domingo, 10 de janeiro de 2016

Crítica: "LOVE & MERCY" (2015) - ★★★★


Semanas antes de estrear, em novembro do ano passado, Love & Mercy foi subita e inexplicavelmente cancelado, tendo apenas ido a exibição no Festival do Rio em outubro, sessão inédita, ainda mais pra quem não tem condição de pagar o ingresso ou até mais ainda pra quem não mora no Rio de Janeiro (dããããã). Não dá pra confiar nas distribuidoras brasileiras. Por isso, com a pulsante ansiedade em conferir o trabalho que narra a vida do músico americano Brian Wilson, membro e cabeça da icônica banda Beach Boys, decidi ver o filme por outro meio, a do torrent. Sim, eu sei que a experiência de conferir no cinema é tocante e incomparável a qualquer outra, mas o filme continua em off no circuito, e eu queria muito assistir o filme. Isso desde o ano passado, quando consegui a cópia. 

É lindo. Um filme incrivelmente bom. O produtor Bill Pohlad (A Árvore da Vida e 12 Anos de Escravidão) se arrisca com tudo na direção de um filme que pode ser subentendido tanto como denúncia quanto como retrato dramático da vida de um dos maiores gênios musicais do século 20, co-fundador de um grupo de sucesso e dono de um talento inesquecível. 

O certo sobre Love & Mercy é que, sendo pela reunião de um diretor magistralmente dedicado, um elenco infinitamente intenso e em ótima forma, ou o desenho de som inexplicavelmente tenebroso e hipnotizante, e essa história real propulsionada num roteiro emocionante, o filme consegue se destacar facilmente e assim que se inicia a projeção temos a certeza de estarmos diante de uma peça cinematográfica colossalmente importante e potente. 

É tortuoso pra quem é fã do The Beach Boys acompanhar o desenrolar dessa história maluca e absurda, bem como a turbulenta vida do seu principal membro, Brian Wilson, filmada (e interpretada pela dupla sensacional Paul e John) meticulosamente. Imagine, se pra nós, que não somos tão chegados à banda que é considerada a The Beatles americana, é quase um desafio ser seduzido por esse filme cruel e que explicita os muitos malefícios que a fama e o sucesso trazem dentro da história de vida do Brian? 

Feita a fama na juventude, durante a década de 60, com a criação do bombasticamente popular The Beach Boys, Brian logo no início foi exposto bem de perto à insatisfação e ao desgosto do pai violento e revoltado, que fazia de tudo para deixá-lo atolado na angústia e à beira de um ataque de nervos. Com a pressão e a constante confusão, nas tentativas infortunas de satisfazer às demandas do pai exigente, incluindo dar-lhe um posto de privilégio dentro da administração da banda (cargo que mais tarde lhe foi retirado), Brian começou a padecer de misteriosas crises de esquizofrenia.

É triste ir vendo como abusaram do Brian e fizeram ele sofrer durante a carreira inteirinha dele. Chega a dar dó do cara, e nem dá pra culpar ele de ter usado drogas por um tempo e não ter dado atenção à família e às filhas com tudo o que ele passou nas mãos dos impetuosos ratos que queriam tirar proveito da sua genialidade. Uma triste história.

Os passos de Love & Mercy, que usa o cinema e a imagem a favor da justiça, progressando como um filme-denúncia, lembra bastante o recentemente visto documentário Amy, baseado na vida da cantora britânica Amy Winehouse, que se afogou no vício, drogas e álcool, graças aos maus tratos vindos do pai, que a extorquia e também a tinha proporcionado uma infância ruidosamente ruim, principalmente por conta do complicado divórcio entre ele e a mãe de Amy, e o namorado da diva, que foi quem a apresentou ao mundo das drogas. Ambas as histórias de vida da Amy Winehouse e do Brian Wilson são bastante semelhantes, principalmente nos flashbacks, onde o diretor utiliza um recurso documental a maior parte do tempo. A única diferença é que uma história tem um fim trágico e a outra um final feliz. 

É justamente aí que o amor entra na história. Ele chega pra estrelar e salva o Brian das mãos de seu consultor psiquiátrico, e nas palavras do músico tutor legal Eugene Landy, carrasco interpretado pelo ótimo Paul Giamatti, sempre ótimo em papéis vilanescos (o Paul foi feito pra fazer vilões). O amor do título vence todas as barreiras impostas pela maldade. É um clichê simples, mas o amor vence aqui. E ele vem em forma de pessoa, no personagem da Elizabeth Banks (numa performance excepcional), a Melinda Ledbetter, o grande amor do Brian. 

O John Cusack, que faz o Brian Wilson em idade avançada, está maravilhoso. A performance dele é chocante. O Paul Dano nem se fala. Que ator genial. Muitos estão dizendo que é a atuação da vida do Paul, que, apesar de jovem, já trabalhou em muitos filmes bons, e com grandes diretores dos mais diversos naipes, de Paul T. Anderson a Paolo Sorrentino. E, pelo visto, é mesmo, empatada em triplo com a de Pequena Miss Sunshine Sangue Negro. Paul encarna com seriedade e maturidade um personagem complexo e cheio de exigências. Adoravelmente extraordinário. 

Love & Mercy
dir. Bill Pohlad - 

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