Finalmente! Apenas começo a desfrutar da minha almejada temporada de férias, que iniciou nesta glorificada semana, com um sorriso quilométrico estampado na cara e uma lista vergonhosa de filmes ainda não visto que devem ser conferidos até o cessar de 2015. Cara, vou te contar, chegou a tempo. 2015, nas questões de ofício, foi um ano pra lá de cansativo. E não tem jeito melhor de iniciar essa folga com uma comédia engraçadíssima, pra lá de extasiante e burlesca, certamente uma das melhores desse ano. Primeiro filme (realizado para distribuição cinematográfica) do cineasta americano Peter Bogdanovich em 14 anos (desde O Miado do Gato), Um Amor a Cada Esquina é um jeito leve e classicista de voltar à ativa selecionado pelo cineasta - que não melhor poderia fazê-lo - sem mencionar que é pura diversão, em todos os aspectos, e bem refinado. Trata-se também da evidência de um forte guarnecido do Peter: o roteiro, que há tempos não é visto tão bem trabalhado e desenvolvido, muito embora falhas estejam expostas. E só aumenta as expectativas quanto ao próximo longa dele, One Lucky Moon, western previsto para 2017 estrelando Cybill Shepherd.
Não tenho muito o que reclamar de Um Amor a Cada Esquina. O que importa é que há uma porrada de elogios para fazer. Falhas é o de menos - felizmente. Comédia escrachada, Um Amor a Cada Esquina retrata o efeito do fantástico no ser e a transformação da ilusão em realidade, com direito a teorizações terníssimas acerca dessa evolução, ditadas pela personagem Izzy, atualmente atriz de cinema que está dando uma entrevista, e que recorda do seu passado e o que sequenciou sua ascenção à nata do mundo das celebridades. Outrora sofisticada e sonhadora garota de programa, a hoje Isabella Patterson, nas idas de um encontro com um renomado diretor de teatro, Arnold Albertson, vê seu desejo se realizar misticamente com a frenesi romântica de Arnold, que a garante um cachê de trinta mil dólares naquela mesma noite, com o diretor a humanizando, e apenas a prometendo a grana caso ela parasse de seguir com aquela vida e então rumasse seus sonhos.
O que desencadeia essa primeira parte preenchida por ludíbrios devaneios românticos pode parecer suave para que a precede. Os amargos e pseudo-sérios personagens que vão tomando conta da tela e da trama após os delicados momentos iniciais reverte automaticamente o senso de parcimônia cômica e enaltecimento romântico que tanto parecem dar vida ao filme, muito embora esse teor não seja praticamente dizimado. O mais incrível de toda essa rebobinagem ao não bobinado é que de forma alguma atrapalha na interpretação da história, que continua objetivando conscientizar o paradigma lúdico da fantasia e da nossa eterna luta, aqui vitalmente filmada de um ponto lúdico para o espectador tendo como fundo o acelerado crescimento da tola Izzy, protagonista, pela concretização das nossas ambições, impossivelmente inalcançáveis quando nós nos encontramos embebidos no elixir da ilusão, aqui fortuna para os personagens dessa louca história de amor e sonhos.
A dinâmica da construção dos personagens catalisa a força de um elenco riquíssimo, todo em conjunto, uma vez que os muitos núcleos amorosos em torno da trama complexamente enrolada une esses atores, em especial numa das cenas perto do fim, onde há um conglomerado de gente reunida nos ensaios da peça do Arnold, como os pais da Izzy, o detetive, a terapeuta e seu "cliente tarado" - cena irrealmente cômica, uma das melhores do filme, empatado muito provavelmente com a cena do hotel com o desencontro entre as prostitutas e a esposa. De fato, como muitos tem atestado, é uma comédia que remete ao antigo estilo de se fazer comédias, um mix de Buster Keaton, os Marx e Chaplin, que, mesmo nem tão satisfatório ou completo quanto devia, é milagrosamente remetente, e portanto, minimamente, fiel. As comparações ao Woody Allen, no entanto, são mais válidas ainda, já que Um Amor a Cada Esquina bebe na fonte de A Rosa Púrpura do Cairo, meu favorito, com a Isabella daqui se assemelhando com a Cecilia de lá, apesar dos distintos destinos que ambas as figuras tomam, isso lembrando que a personagem da Isabella tem como tema a ilusão.
Quanto ao elenco, estrelam aqui importantes amostras de humor de qualidade, já conhecidos do público (Owen Wilson, Jennifer Aniston, Will Forte, Richard Lewis, Austin Pendleton) e algumas outras que, ainda que conhecidas, mostram, primitivamente, talento na área (Kathryn Hahn, Rhys Ifans), e aquela que é o destaque e a graça do filme: a deliciosamente engraçada e ainda mais linda Imogen Poots, cuja existência só me veio a ser denotada no conhecimento de Um Amor a Cada Esquina, ainda que a beldade esteja no aguardadíssimo Cavaleiro de Copas, próximo do Terrence Malick que teve a sua estreia para esse mês adiada por tempo indeterminado. Droga!
Outra participação interessante, mesmo que bem menor, é a de Lucy Punch, outra deusa que faz aqui um papel de prostituta, numa sequência hilária. A primeira coisa que subiu à minha cabeça foi de que a atriz nunca esteve mais familiar. Acontece que essa é a segunda vez que ela faz um papel de meretriz, pelo que eu conheço, já que há pouco tempo a vi imperdível em Você vai Conhecer o Homem dos seus Sonhos - do Woody Allen. Fica a sensação de que essa garota ainda nos tem muita coisa pra mostrar. E porque diabos o título She's Funny That Way (Ela é Engraçada desse Jeito)? Eu ainda acho que Squirrel to the Nuts ficaria show (a frase, expressão que diz "esquilos para as nozes" é quase um bordão do personagem Arnold).
Um Amor a Cada Esquina (She's Funny That Way)
dir. Peter Bogdanovich - ★★★
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