Ah, o subúrbio americano e suas intrigantes histórias... Anos depois de Beleza Americana, Sam Mendes retorna à esse eufórico universo com novidades, repetindo o mesmo sucesso do anterior. Se bem que o foco do filme afasta-se das noções de Beleza Americana. Aqui, apesar da abordagem, o filme vai além do subúrbio, e debate questões que vão desde a liberdade até a proficiência de nossos instintos. Detalhista e simplesmente impecável, Foi Apenas um Sonho é mais uma tocante análise da vida conduzida por aquele fatídico cotidiano de sempre que vive enchendo o nosso saco, e as nossas fugas desse diário, que nem todas as vezes são concluídas ou realizadas.
Apesar da belíssima performance aqui apresentada, Kate Winslet, que recebeu vários prêmios por essa merecedora atuação, foi brilhantemente superada por Leonardo DiCaprio, que me surpreendeu mais. Apesar de não ter recebido tanta aclamação quanto com quem contracenou, DiCaprio atua estonteantemente, tão bem quanto Kate Winslet. O elenco todo é bom. Michael Shannon, Kathy Bates e Zoe Kazan entram como pequenos destaques do filme ("roubar a cena" é a profissão deles).
Frank e April são um casal. Tem dois filhos. Frank, apesar do trabalho, pouco se preocupa com a vida que leva, de modo a que não exija tanto dela. Por outro lado, sua esposa April é uma mulher timidamente obsessiva, que de certa forma não está nada satisfeita com a irreal vida que leva, uma vida que obrigatoriamente tem de ser perfeita - para ela -. Essa busca pela perfeição logo torna-se a grande sacada do filme. O mérito de Foi Apenas um Sonho loca-se nessa poderosa mensagem. Afinal, a vida não é perfeita. E quanto mais se luta por uma vida perfeita, mais sofrimento encontramos. Não é preciso necessariamente aceitar isso. Preocupar-se com essa questão é apenas tempo perdido. Muitas vezes, nós cometemos esse perfeccionismo. Muitas vezes. E mesmo assim nunca estamos convencidos de que algo não é possível. É como o próprio Frank Wheeler disse: "Um vazio sem esperanças". O vazio é visível, mas a esperança é mais forte, e nunca estamos dispostos a aceitar nossas falhas. Nossos fracassos - pra falar melhor.
Por isso que Sam Mendes é um de meus cineastas atuais prediletos. Mesmo com uma curta filmografia, ele revelou que a sua maestria esconde-se por trás de elementos como esses em Foi Apenas um Sonho. Sam é um diretor inevitavelmente miraculoso e detalhista. Por que não perfeccionista? A atmosfera de seu trabalho conspira a favor disso. E um dos grandes trabalhos de Sam é esse drama fabuloso, que me deixou tão pensativo quanto aterrorizado, por que é real. Vivenciamos isso frequentemente, como eu disse, até na nossa pele. E isso não terminará tão cedo. E nós de alguma forma viveremos com isso. A visão de Sam por trás de toda essa mania é de uma excelência abismadora e espetacular.
Sam evita aos máximos os clichês, e não é preciso esforço para notar que o diretor quis fazer algo inovador, preciso, sem muita afobação. E Foi Apenas um Sonho, nesse ponto é um filme rápido. Deixa pra trás aquelas desnecessárias especulações e é direto ao seu público. Não é exagero dizer que é uma das construções mais objetivas do cinema, pelo que eu experienciei. Preciso ainda ler o romance de Richard Yates, que também dizem ser uma pérola.
Pelo menos estou satisfeito com a sua adaptação, Foi Apenas um Sonho, que é sem dúvida alguma um filme glorioso e desolador. Merece minha fidelidade. Em aspectos fica fácil lembrar de Estrada para Perdição também. A remontagem épica aqui é maravilhosa. A (sempre) sensível e memorável trilha sonora de Thomas Newman. A fotografia essencial e meticulosa de Roger Deakins. Sam Mendes. Essa direção de arte. Essa edição. E Kate Winslet e DiCaprio, de volta em uma parceira com certeza tão lendária e magistral como a de Titanic. Dois exemplos de atores!
Foi Apenas um Sonho (Revolutionary Road)
dir. Sam Mendes - ★★★★
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