domingo, 20 de dezembro de 2015

Crítica: "SICARIO - TERRA DE NINGUÉM" (2015) - ★★★★


O canadense Denis Villeneuve, um dos mais promissores cineastas dos últimos tempos, retorna ao circuito nacional em um ano e poucos meses com um projeto tão ambicioso e intrigante quanto o anterior, muito embora este aqui não seja tão complicado como o longa em questão, O Homem Duplicado, seguido pelo antecessor Os Suspeitos, outro difícil enigma. O nome do filme é Sicario - Terra de Ninguém. Desembarcou cedo nos nossos cinemas, mas sua estadia foi curta demais, é tanto que quase ninguém comentou sobre ele (no círculo de blogs, posso contar nos dedos), e na minha opinião merecia sim um reconhecimento maior e mais adequado comparado ao que recebeu. 

Já considerado o melhor filme do Denis, Sicario tem razão em sê-lo: é uma obra desnorteante, triunfal e eletrizante. Confesso que poucos filmes vistos ultimamente, não só nesse ano pra ser mais detalhado (ou não), me fizeram temer com pânico tanto silêncio e barulho, resultado do trabalho magnífico por trás de sua sonoplastia, estremecedora. 

Em Sicario, Emily Blunt (aqui infelizmente enfeiada por Denis em prol da montagem de sua personagem) interpreta a agente da FBI e especialista em sequestros Kate Macer, uma mulher à beira de uma crise, que passa metade do filme com cigarros na boca, tremendo, confusa segurando uma arma sem saber o que fazer, toda insegura. Esse estado dela se agrava quando ela é enviada para fazer parte de uma missão especial, uma vez que ela foi bem-sucedida numa missão no Arizona envolvendo a prisão de membros do cartel de drogas mexicano, e nisso fica insatisfeita com as manobras ilegais de dois agentes do governo, que lideram essa missão para a qual ela foi selecionada, interpretados genialmente por Benicio del Toro (sublime, sublime, mil vezes sublime) e Josh Brolin. Os homens, aptos do caráter "certinho" de Kate, a usam como isca e passam a vetar as reais intenções dessa operação a ela. 

A primeira parte do filme é totalmente dominada pela personagem Kate Macer, principal, mulher sofredora, que se finge de fria mas tem um coração mole, mas que fica desorientada com a mudança de ares na sua ida ao México. Mas, com o aproximar do final, é Alejandro (Benício del Toro), misterioso integrante dessa operação, que vai tomando conta da nossa atenção e interesse, muito principalmente pela história de vida dele e os rumos que o longa toma a partir dos últimos trinta minutos, intensamente reveladores. É essa parte final que é marcada pela atuação cheia de pontos fortes do Del Toro, alado seu personagem decisivo. 

Muito embora o filme seja decorado por tiro, porrada, bomba, cadáveres, tortura, sangue e tensão, puramente falando, pensei que ficaria mais chocado. Ou é o filme que não é tão impactante no quesito violência, ou eu já vi de tudo nesse mundo, ou sou eu que ando criando expectativas altas demais. O que acontece é que, no objetivo de preservar a visão da agente Kate Macer, mesmo quando ela não está no controle da narrativa, a lente do Denis filma timidamente a carnificina ao redor como se estivéssemos ali como a Kate Macer, experienciando sustos e vivendo o medo, sem direção e sem saída. 

A cena de abertura, com a Kate na missão no Arizona, uma cena terrivelmente pavorosa, e a do engarrafamento, são as melhores do comecinho, já que a partir daí as coisas não melhoram em nada pra ela. A tensão só se intensifica com a chegada do Alejandro, que já desperta em nós uma braba curiosidade. E esta é bem vinda quando o passado do personagem é cheio de altos e baixos. Impressionante. A partir da cena onde os agentes invadem o túnel sob a fronteira Estados Unidos-México, só vem coisa boa. Acho que todas as sequências nascidas após esta merecem ser destacadas aqui. 

E, ainda que seja um filme de ação, há uma quantidade consideravelmente grande de cenas envolvendo diálogos e discussões entre alguns dos personagens, cenas bem menores do que as grandes sequências, mas que contribuem para a fermentação da trama e o entendimento acerca a missão da qual Kate está envolvida. É na sequência anterior ao final que vemos um bom exemplo de uma cena de ação sem ação, onde apenas rola diálogo, mas a tensão mantém-se presente o tempo inteiro. E, mesmo que seja uma cena curta, é assustadora.

Por isso, quando dizerem que Sicario é um suspense, vou concordar. Assim como é também terror. E ação. E drama, um pouco. Às vezes, nem sempre seguir regras é a melhor forma de propagar a justiça. A lei cega a justiça - lei nem sempre é. Denis nos convida a um desafio moral sobre vingança, direitos e história, e o quão longe o ser humano pode chegar para conquistar a justiça. Falando em história, Sicario - Terra de Ninguém é um ótimo filme para se discutir a relação entre México e Estados Unidos atualmente, bem como também há pontos de discussão envolvendo a história em si, que o filme gera, começando lá na abertura, quando há a explicação do termo "Sicario". 

O diretor de fotografia de Sicario é Roger Deakins, mais uma vez realizando um trabalho simplesmente impecável, que tonaliza bem a escuridão quase onipresente do filme, tons bem sólidos e a ausência de cores quentes, vivas, em todos os sentidos que a definição pode vislumbrar. Estamos falando de um dos diretores de fotografia mais importantes dessa geração e do cinema, possivelmente, que já trabalhou em inúmeras obras de potente mercado visual, exemplificando algumas das mais recentes: Os Suspeitos (do Villeneuve), 007 - Operação SkyfallO Leitor Onde os Fracos Não Tem Vez. Por favor, peço que vejam. Não percam Sicario. Já um milagre o filme ter chego a tempo, se deixarem passar essa oportunidade. Assistam a um dos filmes mais... mais... indescritíveis de 2015. A cinefilia gentilmente os agradece.

Sicario - Terra de Ninguém (Sicario)
dir. Denis Villeneuve - 

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