Festa da Salsicha é um caso à parte. Trata-se de um filme único, no sentido de ser até, em determinados momentos, revolucionário e inovador dentro de um gênero tão padronizado como a animação, algo exclusivamente notório em outras produções mais parecidas, como os polêmicos South Park: Maior, Melhor e Sem Cortes e Team America: Detonando o Mundo, ambos os filmes dirigidos por Trey Parker e Matt Stone, criadores da série South Park, outro exemplo nato de animação adulta dos tempos atuais.
O mais curioso dessas animações adultas é que, de uma forma ou de outra, elas sempre acabam nos escandalizando e chocando mesmo que seja por adereços tão banais e até comunais na vida real, como o uso excessivo de palavrões, seja em momentos de fúria ou de extrema alegria, o que demonstra que quase cegamente nós ainda estamos presos àquele velho estilo de animação, dirigido para o público infantil, filmes inocentes e despretensiosos. Automaticamente, nós estamos "acostumados" a essa fórmula repetitiva dentro do gênero, mesmo que isso não seja algo negativo, mas indica que o mesmo precisa urgentemente ser restaurado, pois não há nenhum equilíbrio. Por isso, esse desenho adulto engraçadíssimo vai deixar muita gente chocada e, provavelmente, nervosa.
Atualmente, as animações direcionadas para o público juvenil, por exemplo, vem crescendo como uma tendência, mas ainda tem muita gente que diz que "desenho é só para crianças", e cria limites para um gênero tão vasto e repleto de possibilidades. Festa da Salsicha, mesmo que seja um filme abarrotado de defeitos, não deixa de ser importante justamente por conta desse quesito. O filme envolve temáticas completamente adultas. Dá pra se dizer que é até proibido para crianças. Porém, eu creio que o público juvenil se encaixa na faixa do filme. Não é a melhor opção para esse tipo de espectador, mas é provável que vá render muitas gargalhadas em quem se submeter a vê-lo.
A premissa, sobretudo, é fascinante. Em um supermercado, alimentos falantes aguardam ansiosamente pelo momento em que serão comprados pelos "deuses" (nós, os humanos), sem saberem que na verdade o "grande além", quando eles saem do mercado, que eles tanto desejam é na verdade o fim de tudo, quando nós os consumimos.
No fundo, é um filme feito para se "levar na esportiva". Propositalmente, há ofensa de tudo quanto é lado, na intenção de não apenas chocar o público mas também de trazer uma perspectiva mais ampla do mundo em que vivemos, das conspirações e das mentiras que nos contam. Nos primeiros minutos, tudo corre bem, até que o filme queima seu filme quando ataca as religiões e as crenças, estabelecendo uma moral ateísta extremamente duvidosa, partindo para um lado mais sério, que quebra os limites do que então seria apenas uma brincadeira, e termina beirando o desrespeito moral e étnico, no cúmulo da imaturidade. Ainda sim, há acertos: o filme trabalha bem temáticas difíceis como diferenças raciais nos tempos modernos, influência religiosa, imposição social, manipulação e opressão.
No entanto, não há quem duvide de que é um dos filmes mais engraçados do ano. Provocativo e one-of-a-kind, trata-se de uma oportunidade rara de gargalhar até dizer chega (ou não) com o melhor desenho adulto dos últimos anos. Sacanagem à flor da pele, aqui não tem nenhum pudor mesmo. O roteiro é maravilhoso, cheio de sacadas geniais e referências precisas. Um exercício de liberdade de expressão tão genuíno e honesto que certamente merece destaque dentre os filmes de 2016. Aquela sequência da orgia das comidas é a melhor do filme inteiro.
Festa da Salsicha (Sausage Party)
dir. Greg Tiernan, Conrad Vernon - ★★★
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