De um texto arrasador vindo da poderosa mente de Stephen King, surge uma das realizações cinematográficas mais provocantes, mobilizantes e desesperadoras dos últimos tempos, um filme que dispensa limites e choca, demais. Aonde chegamos? É esse o nosso fim? O ponto final? Ou o recomeço? O Nevoeiro, sinistro, consegue traduzir os emblemas da nossa fraqueza diante dos momentos mais obscuros e instáveis. O Nevoeiro debate a nossa insegurança com nós mesmos e o mundo ao redor. Os inesperados rumos que os episódios tomam, e nossas ações, refletidas no tenebroso espectro da verdade. A nossa falta de esperança e confiança. A nossa salvação contrastada com a nossa perdição. É a vida, companheiros. O Nevoeiro faz questão de filmar nossos lados mais selvagens colocados em prova, a intimidade do medo e da fúria, e como diante da ameaça tudo pode mudar.
O filme começa aparentemente comum, com um sucessivo designer de pôsteres em trabalho, quando começa uma tempestade. No dia seguinte, tudo está destruído. Ele, o filho e o vizinho, com quem ele teve uma briga, vão até um supermercado para saber o que se passa. É lá onde o misterioso nevoeiro ganha destaque: todos são obrigados a permanecerem no interior do local até o fim de um turbulento nevoeiro que esconde gigantescas feras animais. As mortes, o desespero e a ausência de opções cresce, à medida em que a situação, num piscar de olhos, vira um caos.
O desenvolvimento de uma atmosfera perfeita também é plausível, e move o terror da trama, enquanto vai alimentando a nossa ilusão de que a história continua apenas ali naquele ponto, sem evoluir para nenhum outro sentido. É desconfortável circular nesse ar, e ao mesmo tempo fica impossível desgrudar os olhos da tela. Um clima muito convencional, mesmo com os quilos de efeitos visuais notavelmente artificiais que são inseridos nas cenas. A tensão é constante, de forma com que esse medo contagie fácil o espectador, horrorizado com a situação. Bum. O alvo é atingido.
A grande parte dos méritos de O Nevoeiro vai para um elenco mais que especial, formado por Thomas Jane, (a espetacular e inesquecível) Marcia Gay Harden, Laurie Holden, Andre Braugher, Jeffrey DeMunn, um elenco menos Hollywoodizado, talvez por opção do próprio diretor, como forma de desertar quaisquer comparação ou até mesmo recriar com exatidão o texto de King, inegavelmente muito bem adaptado por Frank, que presentou-nos com outros dois filmes vindos do trabalho literário de Stephen: Um Sonho de Liberdade e À Espera de um Milagre.
A trilha sonora de Mark Isham e a fotografia de Rohn Schmidt são contribuintes imprescindíveis na elaboração desse clima genial que constitui O Nevoeiro, uma experiência atordoante que mostra a nossa realidade e sobretudo, num final precioso e único, a verdade que tanto nos é vedada. Acordar é o primeiro passo. Quando menos se espera, nunca se sabe o que pode acontecer. Não somos nós que estamos no controle - nunca. O Nevoeiro é simplesmente memorável. Engana o espectador com o abraço, mas no fim revida com um doloroso, mas preciso, tapa na cara. O medo é capaz de qualquer coisa. Nós somos, quer dizer.
O Nevoeiro (The Mist)
dir. Frank Darabont - ★★★★