sexta-feira, 10 de julho de 2015

Crítica: "DIRIGINDO NO ESCURO" (2002) - ★★★


Enquanto aguardo impacientemente pela estreia de Homem Irracional, assisto a um dos longas mais engraçados e divertidos já feitos por Woody Allen: Dirigindo no Escuro, um filme fabuloso e extremamente memorável, além de ser um dos longas mais perspicazes feitos recentemente por Woody, que não só dirige e escreve o filme, mas também atua, impecavelmente, fazendo do longa uma pérola autêntica, que agora vale por três. 

Dirigindo no Escuro foi recebido com muitas críticas negativas em sua estreia em Cannes. Bem, o motivo de tais críticas negativas desconheço. Dirigindo no Escuro é sim um dos melhores filmes já feitos por Allen e uma de suas obras mais deliciosas. Minto ao dizer que desconheço o motivo. Talvez, o filme tenha sido mal-recebido devido às suas críticas que tiveram certa ligação ao 11 de setembro, um evento ainda quente à data da estreia do longa. Como o filme foi feito bem antes do acontecimento, tanto que é possível em uma das cenas, perto do final, ver as torres gêmeas de pé, foi um azar inesperado para Allen, já que no final (lá vem spoiler) ele faz uma crítica aos americanos quando seu filme faz um baita sucesso na França, e fracassou nos E.U.A., daí ele diz que "ama os franceses", se muda para Paris com a ex-mulher, e faz outros sarcásticos comentários que apenas não convieram à situação, mas deixaram o clima ainda mais negativo (na cabeça da crítica, deve ter sido: 'Woody Allen, que sempre idolatrou a cidade de Nova York, a troca por Paris no final de seu filme, logo em um momento tão necessitado como esse?'). Mas nada tão grave, se visto do ponto de vista cinematográfico. Apenas uma coincidência. Foi um azar acidental da parte dele o evento ter acontecido e a relação entre os americanos e os franceses terem se agravado tanto em um curto período de tempo. E, afinal, quem é que disse que os personagens de Woody Allen são Woody Allen? Bobagem. Sempre acontece coisas do tipo. Foi até bem irônico, pra ser sincero. Deixou o filme mais desafiador, de certo ângulo.

Mas, enfim, Dirigindo no Escuro é uma comédia sensível, que possui uma pitada de drama e que deixa o público anestesiado, praticamente. Não é um filme lá comum de Woody. Certo que é uma comédia, mas o lado emotivo da trama tem certo ressalto, mesmo que pequeno. E o filme ainda sim engraçadíssimo, deliciosamente romântico e inesquecível também serve de crítica ao mundo tresloucado e excessivamente comercial, como o mesmo protesta, de Hollywood. Vira e mexe a tela é preenchida por críticas geniais à cidade do cinema (bem, dizem né?), por exemplo: "Mande as flores para o Haley Joel Osment por seu prêmio do conjunto da obra" (essa eu ri pra caramba). 

Mas é coisa de Woody. Ele gosta de criticar, fazer sarcasmo. E aqui o neurotismo do protagonista é elevado ao nível máximo. Val Waxman, um velho cineasta que foi descartado de Hollywood há muito tempo, é convidado, graças à sua ex-esposa, para dirigir o remake de um filme de sucesso dos anos 40. Val, encurralado, aceita a proposta com vigor, ainda sim com um enorme receio de ter que trabalhar com a ex-mulher, que o largou há tempos atrás para viver com um outro homem: o mesmo que agora é produtor do remake. No entanto, tal receio, obviamente neurótico e desnecessário da parte de Val, não é nada à frente do que vem para ele. Pouco tempo antes do início das filmagens, Val, um hipocondríaco desvairado, fica cego, de repente, e ele fica louco, pensando que está com um tumor e que o projeto fracassará e ele nunca mais poderá voltar a dirigir alguma produção em sua vida. Com a ajuda de seu agente, Al, e do tradutor do diretor de fotografia chinês, ele é guiado no set de modo ao qual ninguém descubra sua cegueira temporária, psicossomática. 

O resultado é burlescamente cômico e espirituoso. Gargalhei demais. Não duvido muito que talvez seja um dos filmes, se não é "o filme" de Woody Allen que eu mais gargalhei. Gargalhar de gargalhar mesmo, já que muitos dos outros filmes de Woody contam com aquelas piadas mais entonadas, sarcásticas, irônicas, que apenas colocam em nossa face um risinho impressionado e emocionado, diferente daqui, onde a situação é duplamente sarcástica e também pastelão, algo que, cá entre nós fãs e fiéis cinéfilos que acompanham a carreira do diretor, não é muito a praia de Woody não, mas que funcionou, e prova a integridade e a competência desse homem absolutamente incomparável para com o humor. Mesmo que não seja lá um grande filme, ou uma obra magnífica e tal. Não discordo caso falarem que trata-se de um filme pequeno na filmografia de Woody. É sim. Tem erros? Muitos. Mas também tudo não é desastre. Afinal, nesse náufrago, o bote do humor é o herói. 

Dirigindo no Escuro (Hollywood Ending)
dir. Woody Allen - 

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