De uns dias pra cá desde a quinta-feira retrasada, 18 de junho, estreia deste longa imperdível, vi muita gente acusando injustamente a animação de "ruim" justamente pela falta de adequação da história para as crianças. Algo que me deixou muito desapontado, já que esse longa é uma das animações mais incríveis que eu já vi em toda a minha vida. E acredito que não estou sendo exagerado não, pois muita gente, ao contrário dos ignorantes que seguem a tradição que nunca existiu de que desenhos são só para crianças, vem achando Divertida Mente uma obra sensacionalmente singular, assim como eu a achei no fim da projeção. Por isso, deixo aqui um claro aviso: apesar das cores, dos personagens fofos e chamativos e de toda a atração que poderá comover a criançada bem antes delas assistirem o filme indicar, primeiramente, que este é um longa infantil, tal predição é totalmente errônea. Quem terá a chance de desfrutar mais da fabulosa experiência apresentada por essa animação serão os adultos, e também o pessoal da juventude, devido à alguns fatores que causam demasiada influência, cujos serão vistos daqui a pouquinho aqui.
A última vez que, sinceramente, uma animação da produtora Pixar me surpreendeu de verdade foi lá em 2009: Up - Altas Aventuras, dirigida pelo mesmo deste longa, o genial Pete Docter, que, além de ter mostrado grande talento e jeito pra coisa na animação vencedora do Oscar já citada, também tinha encantado meio-mundo no sucessivo Monstros S.A., longa que o lançou no mundo cinematográfico. Toy Story 3 me emocionou bastante e me deixou muito comovido, embora eu tenha tido mais apreciação por Up, que também chegou a me emocionar muito mais do que o terceiro filme da reconhecida franquia Toy Story. Mais uma vez, como lá em 2009, o talentoso Pete nos apresenta um trabalho de glória e imperdível, cujo apenas nos cabe agradecer e aplaudir incansavelmente.
Divertida Mente é capaz de nos deixar colossalmente sensíveis e pensativos. A trama exibe a jornada de uma menina de onze anos, chamada Riley, caminhando rapidamente rumo à adolescência enquanto se muda com a família para São Francisco. A mudança começa a ter profundo efeito na garota, que logo mostra-se insatisfeita com a transformação e passa a agir de maneira desnatural (como toda criança, obviamente, agiria), ignorando os pais, os amigos e tudo à sua frente. Enquanto isso, na cabeça da menina, suas personalidades, Alegria e Tristeza, que comandam as emoções da garota direto de sua mente ao lado da Nojinho, da Raiva e do Medo, acabam se perdendo devido à uma enorme confusão que as leva para um outro local da mente de Riley, nas ilhas e nas memórias. Enquanto tentam sair de lá, Riley passa por maus bocados no mundo real, e, em sua mente, o controle é assumido por um trio um tanto descontrolado e "difícil": a insistente Nojinho, o preocupado Medo e o inquieto Raiva.
Melhor trabalho da Pixar em anos, talvez bem desde Toy Story 3, Divertida Mente é um show delicioso que combina com excelência beleza e maturidade. Digo maturidade no sentido de que a história aqui nos contada, mesmo apresentando detalhes parcialmente infantis, nos trouxe uma mensagem bem mais forte, poderosa e importante por trás da apresentação. Talvez essa seja a primeira grande obra da Pixar que nos traga algo inovador na questão da reflexão e da mensagem. Anteriormente, os filmes da produtora bilionária da Disney traziam consigo histórias belíssimas, com mensagens que, na boa maioria das vezes, nos traziam algo valioso - isso, sempre - só que agora, em Divertida Mente, a mensagem vem propositalmente recheada com um conteúdo mais sério que, logicamente, crianças mais pequenas e inexperientes não terão a chance de se conectar, mas certamente os adolescentes e os adultos poderão.
