segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Avante, Aquarius!



É, amigos... O inesperado (ou talvez nem tanto assim, de um ponto de vista mais pessimista/realista) aconteceu. Hoje, 12 de setembro, a comissão da Secretaria do Audiovisual revelou na Cinemateca Brasileira o filme selecionado para concorrer a uma das cinco vagas a Melhor Filme Estrangeiro no Oscar 2017. Para a nossa surpresa, o escolhido foi Pequeno Segredo, dirigido por David Schurmann, contrariando o que as expectativas indicavam -- que o filme Aquarius, do diretor Kleber Mendonça Filho (o mesmo do brilhante O Som ao Redor), seria o escolhido (um feito que para muitos já era tido como certeiro, uma vez da obviedade à concorrência). O longa, estrelado por Sonia Braga, estreou no Festival de Cannes em maio desse ano, onde foi elogiado pela crítica internacional & imprensa e aplaudido pelo público. O filme chegou aos cinemas nacionais dia 1 desse mês, e teve uma recepção bastante generosa e positiva. 

Não demorou muito para que os internautas exprimissem revolta e desapoio à escolha da comissão, que muitos afirmam ter sido "injusta" e "caluniosa". Eu ainda não vi Aquarius nem Pequeno Segredo, mas é mais que óbvio, falando de recepção, oportunidade e aclamação, que o mais preferível à indicação fosse Aquarius -- a nossa grande chance ao Oscar em anos, desperdiçada por puro orgulho e alvoroço político. E há uma razão bastante clara para isso ter acontecido. Em maio, durante a première de Aquarius em Cannes, a equipe e o elenco do filme protestaram com mensagens antes da sessão de gala do filme contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff, e expondo cruamente o caos político em que se encontra o nosso país nos últimos tempos. Devido a esse acontecimento, o filme foi atacado e virou alvo de várias críticas vindas de simpatizantes do golpe/impeachment e que se opunham à continuidade do governo da presidente eleita D-E-M-O-C-R-A-T-I-C-A-M-E-N-T-E e que não deveria ter sido de jeito algum retirada de seu mandato sob uma acusação ilegítima e incomprovada (qual é, CRIME DE RESPONSABILIDADE?).

De algumas semanas pra cá, a polêmica em torno de Aquarius ganhou proporções gigantescas. O diretor do filme Boi Neon, um dos favoritos ao Oscar, pediu para que o filme não fosse candidatado no intuito de dar a Aquarius uma visibilidade mais ampla. Mais recentemente, Anna Muylaert, a diretora de Mãe só há uma, outro favorito ao Oscar (seu filme anterior, Que Horas Ela Volta?, foi escolhido pela comissão do ano passado para concorrer a uma vaga), também fez o mesmo. E, ainda sim, Aquarius não foi o escolhido. Assim como a Dilma, Aquarius sofreu um golpe -- mais uma vítima do revanchismo político. 

A injustiça paira sob o céu do Brasil. O relevante, inclusive, nem chega a ser sobre ser indicado ou ganhar prêmio e tal, mas sim a questão da representatividade do cinema nacional e da democracia em si e da justiça para com o simbologismo cultural do Brasil, bem como o direito civil de protestar (não foram os protestos da equipe que levaram a toda essa balbúrdia?). O cinema, dessa vez, foi o palco dessa sacanagem ridícula. É uma palhaçada. Não há outra melhor definição para o que está acontecendo no Brasil atualmente. É uma grande de uma PALHAÇADA.

Agora, as chances do filme de Mendonça Filho receber sequer 1 indicação ao Oscar diminuem a zero. Será muito, muito difícil mesmo o filme ser indicado. Alguns cogitaram a indicação de Sonia Braga a Melhor Atriz (como eu mesmo descrevi no Twitter uma improvável "última esperança"). Penso comigo se talvez a Academia não se solidarize com toda essa polêmica em torno do filme aqui no Brasil e faça alguma justiça indicando o filme em alguma coisa. Mesmo se a gente for levar em conta essa ideia, a probabilidade ainda é muito pequena. 

Nos resta a conformidade? Nem pensar. O povo deve se opor, mostrar que é mais forte e mais poderoso que esse bando de corruptos e salafrários que governam a nação, que mais e mais vai se corrompendo, a democracia se apagando e a justiça esvaecendo, em meio aos protestos, às esperanças perdidas e ao embargo da verdade e do justo. Avante, Aquarius!


Então, a lista dos filmes selecionados para o Oscar ficou assim (so far):

Afeganistão: Parting (dir. Navid Mahmoudi)
Argélia: The Well (dir. Lotfi Bouchouchi)
Armênia: Earthquake (dir. Sarik Andreasyan)
Austrália: Tanna (dir. Martin Butler, Bentley Dean)
Áustria: Stefan Zweig - Farewell to Europe (dir. Maria Schrader)
Bélgica: The Ardennes (dir. Robin Pront)
Bósnia e Herzegovina: Death in Sarajevo (dir. Danis Tanović) *
Brasil: Pequeno Segredo (dir. David Schurmann)
Bulgária: Losers (dir. Ivaylo Hristov)
Croácia: On the Other Side (dir. Zrinko Ogresta)
Cuba: The Companion (dir. Pavel Giroud)
República Dominicana: Flor de Azúcar (dir. Fernando Baez Mella)
Egito: Clash (dir. Mohamed Diab)
Finlândia: The Happiest Day in the Life of Olli Mäki (dir. Juho Kuosmanen) *
Georgia: House of Others (dir. Rusudan Glurjidze)
Alemanha: Toni Erdmann (dir. Maren Ade) *
Hungria: Kills on Wheels (dir. Attila Till)
Iraque: El clasico (dir. Halkawt Mustafa)
Japão: Haha to Kuraseba (dir. Yoji Yamada)
Líbano: Very Big Shot (dir. Mir-Jean Bou Chaaya)
Luxemburgo: Voices from Chernobyl (dir. Pol Cruchten)
Marrocos: A Mile in my Shoes (dir. Said Khallaf)
Nepal: The Black Hen (dir. Min Bahadur Bham)
Holanda: Tonio (dir. Paula van der Oest)
Noruega: The King's Choice (dir. Erik Poppe)
Romênia: Sieranevada (dir. Cristi Puiu) *
Arábia Saudita: Barakah Meets Barakah (dir. Mahmoud Sabbagh)
Sérvia: Train Driver's Diary (Milos Radovic)
Coreia de Sul: The Age of Shadows (dir. Kim Jee-woon) *
Espanha: Julieta (dir. Pedro Almodóvar) *
Suécia: A Man Called Owe (dir. Hannes Holm)
Suíça: My Life as a Courgette (dir. Claude Barras)
Tunísia: The Life of Aleppo (dir. Ridha Behi)
Ucrânia: Ukrainian Sheriffs (dir. Roman Bondarchuk)
Venezuela: De Longe Te Observo (Desde Allà) (dir. Lorenzo Vigas) *

* candidatos de peso

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