Almodóvar está de volta com mais um filme
brilhante, daqueles de nos deixar ainda mais apaixonados pelo diretor e seu
cinema fascinante. Julieta é um filme
simplesmente sensacional, em todos os aspectos. Está longe de ser seu melhor
filme, mas certamente permanece entre seus trabalhos mais respeitáveis e
bonitos. Com autenticidade e firmeza, Almodóvar se reinventa e cria uma
história excelente sobre os dramas de uma mulher de meia-idade frente a seu
passado e sua relação com a filha distante. À sua maneira, Julieta é um filme original. Almodóvar trabalha seus personagens de
forma delicada e passional, conferindo charme e beleza a um drama profundo
sobre as marcas do passado.
A personagem do título, Julieta (interpretada
por Adriana Ugarte na fase do passado e Emma Suaréz na fase do presente) é uma
mulher amargurada, apesar de passiva, que toma coragem para escrever uma carta
para a filha que não vê há muito tempo. Enquanto ela escreve a carta, somos
redirecionados em flashbacks (um recurso que virou a marca registrada das
narrativas de Pedro Almodóvar) aos dias passados de Julieta, como conheceu seu
marido, sua relação com a mãe doente, a adolescência da filha, a amizade com a
mãe de uma amiga e etc.
O relato é casual, e à medida em que passamos
a acompanhar a jornada de Julieta, compreendemos seus dramas, suas angústias,
seus medos e suas vontades. Almodóvar nos entrega um estudo digno e intimista
dessa personagem que não dificilmente poderá ser identificada pelo espectador,
que talvez já tenha passado pelos mesmos dramas ou enfrentado situações
difíceis como ela. Ou seja, de uma forma ou de outra, Julieta pode ser visto como um filme universal. O espectador
enxerga as dificuldades dessa personagem e se colocar no lugar dela,
vivenciando a angústia e o peso de um passado fragmentado.
O filme ostenta uma beleza própria, algo
bastante particular do estilo kitsch de Almodóvar. Afinal, todos os seus filmes
são belos, seja no visual, seja na narrativa, seja nos personagens, seja na
trilha sonora. No caso de Julieta, é
um acerto em cheio. Trata-de se um filme belo, mas que também explora o lado
obscuro e trágico das situações, e essa transição, que às vezes nem é muito
aparente, é maravilhosa de se acompanhar.
O diretor de fotografia do filme é
Jean-Claude Larrieu. Aliás, essa é a primeira vez que Larrieu trabalha com
Almodóvar. Ele é famoso por ter trabalhado diversas vezes com a Isabel Coixet,
também cineasta espanhola. A fotografia lindíssima de Julieta, inclusive, é uma das melhores coisas do filme. O visual
acentuado, equilibrado, e embeleza as sequências dramáticas do longa. É um
espetáculo de beleza e cores discreto e admirável.
A trilha, mais uma vez de Alberto Iglesias, é
fantástica. E não é de hoje. Os filmes de Almodóvar sempre tiveram trilhas
muito bonitas e intensas. O que seria de Fale
com Ela, ou então o recente A Pele
que Habito sem a trilha sonora sempre exuberante e estremecedora de
Iglesias? Em Julieta, não foi
diferente. A trilha é algo marcante e simbólico para a narrativa e a caracterização
das cenas em si, e faz um belo par com a fotografia, igualmente deslumbrante.
As protagonistas Adriana e Emma estão em duas
performances inesquecíveis. As atrizes estão ótimas. Almodóvar prova, mais uma
vez, que é um dos melhores diretores de personagens femininas – se não for o
melhor, é claro –. Só ele consegue entregar personagens mulheres tão fortes e
distintas, e ao mesmo tempo fazer com que o público se sensibilize com ela e
seus perrengues cotidianos.
Enfim, Julieta
consegue ser um filme magistral, definitivamente um dos melhores desse
mestre que é o Pedro, a cada filme nos emocionando e reforçando a certeza
de que é um dos maiores gênios do cinema. Julieta
é um retrato desconcertante, poético e sensível de uma mulher abalada, em busca
de redenção. Muito bonito mesmo.
Julieta
dir. Pedro Almodóvar - ★★★★★
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