quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Crítica: "THE LOBSTER" (2015) - ★★★★★


Já dizia Albert Camus: "Aqueles que se amam e são separados podem viver sua dor, mas isso não é desespero: eles sabem que o amor existe". Essa frase talvez não tenha tanta ligação com The Lobster, mas é tão bonita que faço questão de destacá-la aqui no post. E que coisa bonita é o amor, não? Complexo e indiscutível no seu todo, mas belíssimo. The Lobster nos fala sobre o amor. O amor verdadeiro. Aquele tipo de amor certeiro, que nenhum limite pode distanciar ou destruir. Romance futurista, The Lobster, exibido no Festival de Cannes nesse ano e recentemente vindo ao Brasil através do Festival do Rio, é aquele filme que demora pra sair da sua cabeça, mas é aí que está seu melhor: quanto mais pensado, cresce no conceito. É uma obra visionária, divertida, bizarra e excelente.

Filmado em inglês, com atores exclusivamente europeus (a grande maioria britânica), The Lobster narra, num futuro não muito longínquo, a jornada de um homem abandonado pela mulher, e que é enviado a um hotel, onde há todo um processo de seleção para casais e um regrado padrão que confere aos relacionamentos humanos diversas leis e implicações. No lugar, o homem, míope, deve encontrar seu par perfeito (isto é, que obedeça simultaneamente ao gosto ou característica geral, física ou psicológica, do outro) entre o grupo de solitários ali presentes, num período de aproximadamente 40 dias. Caso ele não conclua essa missão no prazo estipulado, ele será transformado num animal (que é pré-decidido pela pessoa), e solto na floresta. 

Durante esse tempo em que ele fica acomodado no hotel, ele participa de diversas confraternizações, bem como realiza caçadas, organizadas pelos proprietários do hotel, em busca de fugitivos, os solitários (espécie de "rebeldes") que se negam a seguir essa lei absurda, uma vez que não são permitidas pessoas solteiras. O número de pessoas mortas a cada caçada vira tempo acrescentado até o tempo final, com a pessoa obtendo mais dias no seu calendário. Próximo do fim de seu confinamento, o rapaz decide se casar com uma mulher, a melhor caçadora do hotel (ela é apelidada de "sem-coração" pelos hospedados, porque literalmente não reproduz nenhum tipo de sentimento). Entre umas e outras, a moça, desconfiada, assassina o irmão do rapaz - transformado em cachorro - para testar o personagem do Colin, que apenas ficou ao lado dela usando truques e frieza. 

Nisso, ele, após transformá-la em animal com a ajuda de uma empregada (que tem a sua real identidade mais tarde revelada), foge para a floresta, onde junta-se ao grupo rebelde dos solitários, liderado pela personagem da belíssima Léa Seydoux (sempre deslumbrante), e lá, ironicamente, se apaixona por uma mulher, que mais tarde ele descobre que é míope como ele. Apesar dessa paixão ser proibida segundo as regras do grupo, eles reagem contra esses mandamentos e se amam escondido na floresta. 

O casal de míopes é formado pelo Colin Farell e pela Rachel Weisz (também narradora), que, mencionando isso, fazem uma química perfeita em conjunto. O casal simboliza o amor verdadeiro num mundo onde os relacionamentos são artificiais e manipulados, forçados. Neste romance futurista, não há máquinas, não há robôs, não há engenhocas de outro mundo, muito menos embates espaciais. A distopia de Yorgos Lanthimos mostra um universo onde o amor, as relações afetivas, são controladas por lei, onde pessoas são punidas por serem solitárias. 

Essa distopia dá até a noção de que tal idealismo seja produto do racionamento, bem como muitas cenas exemplificam, já que casais formados, baseado no que aqui é teorizado, evitam estupros, mortes e muitos outros tipos de violência que rendem altos débitos à sociedade, bem como torram dinheiro. A distopia, realista e criativa, é fruto do roteiro autêntico e muito bem desenvolvido, da autoria do Yorgos em parceria de outro roteirista grego, Efthimis Filippou. Não é surpresa ver tamanha dedicação por trás de um filme tão bom como esse.

A serviço e como efeito do sistema totalitário que parece vitimar o mundo nesse futuro próximo, muitas pessoas aqui parecem estar com a cabeça no mundo da lua, pois nem sempre conseguem exprimir feições, desejo ou qualquer outra coisa. A falta do amor implica no desnorteamento, na ausência de sentido para as coisas, nas amizades incompletas e em bizarrices de total e perplexa irrealidade. 

Ainda que a grande parte das sequências, pelo menos durante a primeira hora do filme, sejam bastante cômicas, o filme vai ficando bem doloroso a partir da saída do personagem do Colin Farell do hotel, quando ele conhece a moça míope e se apaixona por ela. Os últimos quinze minutos são demais emocionantes. Aquela sequência final é de partir o coração, mas num sentido otimista, já que a mesma é a prova fiel (ou não) da concretização do amor verdadeiro do casal. Muito bonito, de qualquer forma. 

O filme é todo muito simples, uma história inteligente e bastante inventiva, isso falando de uma produção que até pode ser vista como sátira às muitas realizações distópicas e futuristas que tomaram conta de Hollywood de uns tempos pra cá. É tudo bastante natural, e dá a impressão de que a história realmente se passa nos dias de hoje, se não fosse por algumas intervenções surreais dentro da trama. No fim, é apenas um filme romântico. Sem explosões, rush e nada do estilo. A própria fotografia do filme, que não dispôs de muitos efeitos artificiais, também contribui para esse estado. No elenco, além da Léa, da Rachel e do Colin, ainda figuram o John C. Reilly, o Ben Whishaw e a Ariane Labed, esposa grega do Lanthimos e quem eu conheci em Antes da Meia-Noite (nunca me esqueço da Perdita).

The Lobster, crítica às relações amorosas, familiares e humanas retratadas ficcionalmente dentro de um sistema futurístico abismadoramente ridículo, mas que indiretamente imita a vida em sociedade nos tempos de hoje, é um filme bastante especial. Podem achar o que quiser dessa minha instantânea devoção, mas é um filme brilhante ao meu ver. Simplesmente brilhante. Consegue reunir atualidade, influência Lynchiana, futurismo, crítica, romance, humor ácido, segurança no roteiro, qualidade, perspicácia, humanidade, veracidade, emoção e força. É tiro e queda. The Lobster é sensacional. Me impressionou demais, e merece mais atenção.

The Lobster
dir. Yorgos Lanthimos - 

3 comentários:

  1. Filme parado, ridículo e de ofensa ao intelecto de quem o vê... o rei vai nu??????(DEUS OBRIGADO PELA MINHA IGNORÂNCIA)

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  2. Filme parado, ridículo e de ofensa ao intelecto de quem o vê... o rei vai nu??????(DEUS OBRIGADO PELA MINHA IGNORÂNCIA)

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  3. Ah, ele tem certas qualidades, vai. Eu até posso ter exagerado um pouco na resenha, mas é um filme agradável, e não exige muito dos neurônios, se formos ver de perto. De qualquer maneira, respeito sua opinião.

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