quarta-feira, 2 de março de 2016

Crítica: "SHERLOCK JR." (1924) - ★★★★★


Apesar da popular estrela, o lendário Buster Keaton, Sherlock Jr., curta-metragem de 44 minutos, não foi lá um grande sucesso comercial quando lançado, mas arrancou aplausos dos principais veículos de informação americanos na época, como os jornais The New York Times e The Washington Post. Este que é provavelmente o melhor e mais cômico e astuto trabalho de Keaton veio a ser valorizado com o passar do tempo. O interessante é que Sherlock Jr. é bem mais que um simples curta à primeira vista despretensioso. O filme, além de ser um dos projetos mais importantes da sua época, é uma completa revolução técnica e quão impressionante que ainda maravilha e fascina mesmo com quase um século de diferença. O primor dos detalhes, das estratégias e de um roteiro que mistura comédia e suspense com genialidade compõem Sherlock Jr., espetáculo cinematográfico do mais bem-feito. 

Um projecionista de um cinema de uma pequena cidadezinha ocupa as horas vagas no trabalho com a imaginação e a fantasia do universo policial, através de um pequeno livreto, um guia de detetive. O rapaz é um baita azarento e vive com os bolsos vazios. Certo dia, ele decide comprar um presente para a amada, mas logo é surpreendido por um galã charlatão que o incrimina injustamente e ganha a atenção da namorada do rapaz. No trabalho, o homem misticamente se infiltra na telona e passa a investigar uma dupla de espertalhões do filme em exibição. 

O deleite é inexplicavelmente gigantesco. Buster Keaton, gênio da comédia, fabricou uma autêntica pérola do cinema ao assumir a direção e o protagonista de Sherlock Jr. Não à toa o filme conquistou uma enorme legião de fãs e hoje é considerado um dos melhores filmes já feitos (e com razão). Os truques são de deixar qualquer um de boca aberta. Aquela cena da fuga, por exemplo, perto do final, é inesquecível de tão inacreditável e fabulosamente rica. Já que estamos falando de sequências impactantes aqui presentes, vamos lá, entre as melhores estão: a cena da sinuca, a cena final, a cena da fachada do cinema... Enfim, acho que todas as cenas de Sherlock Jr. são as melhores. Não consigo ver porque não. Que engraçado!

Sherlock Jr. inspirou Woody Allen em A Rosa Púrpura do Cairo, meu filme favorito do Woody, que narra a história de uma mulher infeliz durante a Grande Depressão, que é agredida pelo marido e cujo único momento de alegria na vida é quando vai ao cinema. Certa noite, após ir ver pela centésima vez o mesmo filme em cartaz, ela se surpreende: o grande herói do filme, encantado, sai da tela e foge com a dama. Embora não exista lá um diferença de enredo tão grande, muito embora existam certas diferenças significantes, A Rosa Púrpura do Cairo é, ainda sim, mais mágico. Posso até estar enganado, já que Sherlock Jr. é um filme excelente e fantasticamente exótico, mas é uma preferência bastante pessoal. Pode-se dizer que os dois tem em comum a qualidade: excepcionais trabalhos de vigor e grandeza. 

Sherlock Jr. é um filme glorioso. Buster Keaton é genial, em todos os sentidos. Pra fazer um filme desses inteligência, talento, força e paixão pelo que faz é o que não deve faltar. Afinal, não é todo dia que a gente se depara com clássicos desse patamar, a cada sequência admirável e mais e mais memorável. Sherlock Jr. é imperdível. Cinco estrelas chega a ser pouco para esse marco inovador e essencial. Afinal, é de fantasias e ilusão que faz-se a vida. Caso contrário, pra que viver? Pra que viver sem sonhar, minha gente? Eu ficaria desnorteado. Isso com certeza. Sherlock Jr. é, acima de tudo, sobre nossos sonhos, sobre o poder da nossa criatividade e da fantasia ilimitada, das nossas ambições obscuras e infinitas. Sonhar é viver. E viver é sonhar. Assim que é viver num mundo onde nada é demais. 

Sherlock Jr.
dir. Buster Keaton - 

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