E lá vem Noah Baumbach de novo, ao lado da musa Greta Gerwig, dupla que no ano retrasado trouxe às telas Frances Ha, homenagem à Nouvelle Vague e que rendeu ao cineasta filas inacabáveis de elogios e estrelas. Com esse novo Mistress America, semelhante, mas nem tão aclamado quanto Frances Ha, é, de fato, um projeto interessantíssimo. Há muitos motivos para ser. Enquanto sinaliza o amadurecimento de Noah Baumbach num filme de autor, entra para a lista das exóticas crônicas cinematográficas do cineasta com aquele sutil toque de agilidade e simplicidade que sempre atraem a nossa graça e prazer. Enquanto não é maior que Margot e o Casamento e A Lula e a Baleia, Mistress America se iguala a Frances Ha: comédia com tons amargos de drama e romance mixados, ainda que timidamente explorados na trama; é mais uma versátil experiência proporcionada por Noah, preenchida por uma filosofia anedótica e uma lista de personagens excêntricos em situações esquisitas e, apesar de inusuais, carregadas por um ar naturalmente rotineiro.
Tracy está em transição, saindo da fase adolescente e migrando para a fase adulta. Nessa faixa, ela começa a então pôr em prática seu sonho de ser escritora, tomando como impulso inicial enviar uma história a uma organização literária da universidade onde estuda. Focada nesse objetivo, ela precisa de uma história inspiradora e desafiadora que ponha em teste os membros deste grupo e então a coloque nele. Ignorada uma vez, ela a tenta a sorte na história de Brooke Cardines, filha do noivo de sua mãe, carismática e descontraída figura que de longe traz aquelas idas da Frances Ha, embora exista uma certa distância entre a co-protagonista dessa história e a personagem-título do longa mais bem recebido de Baumbach. Brooke não fez faculdade, mas para quem nunca pisou os pés dentro de uma até que não é de se jogar fora. Ela é simplesmente uma daquelas pessoas faz-tudo. Pensando em abrir um restaurante, ela também é professora particular, trabalha numa academia com treinamento de ciclismo e é também cozinheira amadora, o que entra no currículo de dona de restaurante. Nesse cenário, é que vemos o decolar de conflitos entre Brooke e Tracy, uma amizade fraternal arrasada pelos reflexos da realidade. Enquanto uma sobe, a outra desce, sem aceitar essa decaída quase irreparável, é claro. Enquanto uma tem a vida toda pela frente e faz desse trajeto uma trilha de ouro já do início, a outra faz planos meramente dificultosos, está em uma idade mais avançada e está inteiramente desprovida de algum futuro produtivo. No entanto, as duas estão trajando o mesmo figurino de declínio emocional. Cair na real é o que traz à tona a desenfreada rebeldia e ausência de sintonia nessa relação. De alma, Brooke e Tracy são gêmeas.
O ritmo acelerado da trama, com personagens entrecortando conversações com novos tópicos e enriquecendo a gama de ilustrações nos excepcionais diálogos, é de uma excelência indispensável, tanto para o tipo de história apresentado quanto para o sentido para o qual ela aponta, isso é, sem ter necessariamente uma edição fujona e pretentada por intervalos. A lógica dessa narrativa combina bem com os traços ávidos do elenco, principalmente da Greta Gerwig, que, além da personagem já tagarela, a porta com ininterruptas falas que aumentam a divisão do espectador em ler as legendas ou apreciar as cenas. Quer dizer, a Greta também é autora do roteiro, ao lado do Noah, o que talvez explique a motivação feminista presente nas duas protagonistas, feitas por Greta e Kirke. Mistress America entra para a lista ainda embrionária das grandes atuações da Greta Gerwig, que tem momentos ótimos neste elétrico papel, e colaborações entre a moça e Noah Baumbach, namorados na vida real. Mistress America é engraçado e também derrotista, organiza bem a avalanche de emoções que é, sem sobrecarregar o elenco e cometer inibições. É um belo trabalho. Diverte. Os diferentes ângulos adentro as relações humanas com o olhar crítico, autêntico, irônico e simpático de Noah e Greta é a marca desta perceptiva obra, entusiasta de um humor ácido, ora agitante ora deprimente. E viva o cinema independente, fellas!
Mistress America
dir. Noah Baumbach - ★★★★
Tracy está em transição, saindo da fase adolescente e migrando para a fase adulta. Nessa faixa, ela começa a então pôr em prática seu sonho de ser escritora, tomando como impulso inicial enviar uma história a uma organização literária da universidade onde estuda. Focada nesse objetivo, ela precisa de uma história inspiradora e desafiadora que ponha em teste os membros deste grupo e então a coloque nele. Ignorada uma vez, ela a tenta a sorte na história de Brooke Cardines, filha do noivo de sua mãe, carismática e descontraída figura que de longe traz aquelas idas da Frances Ha, embora exista uma certa distância entre a co-protagonista dessa história e a personagem-título do longa mais bem recebido de Baumbach. Brooke não fez faculdade, mas para quem nunca pisou os pés dentro de uma até que não é de se jogar fora. Ela é simplesmente uma daquelas pessoas faz-tudo. Pensando em abrir um restaurante, ela também é professora particular, trabalha numa academia com treinamento de ciclismo e é também cozinheira amadora, o que entra no currículo de dona de restaurante. Nesse cenário, é que vemos o decolar de conflitos entre Brooke e Tracy, uma amizade fraternal arrasada pelos reflexos da realidade. Enquanto uma sobe, a outra desce, sem aceitar essa decaída quase irreparável, é claro. Enquanto uma tem a vida toda pela frente e faz desse trajeto uma trilha de ouro já do início, a outra faz planos meramente dificultosos, está em uma idade mais avançada e está inteiramente desprovida de algum futuro produtivo. No entanto, as duas estão trajando o mesmo figurino de declínio emocional. Cair na real é o que traz à tona a desenfreada rebeldia e ausência de sintonia nessa relação. De alma, Brooke e Tracy são gêmeas.
O ritmo acelerado da trama, com personagens entrecortando conversações com novos tópicos e enriquecendo a gama de ilustrações nos excepcionais diálogos, é de uma excelência indispensável, tanto para o tipo de história apresentado quanto para o sentido para o qual ela aponta, isso é, sem ter necessariamente uma edição fujona e pretentada por intervalos. A lógica dessa narrativa combina bem com os traços ávidos do elenco, principalmente da Greta Gerwig, que, além da personagem já tagarela, a porta com ininterruptas falas que aumentam a divisão do espectador em ler as legendas ou apreciar as cenas. Quer dizer, a Greta também é autora do roteiro, ao lado do Noah, o que talvez explique a motivação feminista presente nas duas protagonistas, feitas por Greta e Kirke. Mistress America entra para a lista ainda embrionária das grandes atuações da Greta Gerwig, que tem momentos ótimos neste elétrico papel, e colaborações entre a moça e Noah Baumbach, namorados na vida real. Mistress America é engraçado e também derrotista, organiza bem a avalanche de emoções que é, sem sobrecarregar o elenco e cometer inibições. É um belo trabalho. Diverte. Os diferentes ângulos adentro as relações humanas com o olhar crítico, autêntico, irônico e simpático de Noah e Greta é a marca desta perceptiva obra, entusiasta de um humor ácido, ora agitante ora deprimente. E viva o cinema independente, fellas!
Mistress America
dir. Noah Baumbach - ★★★★
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