Universidade Monstros, o último filme deles, lançado em 2013, abordava algo que também não estava dirigido ao público infantil. Valente, que eu gostei, mas que não é certamente o melhor projeto da produtora, tinha em sua estrutura algo de infantil, mesmo que tivesse trago consigo uma aptidão épica e musical que oferecia certo interesse nas crianças. Carros 2, a sequência ultrajante de Carros, poderia ter sido melhor feita e produzida. No entanto, difícil é discordar do fato invencível de que Divertida Mente é um dos filmes mais criativos já lançados pela Pixar. Simplesmente assim. A qualidade do roteiro escrito por Pete Docter, Meg LeFauve e Josh Cooley é inteiramente perfeito, o melhor já apresentado desde, confesso, o brilhante WALL-E, que ganhou minha aprovação principalmente por ter mostrado um conteúdo original e esteticamente maravilhoso e imaginativo, que me cativou e emocionou até o fim, algo que poderia ter tido mais recursos em Up, que apresentou um roteiro bem excêntrico, mas que apelou para o sentimentalismo, ainda que extraordinariamente com triunfo.
E, confesso que Divertida Mente é um filme que usualmente, durante a narração e o desenvolvimento da história, lembra a primeira concepção de A Viagem de Chihiro, brilhante obra-prima do japonês Hayao Miyazaki e meu filme de animação favorito. Docter listou a animação de 2001 como seu filme predileto. Não estou totalmente correto, apesar de fortemente acreditar que a jornada de Chihiro, que inicialmente estava toda zangada e triste por ter se mudado de seu aconchegante lar e sua escola para uma cidadezinha escondida no meio do nada, inspirou aqui a história de Riley criada por Docter em companhia do iniciante Ronnie Del Carmen, que se mudou de Minnesota para São Francisco por questões de trabalho de seu pai, tendo sido forçada a abandonar seus colegas e um time de hóquei, seu esporte predileto, algo que causa à Riley profunda irritação, a ponto da garota deixar de gostar do esporte por algum tempo em sua estadia na cidade californiana. No entanto, outro importante ponto do filme é deixar esclarecido que essa mudança tem profunda relação com a transformação de Riley de uma garotinha em uma adolescente, a partir de quando a Alegria (lá vem spoiler, se quiser pulá-lo é só ir para o próximo parágrafo) abandona em sua jornada de volta à "torre de comando" o amigo imaginário da Riley, quem ela, nessa fase de "amadurecimento", esqueceu.
E não é tão difícil se identificar com a Riley. Divertida Mente me fez refletir sobre minhas atitudes e seus efeitos em minha natureza, além das vezes em que eu mesmo me encontrei à beira do desastre em minhas tresloucadas crises de identidade e ondas de negatividade, apesar de que eu mesmo não seja nem um pouco semelhante à personagem em questão, já que minha personalidade encontra-se num nível bem mais problemático do que a da garotinha (risos). E é por isso que o filme nos causa demasiada nostalgia e identificação: não é preciso ser totalmente parecido com a Riley, em questões tanto fisica e mentalmente, para se assemelhar com ela. A situação de mudança/transformação atravessada pela menina se encaixa perfeitamente com momentos usuais de nossa vida nos quais tivemos nossa identidade colocada em prova.
Um dos principais medos desde quando foi anunciado o projeto era de que ele fosse muito "exagerado", "insensato", "imperceptível" e até mesmo "irreal", adjetivos e características que de jeito algum possam se adequar em alguma parte desta linda película, à exceção do último, porém no bom sentido, é lógico. Dotado de uma sensibilidade exímia, intensa inteligência e uma calorosa mensagem que nos deixa ao mesmo tempo deprimidos, nostálgicos e emocionados (risos), Divertida Mente é um longa que por si só é belamente inspirador e maravilhoso em todos os ângulos. Candidato ao top 5 dos melhores filmes já feitos pela Pixar, cujas obras sempre me causam encantamento e deleite, o filme é deliciosamente divertido e recomendável, além de ter conquistado uma extrema beleza técnica, que não nos é estranha vindas de uma equipe da Pixar (isso inclui a trilha sonora desnorteante do vencedor do Oscar Michael Giacchino, aqui mais uma vez imbatível).
Divertida Mente (Inside Out)
dir. Pete Docter - ★★★★★
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