Sucesso em Sundance, indicado ao Oscar e aplaudido por onde passou, a aclamada estreia de Courtney Hunt como diretora e roteirista é uma agradável surpresa. Não pensei que um filme como esse me impactaria e comoveria tanto como foi. À primeira vista, a história, os elogios e a temática até dão uma dimensão de seu poder, mas o filme em si supera previsões ou qualquer tipo de expectativas. Sua importância é inimaginável. Sua potência é imprevisível. O resultado é fenomenal. Rio Congelado é um filme que você não pode perder.
O drama acompanha a jornada de Ray (Melissa Leo, na melhor performance de sua carreira), uma mulher com dois filhos, abandonada pelo marido cafajeste, que ainda por cima levou suas economias junto, deixando ela com um emprego meia-boca e lotada de dívidas. Certo dia, à procura do homem num bingo, ela acaba se deparando com o automóvel dele no estacionamento do local. Logo, ela descobre que o veículo foi achado por Lila (Misty Upham), uma índia Mohawk que trabalha com uma atividade bem perigosa: ela usa o carro para ganhar dinheiro transportando ilegalmente imigrantes do território canadense para dentro dos Estados Unidos por um rio congelado.
Interessante acompanhar o andamento do filme, que se apoia na sua delicadeza, na competência do elenco e no poder dos diálogos, capaz de nos chocar e convencer, provocar e instigar, sem o menor esforço, num bom sentido. Também é bem curioso como alguns momentos da trama são naturalmente regados a tensão e adrenalina, mesmo que em menor quantidade.
O filme deve ser encarado como uma dura crítica às irregularidades do sistema e aos valores sociais e padrões étnicos dos Estados Unidos nos dias de hoje. É uma denúncia ao "american way of life" em todas suas formas e aos problemas sociais que a maior nação do mundo enfrenta. Em uma certa cena de Rio Congelado, no melhor diálogo do filme, as personagens Ray e Lila estão conversando. Lila está discutindo os detalhes de como funciona o transporte dos imigrantes e tal, se eu não estou enganado, e quando Lila termina de descrever todo o percurso, Ray conclui: "Então eles fazem todo esse sacrifício só pra vir pra cá? Que vida de merda!".
Ao ver de Ray, a América já deixou de ser "a terra dos sonhos". A América talvez nunca tenha sido "a terra dos sonhos" como muitos veem. Pra ela, é completamente um absurdo os estrangeiros pensarem que a vida nos Estados Unidos é melhor, e que eles terão mais oportunidades na vida. Pra ela, não faz o mínimo sentido. E é exatamente desse jeito que Rio Congelado encara a nação americana: um falso sonho, uma falsa esperança. Por isso esse ponto no filme é tratado de forma tão crua, até abstrata, estranha pra nós.
A simplicidade cativa. O filme enaltece a sua proposta preservando diálogos ricos e preciosos. Ao contrário do que se imagina, Rio Congelado se equilibra nesse ritmo sem apelar para julgamentos, sem exageros.
Protagonista desse drama desolador, Melissa Leo entrega uma performance notável e excepcionalmente feroz, digna e plausível ao extremo. Sua personagem é uma mulher destemida e valente, como muitas cenas remetem. A interpretação dela é certamente a melhor coisa de Rio Congelado. Aliás, esta é a última atuação que confiro da categoria do Oscar de Melhor Atriz de 2009, e arrisco: é a melhor e mais poderosa performance do grupo. Pra mim, é a Melissa que merecia vencer. Se eu fosse da Academia, meu voto iria pra ela. Esse filme, esse desempenho é a prova de sua competência e talento. Além da categoria de Atriz Principal, o filme abocanhou outra indicação em Roteiro Original. Se fosse pra ser indicado em outra categoria, essa categoria deveria ser a de Atriz Coadjuvante, para Misty Upham, numa performance avassaladora, a grande revelação dessa exemplar obra do cinema independente que é Rio Congelado.
Rio Congelado (Frozen River)
dir. Courtney Hunt - ★★★★
O drama acompanha a jornada de Ray (Melissa Leo, na melhor performance de sua carreira), uma mulher com dois filhos, abandonada pelo marido cafajeste, que ainda por cima levou suas economias junto, deixando ela com um emprego meia-boca e lotada de dívidas. Certo dia, à procura do homem num bingo, ela acaba se deparando com o automóvel dele no estacionamento do local. Logo, ela descobre que o veículo foi achado por Lila (Misty Upham), uma índia Mohawk que trabalha com uma atividade bem perigosa: ela usa o carro para ganhar dinheiro transportando ilegalmente imigrantes do território canadense para dentro dos Estados Unidos por um rio congelado.
Interessante acompanhar o andamento do filme, que se apoia na sua delicadeza, na competência do elenco e no poder dos diálogos, capaz de nos chocar e convencer, provocar e instigar, sem o menor esforço, num bom sentido. Também é bem curioso como alguns momentos da trama são naturalmente regados a tensão e adrenalina, mesmo que em menor quantidade.
O filme deve ser encarado como uma dura crítica às irregularidades do sistema e aos valores sociais e padrões étnicos dos Estados Unidos nos dias de hoje. É uma denúncia ao "american way of life" em todas suas formas e aos problemas sociais que a maior nação do mundo enfrenta. Em uma certa cena de Rio Congelado, no melhor diálogo do filme, as personagens Ray e Lila estão conversando. Lila está discutindo os detalhes de como funciona o transporte dos imigrantes e tal, se eu não estou enganado, e quando Lila termina de descrever todo o percurso, Ray conclui: "Então eles fazem todo esse sacrifício só pra vir pra cá? Que vida de merda!".
Ao ver de Ray, a América já deixou de ser "a terra dos sonhos". A América talvez nunca tenha sido "a terra dos sonhos" como muitos veem. Pra ela, é completamente um absurdo os estrangeiros pensarem que a vida nos Estados Unidos é melhor, e que eles terão mais oportunidades na vida. Pra ela, não faz o mínimo sentido. E é exatamente desse jeito que Rio Congelado encara a nação americana: um falso sonho, uma falsa esperança. Por isso esse ponto no filme é tratado de forma tão crua, até abstrata, estranha pra nós.
A simplicidade cativa. O filme enaltece a sua proposta preservando diálogos ricos e preciosos. Ao contrário do que se imagina, Rio Congelado se equilibra nesse ritmo sem apelar para julgamentos, sem exageros.
Protagonista desse drama desolador, Melissa Leo entrega uma performance notável e excepcionalmente feroz, digna e plausível ao extremo. Sua personagem é uma mulher destemida e valente, como muitas cenas remetem. A interpretação dela é certamente a melhor coisa de Rio Congelado. Aliás, esta é a última atuação que confiro da categoria do Oscar de Melhor Atriz de 2009, e arrisco: é a melhor e mais poderosa performance do grupo. Pra mim, é a Melissa que merecia vencer. Se eu fosse da Academia, meu voto iria pra ela. Esse filme, esse desempenho é a prova de sua competência e talento. Além da categoria de Atriz Principal, o filme abocanhou outra indicação em Roteiro Original. Se fosse pra ser indicado em outra categoria, essa categoria deveria ser a de Atriz Coadjuvante, para Misty Upham, numa performance avassaladora, a grande revelação dessa exemplar obra do cinema independente que é Rio Congelado.
Rio Congelado (Frozen River)
dir. Courtney Hunt - ★★★★
Nenhum comentário:
Postar um comentário