terça-feira, 10 de novembro de 2015

Crítica: "GUERRA DOS MUNDOS" (2005) - ★★★★★


É em filmes como Guerra dos Mundos que vemos o quão magnânima e interminável é a genialidade deste fenomenal carinha chamado Steven Spielberg, dono de uma filmografia de ouro, cobiçada, com certeza, por qualquer cineasta e adorada por todo tipo de espectador, do tímido mainstream ao mais cult possível. Pelo contrário do que se imagina, Hollywood passa por uma boa fase atualmente, que vem se dividindo em produções autênticas e tão cedo lendárias e sucessos de bilheteria que alimentam os grandes estúdios, sendo a boa parte destas últimas boas. Deixando de lado os podres do centro cinematográfico americano, é com certeza uma época de acertos, como eu disse tanto comercial quanto em qualidade. Guerra dos Mundos é um dos últimos melhores filmes que se destacam dessa fase e se encaixa duplamente em ambos os grupos, sendo o melhor filme do Steven fabricado na última década, o que é algo consideravelmente grande falando de um dos diretores mais importantes da história. E nós temos uma baita sorte por estarmos vivenciando não o auge, mas uma das fases mais produtivas dele, e também sucessiva, já que nenhum filme realmente ruim tem circulado por sua lista de realizações desde então. E será que Spielberg alguma vez já errou?

Parte de uma suposta trilogia pós-11 de setembro, segundo boatos idealizada por Spielberg no trio de filmes O Terminal, este e Munique, que estariam conectados à uma lógica, em cada filme diferente, conexão ao evento. Mas creio que, ao invés do Steven estar ao lado de um renegável patriotismo, tão afirmadamente contestado nestes três filmes, ele quer mesmo é explorar o frágil espírito da nação americana e o medo, a paranoia, instalados no país desde então, anos duros para qualquer dito americano, que desenvolveu uma trágica neurose quanto ao terrorismo após os fatídicos atentados, e um preconceito despontado pra todo lado ainda maior. É na humanidade e verdade de Guerra dos Mundos, na ambiciosa proposta de Spielberg em adaptar o clássico romance homônimo do H.G. Wells e no primor dessa obra que encontramos esta que é uma pérola cinematográfica única, recheada com entretenimento e uma grande intensidade, bem exposta nos efeitos visuais perfeccionistas e no som estremecedor, na fotografia desoladora do Janusz Kaminski, numa das melhores últimas colaborações com o mestre Steven.

O roteiro excelente escrito por David Koepp e Josh Friedman demonstra a mão boa que Spielberg tem para selecionar roteiristas dispostos e sempre estupendos, e também de proporção. O furioso clima apocalíptico grava no espectador uma frenesi eletrizante e tão claustrofóbica quanto a personagem de Rachel, filha de Ray Ferrier, que trabalha num porto e, ao voltar para casa, recebe a visita dos filhos que teve com a ex-mulher, Rachel e Robbie, e durante essa visita acaba recebendo outra visita maior: uma catástrofe alienígena caótica. Desesperado e imensamente confuso, sem acreditar no que testemunhou, a única saída de Ray é a todo custo garantir a segurança e proteção dos filhos, ainda que esse dependente cuidado acabe desencadeando em uma crise familiar gigantesca, principalmente tensionada entre o filho mais velho de Ray, Robbie, que quer ajudar no exército a combater as aterrorizantes máquinas de destruição vindas-de-outro-espaço, mas o pai bate o pé e não quer que ele vá. Ao contrário do que se imagina acerca desse encontro, que bem poderia simbolizar a re-união da família, há uma desavença ainda maior. Mas Spielberg monta bem a peça e guarda essa construção para um final um tanto "aliviador". Guerra dos Mundos, sendo a adaptação de um clássico magistral da literatura, reimagina esse universo com uma fábula original.

De forma a afastar os clichês viáveis a filmes-catástrofe e de destruição, Spielberg é minucioso na sua proposta e fabrica um marco na sua carreira, nem tão icônico quanto E.T. - O Extraterrestre, mas sutilmente próximo do status de um dos maiores clássicos do diretor (e com os extraterrestres de Guerra dos Mundos significantemente menos gentis, fofos e amáveis do que este, com o próprio diretor tendo contestado este filme o primeiro onde ele aborda os seres extraterrestres como malignos). Embora não seja lá o melhor do Tom Cruise, há certo destaque para a Dakota Fanning, ainda menina quando fez o papel, bem talvez o maior da sua carreira (favor não confundir com sua irmã, Elle Fanning, igualmente talentosa). Cada cena mais impactante e apocalíptica que a outra. Ambos Wells e Spielberg acertaram em Guerra dos Mundos. Uma história de caos e fúria, sensibilidade e família, coragem e desespero. Ray não é um herói. É um cara comum. Assim como todo aquele bando de gente, correndo destemida por cima do carro de Ferrier durante uma das cenas mais intensas do longa, mas depois que ele saca a sua arma, todos se afastam com uma enorme cautela. Todos ali não passam de gente comum. Gente como eu e você, que com certeza reagiria da mesma forma, sendo de um lado ou de outro. E quem é que tem, nessas horas, alguma moral para julgar o que é certo ou não?

Guerra dos Mundos (War of the Worlds)
dir. Steven Spielberg - ★★★★★

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