sexta-feira, 22 de outubro de 2021

Jovem Mulher, Nas Garras do Vício, Soul, Diários de Otsoga e Pedregulhos

Jovem Mulher (2017)

O jeito como esse filme abraça a cativante protagonista por si só já faz ele valer a pena. Uma defesa muito alegre da espontaneidade dessa "jovem mulher". Dosch é o carro-chefe do filme, óbvio, e ela está ótima. É quando o filme abre espaço para observar as interações de Paula com os outros que vemos a sensibilidade de seu olhar, cômico, melancólico, tão fora da casinha quanto a protagonista. 

Nas Garras do Vício (1958)

É com um sentimento de coração partido que se assiste à trajetória de Serge, o motorista do caminhão que passa a maior parte do tempo bêbado, arrumando encrenca, um homem magoado e decepcionado, que espelha suas feridas interiores em atitudes autodestrutivas, o torna quase insuportável. A volta de um amigo de longo tempo só irá perturbá-lo ainda mais. A mulher está grávida, porém até a gravidez o deixa com desesperança, e isso se reflete no tratamento dele para com ela, que aceita em silêncio sua infidelidade, que atura sua indiferença. O cotidiano provinciano só é suportado com a ajuda do álcool. Há todo um suspense em cima da instabilidade de Serge e da compaixão de François, o amigo movido a ajudá-lo de todo jeito, mas é um suspense muito mais focado no estudo de comportamentos ao invés de uma determinada situação em si. O foco está no efeito que cada personagem tem sobre o outro. Um filme compreensivo em expor como os traumas são normalizados, transformados em banal. É quase como se fosse um segredo que Serge conta a François, um segredo da vida ali, ao comentar sobre a menina que ficou vulnerável a essa "normalidade". Uma das cenas mais expressivas de um filme tão atencioso a essa relação entre as dores que se internalizam, e as que se provocam.

Soul (2020)

Não é segredo que a Pixar faz animações muito populares para as crianças, geralmente lidando com temáticas universais para todas as idades, não apenas destinadas a esse público em específico. E Soul é talvez o filme do estúdio que mais possa ser lido como voltado mais ao público adulto que ao infantil, muito embora seja apenas uma presunção, porque o filme ainda sim é cativante e interessante às crianças, e há tantos outros filmes seus que assimilam uma mensagem mais universal, dirigida a qualquer pessoa de qualquer idade, sem desviar o foco desse público em específico. Poderiam haver riscos, mas a história é tratada com tamanha inventividade, que se passa por temas existencialistas, reflexões e questões bem mais adultas do que infantis, sem que se perca um equilíbrio, que rege o filme e permite que ele respire. É verdade que o filme parece reciclar ideias que já são praticamente familiares aos filmes da Pixar, mas o diferencial é que ele realmente está seguro do que quer transmitir, seguro dessa entrega a uma série de inovações e abordagens, e a competência dele é construir algo que não é nem muito sério e nem muito infantilizado, e está longe dessas duas definições. É um conto universal e existencialista. É uma viagem, no melhor sentido, e um abraço da vida. É muito bom ver os lugares aos quais a Pixar está se permitindo chegar.

Diários de Otsoga (2021)

A trilha é fantástica e Diários de Otsoga é uma experiência bem casual, leve, de uma filmagem que não deu certo na pandemia e seguiu uma direção diferente daquela prevista. É um filme que brinca com esse conceito de ser rodado em meio a restrições, na face de um evento sem precedentes e que acaba atrapalhando muitos dos planos e das intenções dos envolvidos. Mas a surpresa dele é que ele acaba funcionando sem precisar ir muito longe, sem ir fundo demais nesse contexto pandêmico, mas sim lidando com o que vai surgindo e deixando que o filme vá apenas absorvendo isso. Mas, logicamente, é um filme com um gosto bem particular, íntimo, e bem descontraído, como se tivesse sido feito para ser visto dessa maneira, "descontraidamente".

Pedregulhos (2021)

O andamento desse filme é muito expressivo, com muito pouco até. Ele faz as escolhas certas e trabalha muitíssimo bem esse andamento, pacífico, mas de certa forma muito ágil. Na trama, a relação de um pai (alcoólatra, explosivo) e filho ao longo de uma tarde muito quente, andando entre vilarejos. A maneira como ele se desenha a partir de sensações específicas (o deserto árido, as caminhadas) projetadas por suas imagens, a precariedade dos diálogos verbais, é também um indicador dessa atenção às imagens, a um contar de histórias baseado na expressividade da linguagem do filme. É árido, seco, ao capturar todas as tensões e a precariedade do contato, mas parece ser um filme que sempre busca por algo a mais, um completar, no meio disso tudo.

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