Enquanto meus problemas de locomoção me impedem de assistir a Que Horas Ela Volta?, decido ver outro longa nacional que também perdi na estreia, mas tive a oportunidade de ver hoje: A História da Eternidade. O que mais me surpreendeu neste que talvez seja um dos melhores filmes deste ano é a beleza de sua original simplicidade, que de fato é mais comovente do que eu já previa. A História da Eternidade chega com força em cima do espectador e nos pensar não só no mundo à nossa volta como também no mundo à volta daqueles personagens cujas abandonadas vidas tomaram diferentes rumos à medida que a história da eternidade era desenhada.
Se no fundo não é um filme tão inovador, A História da Eternidade bem que arranca e agarra nossa atenção, fazendo-nos vibrar diante da tela a todo instante. Certamente há clichês, mas em tudo há um propósito. Afinal, essa é a história da humanidade, e nela vale tudo. A quase-estreia de Camilo Cavalcanti, que dirigiu alguns curtas antes deste, certamente é digna de reconhecimento. Sua importância e extravagância são de uma notoriedade única e obrigatoriamente plausível. Cabe ao espectador buscar e investigar o sentido desta história trágica, estranha e permeada por ódio, confusão, vazio e desejo, que termina bem focada nesse quesito, deixando tudo à nossa mercê. Quem não souber apreciar esse mistério, essa particular característica do filme, perderá muita coisa.
O que é o tempo senão o regulador do nosso interesse, provedor da audácia e encurtador da esperança? O que é o medo senão nossa própria negação misturada ao preconceito? O que é a razão senão algo que soa coerente mas afundo não possui um significado autenticamente rente? O que é a ilusão senão a nossa fuga nem tão literal assim? O que é a história senão um conto disfarçado de antigo mas que não muda em nada caso comparado com certas situações de nosso presente fatídico e essencialmente melancólico, mesmo que certas vezes esse detalhe passe despercebido por nós? A História da Eternidade está aí pra isso. Tenta resolver e colocar em pauta a organização das emoções e o impacto delas através da nossa própria percepção de um mundo perfeito e da história perfeita. Pena que nem tudo, infelizmente, é perfeito, e na grande maioria das vezes a crueldade toma o lugar dessa perfeição - presente da ilusão.
O encorajador arbítrio poético que reina aqui merece destaque, afinal, ele também é dono das partes mais belas dessa história, e beira uma consolável sensação de colisão e atração. A História da Eternidade lida com a poesia de maneira aberta e sem muitos rodeios, apenas tentando nos guiar nesse seu caminho de difícil acesso e um fraco entendimento, para aqueles que não compreendem que o entendimento é construído aqui pelo público, e não pelo próprio filme. Nem tudo nos é dado mastigado.
Somos nós infelizes ou amorais? Somos nós heróis ou vilões? Pode parecer bizarro pra quem já viu, mas não há vilão nesta pura história de amor e direção. Apenas vítima e circunstância. O vilão é aquele que também faz falta. O vilão é aquele que é amado incondicionalmente e esperado, mas cuja presença chega a ser demoníaca. Bem como a vida. Bem como a eternidade.
A trilha sonora de Zbigniew Preisner, o mesmo que já trabalhou ao lado de diretores como Krzysztof Kieslowski, Thomas Vinterberg, Louis Malle e Agnieszka Holland, é desoladora e imortal. O clima que ela sustenta é devorador, pacífico, tímido e insistente: tudo ao mesmo tempo, acredite. Um elenco impecável, estrelado pelos ótimos Irandhir Santos, Marcélia Cartaxo e Débora Ingrid. Um roteiro soberbo, da autoria do também diretor Camilo. O que mais falta para esse obra? Vejam. Quem não viu ainda, não perca.
A História da Eternidade
dir. Camilo Cavalcanti - ★★★★
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