domingo, 30 de agosto de 2015

Crítica: "MUNIQUE" (2005) - ★★★★


Ficar dois dias sem a internet pode ser desgastante e muito angustiante. Minha experiência, cuja já tive várias outras vezes, realmente me fez ver o quão o mundo está dependente dessa conexão. Chega a ser desesperador. O século 21 é desesperador. Enfim, só em apenas dois dias perdi muita coisa. E fiquei atrasado. Nesse intervalo de dois dias vi Munique, do Steven Spielberg, um de seus trabalhos mais ambiciosos, arrasadores e belos. Munique, muito elogiado, tem motivo de sobra para ser considerado um dos filmes mais maturos feitos por ele. O diretor de clássicos como E.T. – O Extraterrestre, A Lista de Schindler e O Resgate do Soldado Ryan até pode ter conseguido certo reconhecimento com obras intensas, de cunho dramático profundo (também citando A Cor Púrpura), mas nenhum desses filmes tão pesados como Munique, onde o diretor revela que também é mestre dessa exploração violenta do mundo criminal e que consegue lidar com as façanhas do estilo da produção com glória e talento, com a garantida prova da competência de seu cinema. Munique é uma obra maior de Spielberg. Não a maior, mas com certeza ingressa na lista. O melhor do cineasta está presente aqui. Esqueça as produções mais “livres” que ele fez. Nem mesmo parece que Munique é um filme dele, e o mérito instala-se justamente aí. Pra mim o diretor que consegue dominar esse propósito, uma forma de afastar-se da sua comum zona de conforto, já é considerado um gênio. Sorte a nossa ter Spielberg, esse gênio cujos filmes tardam, mas não falham. Um bom exemplo é Munique.

Depois do fatídico atentado em Munique, nas Olimpíadas, o governo israelense decide selecionar um grupo de cinco homens para exterminar outro grupo de onze, responsáveis pela morte dos atletas israelenses no atentado. A trama centra-se no líder desse grupo, que tem uma mulher grávida e ainda aprende sobre os essenciais valores da família e como esse ensinamento deve guiar a sua missão. Mas, afinal, o que Munique fala sobre? Inegavelmente, há uma clara conexão (lá vem spoiler) desse evento com o 11 de setembro. Quem percebeu no final, com o plano de fundo das torres gêmeas em Nova York, os créditos iniciam com uma frase que diz “dos onze culpados, apenas nove foram mortos”. Talvez essa que seja a ligação mais clara do filme (11 de setembro, setembro é mês 9) seja de perto a menos imperceptível das outras mais que surgem no decorrer da narrativa e nos levam a testemunhar a série de conflitos que se interligam e ganham um sentido. Essa conexão não é certamente o objetivo principal de Munique, mas a teoria de que esse mundo escondido, deixado para trás, abandonado em sofrimento e desolação, um lar completamente desalmado, que é o Oriente Médio buscou com esses eventos a nossa possível atenção é devastador. Não é apenas sobre injustiça, mas como tudo se trata da nossa própria ignorância. Somos todos culpados pelo caos. O maior e o menor. Um na luta pelos mesmos direitos do outro. O mundo é e certamente sempre será desse jeito. E quanto mais não aceitarmos isso, mais haverá caos. E daí começa tudo de novo.

Um elenco surpreendente. Da lista, só mesmo conhecia dois ou três, entre eles o Daniel Craig, Geoffrey Rush e Mathieu Amalric (isso se não são os únicos que eu conheço). Eric Bana, Mathieu Kassovitz, Hanns Zischler, atores simplesmente extraordinários. Bom ver que essa lista não conta com Hanks ou nenhum dos outros colaboradores de Spielberg (o que pode ser visto muito bem como parte dessa “evolução”). Se bem que em A Lista de Schindler ele tinha apostado alto no elenco internacional também. Mas John Williams e Janusz Kaminski continuam presentes. A eterna parceria, e que tem funcionado pra caramba, de Steven com esses dois outros grandes gênios é inquebrável mesmo numa brusca e singular transformação dessas. Outra prova de que a trilha e a fotografia dos filmes de Steven não seriam as mesmas sem esses dois.

A ação em Munique é eletrizante. A cena da explosão no hotel é de deixar qualquer um com o coração saindo pela boca, como foi no meu caso, e que também é a cena da qual eu acredito que é a mais pulsante do longa inteirinho. Não estranharei alguém ter um ataque cardíaco durante a sessão de Munique. Cardíacos, recomendo que vocês não vejam Munique. É isso aí. Eu gostei de Munique. Não só possui uma trama forte e consequentemente reflexiva como também é de um caráter único, razões pelas quais já expliquei e estão diretamente relacionadas ao fato deste filme ser uma peça rara da carreira de Steven Spielberg, com certeza uma lenda viva e um dos maiores realizadores cinematográficos que já viveram. E ele é quem sai ganhando em Munique, pois o filme automaticamente se transforma numa prova dessa sua autoridade imbatível.

Munique (Munich)
dir. Steven Spielberg - ★★★★

Nenhum comentário:

Postar um comentário