Quem assistiu (ou assiste) a minissérie da Austrália Top of the Lake deve estar familiarizado com Garth Davis, que dirigiu alguns episódios para o trabalho em questão. O drama Lion: Uma Jornada para Casa, que recentemente abocanhou 6 indicações ao Oscar (inclusive em melhor filme) é o filme de estreia de Garth, e conquistou a todos com sua celebração amistosa e irregular da diversidade. Dos filmes da safra do Oscar deste ano, Lion é provavelmente o menos cotado dos títulos, muito embora não seja um filme ruim. Trata-se de um trabalho que efetua certos êxitos, mas no geral pode ser uma grande decepção se formos levar em conta seu potencial.
As acusações de que Lion copia (ou na maior parte do tempo o faz) Quem Quer Ser um Milionário? não são mentirosas não. Aliás, se tem uma coisa que me aborreceu em relação a este filme foram as referências baratas e copiosas ao filme de 2008. E, centralmente durante a primeira metade do filme, essas referências estão explícitas, nítidas ao extremo, e de uma maneira tão descarada que até dá a impressão de que o filme em si se vangloria em ser uma possível "sequência" de tão copiosas que algumas cenas são. É como se praticamente 50% do filme fosse imitação de Slumdog Millionaire.
Curiosamente, a substância dramática funciona de uma forma bastante delicada, capaz até de levar os espectadores às lágrimas em certos momentos dramaticamente inspirados. Por isso, a sessão de Lion chega a ser emocionante, entre outras coisas, até um certo ponto. Lá no fundo, trata-se de um filme simples, que não se assume assim e decide cultuar suas pretensões, daí surgem tantas irregularidades dentro do filme em querer ser um espetáculo de dramas mal-resolvidos e tramas esculhambadas. Chega a decepcionar, porque há uma história interessante por trás das artimanhas falhas de Garth Davis em compor um melodrama. No final de tudo, a essência é artificial, e Lion revela-se insustentável, para a decepção de quem esperava algo a mais.
Pra mim, é um filme que guarda sua importância, mesmo sendo tão irregular e, às vezes, exagerado. Hollywood tem demonstrado um enorme interesse em retratar as histórias ignoradas das sociedades de terceiro mundo. Só não o faz com a competência e o esmero que tal tarefa exige. As pretensões atropelam o significado por trás dessas histórias, o que esses filmes de fato querem dizer, expondo superficialidade e falta de compromisso. Um exemplo disso é Lion, que preserva suas intenções dignas, mas nada extrai delas.
A história verídica por trás de Lion chega a surpreender a quem não estiver informado de que tudo relatado aconteceu de verdade. É coisa que só filme faz mesmo. Um homem, adotado por uma família australiana na infância, anseia em reencontrar o irmão e a mãe depois de ter sido separado deles, pelo destino, quando ainda era criança. E a ferramenta dele é o Google Earth, vejam só! O desfecho talvez até seja previsível, mas ainda sim surpreende por estender um laço tão frágil entre a realidade e o produto narrativo. O final feliz, aliás, é muito mais verdadeiro do que poderia se imaginar em um filme tão razoável, digamos.
Pra mim é um filme ok. Nem mais e nem menos. Mas promete emocionar muita gente. Não acho que é tão grande assim a ponto de receber uma indicação ao Oscar de melhor filme, por exemplo. Dev Patel e Nicole Kidman mereceram suas indicações, mas estão longe de ganhar. Sunny Pawar, o ator mirim que interpreta Saroo, está realmente excelente. Ele sim merecia ser indicado, hein? Tinha gente que, até uns dias aí, estava apostando nele. Das indicações que eu já acho "extrapolar o limite" é em roteiro e fotografia. Aceitaria mais se o filme tivesse placado uma indicação em direção do que em fotografia. Eu, sinceramente, não consigo imaginar o filme ganhando em nenhuma das categorias às quais foi indicado. Trilha sonora, quem sabe? Pouco provável, mas, vai que.
Lion trabalha bem suas temáticas, apesar de falhar no retrato de seus personagens e na construção narrativa como um todo, mas que se sai consideravelmente bem por questões técnicas e, principalmente, pela força de um elenco imbatível. Superestimado, mas que tem seus valores. Não é o que eu chamaria de filme ideal, por um lado. E pra quem gosta de chorar no cinema, esse é o filme perfeito.
Lion: Uma Jornada para Casa (Lion)
dir. Garth Davis
★★★
★★★
Já Dev Patel entrega uma atuação concisa e emocional, digna de sua indicação ao Oscar. Se existe uma peça que não encaixa bem é a atriz Nicole Kidman interpretando a mãe australiana do protagonista. É interessante ver um filme que está baseado em fatos reais, acho que os melhores filmes baseadas em fatos reais são as melhores historias, porque não necessita da ficção para fazer uma boa produção. Também gostei muito de Dunkirk, não conhecia a história e realmente gostei. Parece surpreendente que esta história tenha sido real, considero que outro fator que fez deste um grande filme foi a atuação do ator Tom Hardy, seu talento é impressionante.
ResponderExcluir