sexta-feira, 1 de abril de 2016

Crítica: "CONSPIRAÇÃO E PODER" (2015) - ★★★★


E já estamos em abril. O ano corre rápido e a gente quase nem percebe. Isso deve ser coisa da idade. A gente quando vai ficando velho passa a enxergar o tempo de outro jeito. Mudanças, sempre me pegando de surpresa. A melancolia da nostalgia... Enfim, a gente deve ficar com a mente livre desses pensamentos senão o presente não valerá de nada. A questão é que eu estou indo ao cinema menos do que queria e estou tendo que conferir os lançamentos de casa (como é de costume), o que nem sempre me reserva o que uma sessão no cinema reservaria, por exemplo, mas isso nem sempre é um problema. O dinheiro não é muito (tenho que balancear as economias, que já são pequenas), e com essa história do retorno da gripe H1N1 a gente tem que se prevenir e evitar os centros (faço parte do grupo de risco e ainda nem tomei a tal da vacina). Mas, enfim, o tempo não para e eu mais e mais me pego chocado ao ver a enorme quantidade de filmes que tenho pra conferir (é realmente grande, não estou brincando). O jeito vai ser começar a ver é 3 filmes por dia. Só falta arranjar tempo.

Até uns dias atrás, Conspiração e Poder sequer tinha data de lançamento e título nacional, revelado há pouco. Foi lançado faz umas duas semanas, eu acho. Desde que foi anunciado, ano passado, o filme passou a ser apontado como um dos favoritos ao Oscar. E eu não acho que era possível duvidar do filme àquela época: James Vanderbilt, o roteirista do fenomenal Zodíaco, em sua estreia como diretor (não é desconhecido que a Academia tem um fraco por diretores estreantes -- Benh Zeitlin por Indomável Sonhadora em 2013, Tony Gilroy por Conduta de Risco em 2008, Rob Marshall por Chicago em 2003, Stephen Daldry por Billy Elliot em 2001, Sam Mendes e Spike Jonze por Beleza Americana e Quero Ser John Malkovich, respectivamente, em 2000, e por aí vai...), o elenco, o roteiro, entre muitas outras coisas. Conspiração e Poder não é exatamente um filme Oscarizado, mas faz o estilo dos filmes que o Oscar costuma abraçar e isso foi suficiente para chamar a atenção e ser uma das apostas recorrentes para o prêmio. Não foi indicado em nenhuma categoria, mas que tinha força isso eu não vou negar. 

James Vanderbilt nada mal para um diretor estreante, e caso fosse indicado acharia até merecido. Uma indicação em roteiro para Vanderbilt seria mais que merecida, mas, como aconteceu com Zodíaco, foi esnobado. A grandiosamente excepcional Cate Blanchett numa performance de ouro, que tinha tudo para levá-la ao Oscar e até, quem sabe?, ter a garantido uma terceira estatueta. Possível seria. Não vejo muita graça na atuação do Robert Redford, que aparece em poucos planos (a dona do filme é a Cate), mas do jeito que a Academia é se o filme tivesse sido mais promovido, era bem capaz dele ter aparecido em Ator Coadjuvante.

Conspiração e Poder constitui-se de muitas qualidades na abordagem e na reconstrução geral de uma história chocante quão essencial. Às vésperas das eleições presidenciais nos E.U.A. em 2004, a equipe do renomado programa "60 Minutes" montou uma reportagem em cima de um escândalo envolvendo o então presidente e candidato a reeleição George W. Bush, uma investigação acerca o paradeiro do passado de Bush, envolvendo desde polêmicas escondidas sobre a carreira militar do presidente até uma suposta conexão entre a família Bush e a família Bin Laden através de uma corporação, a Arbusto. 

É também bastante interessante acompanhar os bastidores da investigação e os contrapontos que vão atrapalhando a jornada dos repórteres e da redação na montagem da reportagem. Nesse meio, está Mary Mapes (Blanchett), uma sucessiva repórter que atuava como produtora do "60 Minutes" na época e que liderou a investigação e o trabalho por trás do caso Bush. A performance de Cate é certamente uma das melhores coisas de Conspiração e Poder. A australiana embarca na sua personagem com alma e razão, do jeito que ela é, adotando características e estabelecendo uma relação com o espectador. Muito estranho e injusto o desempenho dela ter sido tão descaradamente esquecido, por mais que ela esteja ainda mais fabulosa em Carol. Não vale indicar a mesma atriz por duas performances não?

Spotlight é melhor? É. Muito mais. Mas aí estamos entrando num outro território. Por mais parecidos que sejam, Spotlight e Conspiração e Poder possuem certas diferenças, algumas mínimas e outras significantes. A abordagem, a veracidade, a eloquência, o método, os simbolismos, o padrão, o andamento... E, ainda sim, são filmes que funcionam exemplarmente como odes ao universo jornalístico e à denúncia. Spotlight fica um pouco à frente nesse quesito, já que Conspiração e Poder assume um caráter mais informativo (e não que Spotlight não seja, mas acontece que o filme de Tom McCarthy trabalha plenamente tanto como filme informativo, reflexivo, carta de amor e denúncia, como quase nem sempre ocorre aqui); mesmo assim, são bem semelhantes nisso, sem dúvida.

O traquejo de Vanderbilt dentro da área roteirística é demasiadamente espetacular. Tomara que o roteirista prossiga em filmes desse patamar, delicados e astutos, e cultive em seu lado diretor as mesmas qualidades que sua face de roteirista demanda. Ainda veremos um filme dele chegar no Oscar, seja pela direção ou pelo roteiro, dessa forma.

Conspiração e Poder merece ser lembrado com um trabalho de peso, mais um da levada dos "filmes-denúncia", sendo, aliás, um exemplar nato do subgênero, mesmo que não reconhecido à altura. A competência de James Vanderbilt na direção e no roteiro e as atuações influentes de um elenco sensacional, liderado pela atuação digna de uma das melhores atrizes dos últimos (e todos os, so far) tempos, (a diva) Cate Blanchett. O Oscar errou feio ao ter deixado ela de fora. Conspiração e Poder é um exemplar seguro de qualidade e maturidade cinematográfica. Não percam.

Conspiração e Poder (Truth)
dir. James Vanderbilt - 

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