Duvido muito que existirá na história alguém tão imbatível, talentosa, indubitavelmente poderosa e reconhecida como a figura de Meryl Streep. Digo, alguém tão único da maneira que ela é. Provavelmente há muita gente que pode e merece ser comparada à ela (ou ela merece ser comparada à eles) no quesito talento e poderio, só que nunca haverá outra Meryl. Ela é uma atriz simplesmente insubstituível em todos os prováveis ângulos. E que tremenda experiência foi essa de ver A Escolha de Sofia. Não é de se estranhar que a performance dela como a Sofia é a melhor de toda a sua carreira. É uma performance e tanto. Em um filme e tanto, também. A Escolha de Sofia tem uma sorte inabalável de ter a melhor atuação da Meryl e ainda sim de apresentar uma tocante e chocante história, onde os usuais limites dramáticos são quebrados e o espectador presencia a montagem de um dos mais tristes e deploráveis filmes já feitos.
Em uma aula de inglês, tive a chance de ler um diálogo que falava sobre A Escolha de Sofia. Na verdade, era um diálogo entre dois homens sobre cinema, e um deles citou este como seu predileto, e começou a falar da história, do elenco, dos personagens. Anteriormente à esse diálogo, já tinha algum interesse em ver A Escolha de Sofia. Mas naquele ponto vi que necessitava ver a tão comentada e aplaudida atuação de Meryl Streep num personagem abalado por um obscuro passado na guerra, patrocinado por um culposo destino. No fim das contas, A Escolha de Sofia meramente fala sobre a vida. Alguns tem sorte, e outros tem azar. Nossa protagonista, Sofia, teve o azar de presenciar uma guerra horrorosa e ainda sim experimentado o mais agoniante sofrimento de todos, cujo efeito não passara mesmo depois que o episódio se dissolvera. Após ter imigrado para os Estados Unidos, a polaca Sofia, em péssimo estado de saúde, tem a (inicial) sorte de topar com Nathan Landau, que afirma ser biólogo e a ajuda depois que ela desmaia dentro de uma biblioteca, anêmica. No entanto, a sorte que Sofia acreditara ter presenciado rapidamente se transforma em azar, uma vez que aquele gentil Nathan que a ajudara com o passar do tempo torna-se um rude e impetuoso amante, temperamental e doente. No caminho desses dois, um jovem escritor sulista, Stingo, observa de perto o cruel e extravasado relacionamento deles, assim como presta atenção aos míseros detalhes da vida de Sofia, que vira sua amiga.
E é nesse momento que a gente se pega pensando nos horrores que muita gente testemunhou e viveu na guerra. Mais do que um filme sobre caminhos da vida, destino e experiências desgastantes, A Escolha de Sofia fortemente aborda a guerra e seus males irreversíveis. Que coisa louca e terrível foi a Segunda Guerra Mundial... Muito triste ver esse longa e ter que enfrentar a realidade de que foi um episódio demoníaco da nossa história. Tudo traduzido muito claramente na dor e no pânico de Sofia, a sofrida protagonista que não tem paz, atormentada inquietamente pela culpa e pela aflição. Enfim, vou parar de comentar sobre a triste Sofia, tudo só me deixa mais depressivo ainda. O impacto deste filme é intensamente indescritível. Acredito que tardará até que eu volte a vê-lo novamente. Só da duração dos efeitos dessa sessão desconheço absolutamente. Inegável obra-prima, A Escolha de Sofia é um brilhante e profundo longa, um drama bem-feito comandado por um elenco de primeira e uma equipe dedicadíssima.
E Meryl... Que atriz! Que dedicação! O que, afinal, torna essa atuação uma das maiores e mais importantes já feitas? Devo citar que as falas em inglês de seu personagem tiveram que ser encarnadas diante de um sotaque polonês forte e turbulento, e que uma parte dos diálogos da Sofia são em alemão e polonês, especialmente os flashbacks, que duram umas meia hora de filme, além da expressão quase excessiva de cansaço e sofrimento portadas na cara dela para superficialmente identificar o sucesso e a qualidade de tal atuação. Isso bem superficialmente, sem aprofundar os esforços necessários que a personagem usufruiu da atriz. Kevin Kline também é um ótimo destaque, em uma de suas primeiras produções cinematográficas. Seu assustador papel estremece e abala, isso pra não comentar o já natural quê de Kline para a vilania.
A direção e roteiro inestimáveis de Alan J. Pakula (o mesmo de Klute - O Passado Condena, que deu a Jane Fonda seu primeiro Oscar, e Todos os Homens do Presidente) são contribuições extraordinárias para A Escolha de Sofia. O roteiro preenchido com uma monstra sensibilidade apenas reforça a imagem do romance homônimo de William Styron. A genial fotografia (como sempre...) do mestre Néstor Almendros só mais faz de A Escolha de Sofia uma película totalmente inesquecível (o extremo cuidado de Néstor com as imagens e os planos é invejavelmente plausível tanto quanto foi em Cinzas no Paraíso e O Garoto Selvagem). A trilha sonora de Marvin Hamlisch é incansavelmente adorável e melancólica. Além destes citados, A Escolha de Sofia possui mil e um motivos para ser dono do meu favoritismo e tornar-se um dos longas mais sofridos e autenticamente dramáticos que eu já vi em minha vida. Um ótimo exemplo de como se faz um drama de verdade, A Escolha de Sofia ganhou um lugar em meu coração, não só o filme como também a Meryl, a excelente Meryl, em seu melhor aqui. Como não amar?
A Escolha de Sofia (Sophie's Choice)
dir. Alan J. Pakula - ★★★★★
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