral do filme.

O filme termina de uma forma especialmente melancólica, deprê – não vou dar spoilers – tudo o que posso dizer é que fiquei bastante tocado. Naquela cena final, percebi e compreendi de forma total os dramas verídicos de Florence, sua pena ao ver seu sonho ridicularizado, incompleto – um sonho ao qual tanto se dedicara, mas de nada recebeu em volta. É mais triste ainda se a gente for parar para pensar como essa síntese é comparável ao que acontece certas vezes na atualidade. A realidade é sempre mais impetuosa e dura que a ilusão. É uma verdade inevitável. Por mais que a gente tente, não dá pra escapar.

Interessante observar como o filme caracteriza o público de Florence, que inicialmente a apoia, mesmo percebendo as notáveis falhas e desacordes em sua voz, mas reconhecendo seu esforço e força de vontade, o que em um certo momento até sugere que muitas pessoas que a apoiaram e reconheceram se sentiram representadas. 

Ainda que seja um trabalho particularmente curioso e agradável da filmografia de Frears, Florence não deixa de ter suas parcelas de desapontamentos (as fraquezas e os furos do roteiro, diga-se de passagem). Mas é um filme OK ao meu ver. A fotografia consegue registrar diversos momentos de pura beleza e sensibilidade visual ao longo do filme – um ponto forte de Florence. A direção de arte, os figurinos, a trilha sonora e as performance sustentam a veracidade do retrato épico e conferem ao longa um astral sofisticado. No mais, é uma cinebiografia esperável, típica, previsível, sem muitas surpresas a se levar em consideração. O mérito recai ao elenco excelente e ao conjunto técnico.

Florence – Quem É Essa Mulher? (Florence Foster Jenkins)
dir. Stephen Frears - 

domingo, 11 de setembro de 2016

Crítica: "ÁGUAS RASAS" (2016) - ★★★★


De uns tempos pra cá, o espanhol Jaume Collet-Serra vem colecionando uma série de títulos respeitados e adorados tanto pela crítica quanto pelo público, reservando-lhe uma fama de prestígio dentre os cinéfilos e críticos de cinema, que andam vangloriando sua carreira e venerando seu talento promissor – o que é plenamente justo. Seu novo filme, o suspense Águas Rasas, marca mais um acerto em cheio desse diretor que a cada filme se supera e mais e mais revela ser um dos nomes mais potentes do cinema atual e do gênero suspense. 

Em Águas Rasas, Blake Lively (numa atuação de ouro – a provável melhor dela) interpreta uma jovem mulher que está de férias numa ilha caribenha e que decide ir surfar na praia onde sua mãe esteve quando estava grávida dela, algo que é carinhosamente simbólico para a moça, que tinha muita afeição pela mãe, já falecida. Após passar o dia surfando, ao entardecer ela fica sozinha no mar, até que é atacada por um tubarão feroz, que deixa ela bastante ferida e debilitada. Lutando pela sobrevivência, ela faz o que pode para buscar ajuda e se afastar do perigo. 

É simplesmente excepcional como o diretor consegue estabelecer um suspense crível e com tanta firmeza sem precisar de muito esforço ou se apoiar em artifícios discriminantes. A riqueza desse suspense sustenta a trama e os dramas da moça, seu desespero e sua esperança, sua força de vontade e ao mesmo tempo determinação, despontando para um possível contexto metafórico envolvendo um conflito entre a mulher e seu pai, ou até mesmo luto pela morte da mãe, alimentando a construção brilhante da personagem e da trama toda em si.

Nesse caso, a representação da história toda, do ataque e do sofrimento da moça, do isolamento, são esclarecidos, dando a ideia de que ela, uma mulher tão forte e indestrutível, teria sofrido um abalo tão grande pela morte de sua mãe, que esse evento teria exposto sua fragilidade emocional, um lado que ela provavelmente desconhecia de si mesma, e isso foi engrandecendo sentimentos contrários e dando espaço ao luto e à saudade.

Este é, ao meu ver, o melhor filme de Jaume Collet-Serra (levem em conta que não vi todos os filmes dele, entre estes os mais renomados, como A Casa de Cera ou A Órfã). Lembro que tinha gostado bastante de Sem Escalas, que vi recentemente, ainda que não tenha conferido Noite sem Fim, também com o Liam Neeson, que não foi tão bem recebido.

A semelhança destes filmes é a competência de Collet-Serra, em construir e elaborar tramas intrigantes e inteligentes, com as personagens principais atravessando momentos de reviravolta e intensa exposição emocional e física, mesmo que não tão óbvio, como aconteceu em Sem Escalas.  

O mais notável ainda é o fortalecimento desse estilo tão multifacetado dele. A cada filme, um sucesso, uma marca, uma história nova cheia de emoção e suspense, envolvimento e tensão. Ainda tem quem duvide de Jaume Collet-Serra? Creio que não. Quem o conhece de perto já tem confiança em seu trabalho e acredita no que faz. Águas Rasas, seu 7º longa-metragem, é mais uma prova da força e do poder de seu cinema. 

Águas Rasas (The Shallows)
dir. Jaume Collet-Serra -