Mommy, primeiramente, fascina por trazer ao espectador um novo olhar de um tema do qual já estamos demasiadamente cheios de ver em filmes ruins ou clichês. Por que eu fiquei tão impressionado ao assistir Mommy? É um drama competente, fiel, direto, imprevisível. Encara a realidade de frente e não cria subjeções ao que não é concreto. Mommy é um filme pé no chão. Quer ter esperança num lugar onde a presença dela nunca foi suspeita de existência. Oh, Mommy. Devem existir mais filmes como este, sinceramente. Filmes que trazem brilho por histórias que em nenhum quesito desapontam. Nem mesmo na trilha sonora, que combinou perfeitamente com o desfoque dos personagens principais e suas tristes vidas. E olha que costumo ser bem rígido quanto à isso.
Xavier Dolan brinca com a câmera em algumas cenas, o que é de notoriedade singular. O garoto (de vinte e cinco anos) tem talento para o cinema. Ainda o verei fazendo outras obras bem maiores (talvez) do que esta, por que garanto-lhes que capacidade ele tem. Dolan não tem medo de encarar a face da verdade contra a face da ilusão. Mommy marca uma nova fase na vida deste jovem cineasta. Uma fase de merecido reconhecimento. Uma fase, finalmente, matura. Dele só tinha visto Amores Imaginários, bem mais inferior à este. Afinal, já desconfiava desse fato. Quem é tão poderoso a ponto de dividir o prêmio do júri do Festival de Cannes com o lendário mestre Jean-Luc Godard? Pena que o Oscar é tão míope...
Ida, Mommy, Leviatã, Relatos Selvagens e Dois Dias, Uma Noite, dariam uma boa disputa. Realmente. À exceção de Ida, mostrado em Berlim, os outros quatro filmes foram exibidos em Cannes, o que mostra que o festival de cinema, fora de destaque nos últimos tempos, continua na ativa produzindo e elegendo grandes obras.
Mommy narra a conturbada jornada de Steve, um adolescente de quinze anos que sofre de graves distúrbios psicológicos, incluindo déficit de atenção, hiperatividade e transtorno compulsivo. Após passar por poucas e boas dentro de uma reabilitação, ele volta a morar com a mãe, Diane, uma mulher de bom coração e personalidade simpática, tentando fazer de tudo o melhor para re-acolher o filho, o que não é nada fácil. Mommy é um filme pesado, sim. Mommy quebra tabus. Tabus escondidos debaixo do tapete pela abusiva sociedade controladora universal. É bem triste, no fundo. Mas é o que mantém a tensão. E é a tensão que move conflitos em Mommy. Conflitos fortíssimos: pessoas problemáticas em situações problemáticas num lugar problemático governado por leis problemáticas... O mundo nunca foi normal. O filme quer assumir sua opinião de que o mundo é um lugar vazio, ruidoso, sádico e moralista, e que mesmo em um futuro (o filme, de 2014, se passa em 2015) tão próximo, ainda sim submete-se a um sistema horripilante. Tudo move-se num ciclo, que vai e vem, atravessa gerações mas pára no mesmo lugar. Nós não evoluímos. Apenas avançamos o período que supostamente serviria de base ao assunto discutido. Mommy é tudo isso. Mommy quer filmar a degradação do ser alinhado posicionalmente com a degradação do espaço. E, lógico, o que há melhor para suportar esse declínio do que um incomparável amor de mãe? Afinal, esta obra é toda delas. Mulheres dispostas a doarem suas vidas aos filhos. Mulheres que vivem caladas com o medo e o sofrimento por aquele que gerou. É um amor certamente indiscutível até aos mais meticulosos.
Mommy é uma grande obra. Existem certamente erros de marcação e alguns outros lugares deixados em branco. Nada significante ao impacto que Mommy provoca em seu público. Um impacto (glória!) real, um impacto vivo. Quase me esqueço de aplaudir o sensacional elenco. Anne, Antoine e Suzanne... Atores talentosíssimos!
Mommy
dir. Xavier Dolan - ★★★★
Nenhum comentário:
Postar um comentário